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Os cidadãos estão unidos contra o governo

O primeiro-ministro pediu a unidade de todos os portugueses e conseguiu-o. De norte a sul do país, os cidadãos responderam-lhe. Estão unidos. Unidos contra o governo. Unidos contra a austeridade. Unidos contra a insensibilidade social. Unidos pela dignidade do salário e do emprego.

O passado sábado foi o dia em que o governo e a troika foram avaliados. Não por obscuros técnicos de fato escuro, mas pelo povo. O resultado foi estrondoso: Chumbaram. Governam porque detêm o poder, mas já não têm uma réstia de autoridade. É essa a primeira lição destes dias.

As últimas duas semanas foram esclarecedoras. A coligação desmoronou-se, o governo está ligado à máquina e a austeridade está a destruir o país.

A coligação desmoronou-se, em direto e a cores, num espetáculo lamentável e pouco aconselhável a menores de idade. PSD e CDS, enquanto vão falando em patriotismo e união de interesses, vão trocando recados pela imprensa e marcam conferências de imprensa para responderem um ao outro.

O governo está ligado à máquina e já não tem país a quem falar. O primeiro-ministro pediu a unidade de todos os portugueses e conseguiu-o. De norte a sul do país, os cidadãos responderam-lhe. Estão unidos. Unidos contra o governo. Unidos contra a austeridade. Unidos contra a insensibilidade social. Unidos pela dignidade do salário e do emprego.

A austeridade, anunciada como redentora e temporária, está a destruir o país. Um ano de governo e o desemprego está descontrolado, estamos mais endividados, mais pobres e o défice - em nome do qual toda esta sangria foi efetuada, não nos esquecemos - não só não desce como teima mesmo em aumentar.

A austeridade está a destruir a economia, o emprego e o futuro. Ainda hoje soubemos que, de julho para agosto, temos mais 18 mil pessoas sem emprego. Já nem o emprego sazonal, no Verão, para a galopada infernal da destruição de postos de trabalho.

A austeridade está a revelar-se um fracasso, mas o que é que responde o governo? Apresenta uma austeridade ainda mais violenta. Errar quando se foi sobejamente avisado revela má capacidade de decisão; errar porque se defende a recessão revela vontade de destruição; errar quando tudo à nossa volta está a implodir com os efeitos da nossa política, não é erro. É cegueira e fanatismo ideológico.

Só o fanatismo ideológico, de resto, explica a obsessão do governo com a Taxa Social Única. O aumento da TSU não cria postos de trabalho, não responde ao défice, nem tem efeitos na competitividade das empresas.

Não vai criar emprego, antes retrairá o consumo e aumentará o desemprego, como respondem em coro os potenciais beneficiários da medida: os empresários.

Não responde ao défice. Na melhor das hipóteses são 500 milhões de euros. Um valor que representa menos de 10% dos cortes e aumentos de impostos que o governo pretende aplicar no próximo ano. E isso, na hipótese nada provável de não criar desemprego.

Sejamos claros. O problema do desemprego não tem nada a ver com os custos salariais. Se assim fosse, e com os vencimentos a descer a pique, há muito que tínhamos pleno emprego.

Por muito que o governo teime em ignorar a realidade, repetiremos as vezes que forem necessárias. Temos cada vez menos pessoas sem posto de trabalho porque temos uma economia parada, com o consumo sempre a cair e aonde não há crédito nem investimento.

Ao contrário do que nos têm dito não há nenhum problema de comunicação na origem dos problemas do governo. O último dos seus problemas é os cidadãos não perceberem os seus propósitos. Perceberam. Perceberam até bem demais. Esse, sim, é o problema que tem levado PSD e CDS à beira de um ataque de nervos.

Perceberam que o governo lançou o maior ataque de sempre em democracia contra o direito ao salário, através da inimaginável transferência direta do salário dos trabalhadores para os seus patrões.

O empobrecimento dos trabalhadores, financiadores à força dos seus patrões, não tem nada a ver com défice. Esse é apenas o seu pretexto esfarrapado. É um ajuste de contas, como nunca tínhamos visto em democracia, contra o direito que se pensava irredutível: o salário.

Vem agora o governo, ou a fação do governo que ainda está a tentar salvar a face, tentar remendar o irremediável e testar na imprensa uma solução de cosmética. Nenhuma maquilhagem, ou contenção de danos, esconde o evidente. É a primeira vez que, qualquer governo em qualquer parte do mundo, alguém propõe uma diminuição da taxa social das empresas à custa do salário dos trabalhadores.

Só há uma solução para esta proposta disparatada. Recusá-la liminarmente.

Perante a desagregação política da base de apoio dos defensores da austeridade como solução para os problemas criados para a austeridade, começam a surgir vozes, mesmo dentro do PS, a favor de um governo de iniciativa presidencial, com base no PSD, PS e CDS. Essa resposta seria uma fraude à democracia, um desrespeito inqualificável pelos cidadãos. Só a demissão do governo abre caminho para a escolha das alternativas.

A ideia que se pode juntar austeridade à austeridade, empobrecendo ainda mais o país mais pobre da zona euro, sem tocar nos juros da dívida que nos levam mais do que todos os cêntimos gastos em saúde, é a grande derrota destas últimas duas semanas.

Por isso o Bloco reafirma a sua convicção de que a única alternativa construtiva é o corte da dívida, um sistema fiscal justo para recuperar o investimento para criar emprego.

É por essa alternativa que nos bateremos.

Declaração Política na Assembleia da República 19 de setembro de 2012

Sobre o/a autor(a)

Médico. Aderente do Bloco de Esquerda.
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