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Ao contrário do governo, este país tem futuro

O governo está em crise porque desprezou as pessoas, porque governa contra os cidadãos, porque rebaixa e maltrata quem vive do seu trabalho. O governo está em crise porque perdeu o país.

As declarações ontem proferidas pelo ministro de estado e das finanças ilustram o autismo e o desnorte do governo e ameaçam mergulhar o país numa catástrofe social de enormes proporções. Perante o desastre de uma política que falhou todas as metas e objetivos, a solução de Passos Coelho, Paulo Portas e Vítor Gaspar é mais do mesmo, mas, desta vez, do mesmo mas mais forte.

Durante uma hora, o ministro das Finanças falou de um país que não reconhecemos. As medidas do Governo são um sucesso, as avaliações da troika são mais que excelentes, o ajustamento está a ser mais rápido do que o previsto e do colapso económico vai florescer uma economia competitiva. Pode não ser delírio mas é, certamente, a fantasia a tomar conta do discurso e do pensamento de Vítor Gaspar.

E como tudo corre sobre rodas, o Governo carrega a dobrar sobre os contribuintes, esmaga os portugueses com mais impostos e sobretaxas, e corta, também a dobrar, nos serviços públicos, na educação, na saúde, na segurança social. Ainda bem que tudo corre sobre rodas, sr. primeiro ministro. O que seria do país e dos portugueses se alguma coisa não estivesse a correr bem.

Na realidade virtual que se instalou no conselho de ministros, o Governo está a cumprir, o problema são mesmo os portugueses. Ou porque deixaram de comprar carros, como se queixa amargamente o primeiro-ministro, ou porque vivem como cigarras preguiçosas, como acusa o ministro Miguel Macedo.

É um governo zangado com os ignorantes que não reconhecem nem agradecem o espantoso trabalho efetuado por todos e cada um dos seus ministros.

Os impostos aumentam, porque há um Tribunal Constitucional que teima em fiscalizar o cumprimento da constituição, lamuria-se o governo.

O desemprego continua a crescer porque ninguém aceitou as suas alterações à TSU, lamenta-se Vítor Gaspar. A culpa nunca é do governo mesmo quando os parceiros desta coligação em estado de ebulição se culpam mutuamente por cada um destes insucessos

É um governo satisfeito consigo mesmo mas zangado e em conflito com os cidadãos. Um governo de formigas trabalhadoras, incompreendido e rejeitado por um país de cigarras incompetentes, piegas e ainda por cima teimosamente a viver acima das suas possibilidades.

O governo está em crise porque falhou. Falhou na derrapagem das contas públicas, falhou no controlo da dívida e do défice, falhou na destruição da economia, falhou no desemprego record. O governo está em crise porque desprezou as pessoas, porque governa contra os cidadãos, porque rebaixa e maltrata quem vive do seu trabalho. O governo está em crise porque perdeu o país. Um Governo que perdeu o país não merece, nem pode continuar a governar. Um governo que perdeu o país só tem uma saída: demitir-se.

 

A compulsão do governo pela austeridade está a conduzir as contas da segurança social para o abismo, pondo em causa o contrato social estabelecido com quem passou uma vida inteira a trabalhar e a descontar para uma reforma digna. De um saldo positivo de 438 milhões de euros em 2011, passámos para um défice de 694 milhões de euros este ano. São menos 1132 milhões, ou seja, o aumento do desemprego provocado pela recessão induzida pela austeridade, com menos contribuições e mais encargos sociais – apesar de mais de metade dos desempregados estarem sem qualquer apoio público, faz o Estado perder mais dinheiro num ano do que as tão anunciadas poupanças nas PPP ao longo de 30 anos. O colapso da segurança social é também a marca de um governo que falhou.

O que falhou não foi esta ou aquela medida do Governo, mas uma estratégia assente na austeridade “custe o que custar” para ser o “bom aluno” de Merkel e companhia, na esperança de um favor ou simpatia que nunca chegarão.

Para que serve tanta austeridade e sacrifício, de que serve ao país e aos portugueses ter no Governo o bom aluno da senhora Merkel, se tanto o país como os portugueses estão mais pobres e ainda por cima nem o défice nem a dívida param de crescer.

Ser o bom aluno da sra Merkel tem um preço que Passos Coelho aceita sem pestanejar: aumento de todos os impostos, redução de salários e pensões, cortes na saúde e educação, venda ao desbarato de empresas públicas. Há 15 meses que o governo não faz outra coisa. Mas, nos juros, nos juros exagerados que nos cobram é que o governo não toca. E os juros, só os juros este ano, custam tanto como um ano de atividade de todo o SNS.

O governo quer ser bom aluno lá fora mas, cá dentro, não passa de um cábula, acumulando insucesso atrás de insucesso, falhanço atrás de falhanço, chumbado pelos portugueses, por mais equivalências que obtenha.

Os portugueses estão fartos da lenga lenga da austeridade, dos sacrifícios inúteis e desiguais, estão fartos deste bombardeamento fiscal – expressão bem impressiva a que o dr.Paulo Portas recorria quando estava na oposição ou em campanha eleitoral. Os portugueses não acreditam no governo, não confiam no governo. O governo não tem outra saída que não seja a demissão.

O governo diz que não há alternativa, mas já todos percebemos que esta alternativa do governo é que não é alternativa nenhuma, é o caminho da bancarrota ou da saída forçada do euro.

Há alternativa ao esmagamento dos salários e ao afastamento do estado das funções sociais e da economia. Em nome da dívida, o governo mergulhou o país numa espiral recessiva da qual não conseguiremos libertar-nos. Quanto mais austeridade mais recessão, quanto mais recessão mais dívida. A dívida é uma chantagem a que o governo se verga, a austeridade é o vício de um governo dependente do seu dogmatismo ideológico.

Há alternativa à receita da troika que zelosamente o governo aplica, uma alternativa na união europeia e no euro.

O governo durante 15 meses resignou-se e submeteu-se perante a sra Merkel, os organismos internacionais e os mercados financeiros.

Durante 15 meses o governo comportou-se como uma espécie de agência dos credores internacionais da nossa dívida pública e não como o governo da República.

15 meses é tempo suficiente para o país perceber que não se pode contar com o governo para defender os interesses do país e para bater o pé à sra Merkel, ao comissário Barroso, ao BCE, ao FMI.

Um governo que não conta é um governo que está a mais, é um governo que deve ser demitido.

Para vencer a crise é preciso vencer a chantagem da dívida e dos credores.

E o primeiro passo é precisamente romper com a troika e denunciar o memorando.

Precisamos de quem fale verdade lá fora e cá dentro e que faça o que é inadiável fazer: a dívida deve ser renegociada e reduzida, os prazos e condições de pagamento alterados.

A renegociação da dívida é condição para o seu pagamento e para a reanimação da economia, para o crescimento do emprego, para o país vencer a crise e se libertar desta tirania.

Renegociar a dívida não é uma vergonha nacional, nem uma derrota para o país. Renegociar a dívida é a única saída para resgatar o país, é a única saída para devolver a esperança aos portugueses e dizer-lhes que não estamos condenados ao empobrecimento.

Ao contrário do governo, este país tem futuro.

Sobre o/a autor(a)

Médico. Aderente do Bloco de Esquerda.
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