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Nepal: maoistas dirigem greve geral contra governo maoista

País parou durante meio dia na sexta-feira, numa greve geral convocada pelo Partido Comunista do Nepal-Maoísta, contra o governo do Partido Comunista do Nepal Unificado.
Segundo essa fração, a situação no Nepal só pode ser resolvida através da Revolta Popular, o que levou à cisão do partido maoísta.

O Nepal parou na manhã de sexta-feira com a greve geral, de meio dia (6h-12h), convocada pelos maoístas do recém-fundado Partido Comunista do Nepal-Maoísta, contra o governo dos seus ex-companheiros do Partido Comunista do Nepal Unificado, também maoístas.

A greve, que foi poderosa, parou o importante vale de Kathmandu, e outras áreas desse pobre e abandonado país asiático.

A greve geral foi convocada em protesto à decisão do governo de subir o preço dos produtos derivados do petróleo.

Durante a greve geral, poucos veículos circularam pelas ruas das cidades, não havendo como a população se locomover. O comércio fechou as portas, assim como fábricas, escolas e bancos. Depois do almoço, o comércio voltou a funcionar lentamente.

Por que maoístas lutam contra maoístas no Nepal?

O governo maoísta liderado pelo Partido Comunista do Nepal Unificado é o único exemplo do género em todo o planeta. O maoísmo, curiosamente, tem se expandido na Ásia, nos últimos anos, num momento em que ele praticamente já nem existe no seu país de origem, a China.

O espetacular ascenso maoísta dos últimos anos, nalguns países, pode ser explicado pela deterioração da situação económica do campo, do crescente empobrecimento que a tal globalização levou para os mais longínquos rincões do planeta. Pela falta de perspetiva existente, mesmo nas cidades e inclusive, nos países imperialistas, como vemos com a crise que se abate nos EUA e Europa. É principalmente da miséria existente no campo, diferente de países como Japão, Espanha, Itália ou Portugal, onde a maioria do campesinato goza de outra realidade económica, que o maoísmo retira a sua grande base de apoio.

A outra razão é a inexistência ou extrema debilidade de uma alternativa de esquerda aos velhos partidos comunistas. Aliada a essa situação, cabe lembrar que os países asiáticos nunca saborearam plenamente a democracia, nem mesmo a burguesa e, em muitos países, a repressão é brutal. O melhor exemplo é a Índia, considerada a maior democracia do planeta, pelos meios de comunicação burgueses, mas, que, na prática, tem a esquerda na clandestinidade já que, segundo as leis vigentes, até o Partido Comunista da Índia é considerado uma organização “terrorista”. O que seria de dar gargalhadas, se não fosse uma situação dramática. O mesmo ocorre nas Filipinas, cujo presidente, Benigno Aquino III, é filho de Corazón Aquino, que encabeçou a revolução democrática, Poder Popular, e mantém a esquerda perseguida e assassinada constantemente.

O Nepal é, na realidade atual, o único país do globo que vive um processo de revolução socialista. Viveu, até certo ponto, um processo revolucionário similar à Revolução Russa, de 1917, com a grande diferença de que, no Nepal, não existe nenhum Lenine, Trotsky e nem mesmo algo que se possa parecer a Bukharin, Zinoviev ou Kamenev.

Mais jovem república do mundo

A república do Nepal, cuja população é de 27 milhões de habitantes, é a mais jovem república do mundo, e foi fundada em 2008, como produto da revolução democrática que liquidou a monarquia nepalesa depois de uma guerra popular, liderada pelos maoístas, que durou dez anos, de 1966 a 2005. A vitória da revolução democrática, num dos países mais atrasados da terra, onde milhões de camponeses sequer viram uma lâmpada elétrica acesa, faz com que o processo se transforme, contra a vontade de todos os dirigentes políticos, sem nenhuma exceção, num processo de revolução socialista, já que o débil regime burguês surgido da derrota da monarquia, chegando atrasado num mundo globalizado, não é capaz de se desenvolver nos marcos capitalistas. E, exatamente por isso, é incapaz de atender aos anseios das massas, que ,com armas nas mãos, depois de uma longa guerra que custou 12 mil mortos, implantaram um novo regime para verem as suas vidas melhorar.

Não há como contar a complexa história recente nos marcos deste artigo, mas, para sintetizar, os acontecimentos recentes são produtos da greve geral revolucionária de maio de 2010, que parou o país por vários dias e derrubou o governo do primeiro-ministro Madhav Kumar Nepal, do Partido Comunista do Nepal (Unificado Marxista-Leninista, UML), substituído posteriormente por Jhala Nath Khanal, também deste mesmo partido. Desde a poderosa greve geral revolucionária, foram meses de peripécias e malabarismos políticos, que mantiveram o país no beco sem saída desde que foi formado. Um período marcado por um demencial show de politicagem, sem paralelo histórico, que levou ao fracasso recente da Assembleia Constituinte, que deveria coroar a revolução democrática, gerando mais crise política. Após o fracasso dos governos da UML, o Partido Comunista do Nepal Unificado, maoísta, voltou ao poder, através do mandato de um de seus principais dirigentes, o atual primeiro-ministro Baburam Batharai. A subida de Batharai ao poder acirrou os confrontos nas fileiras maoístas, transformando a discussão política interna num choque público nos jornais e televisão.

Revolta popular

De volta ao governo, os maoístas, em vez de enveredarem para o caminho do aprofundamento do curso socialista, já que a própria realidade do país não deixa outra escolha, se transformaram nos agentes da burguesia para enfrentar as suas próprias bases, os milhões de pobres nepaleses. Ao cumprir este papel, uma fração, liderada pelo ex-vice-presidente do partido, Mohan Baidya, rebelou-se publicamente, acusando o governo maoísta de estar traindo a revolução contra as massas populares. Segundo essa fração, a situação no Nepal só pode ser resolvida através da Revolta Popular, o que levou à cisão do partido maoísta. O Partido Comunista do Nepal – Maoísta, cujo principal dirigente é Mohan Baidya, foi formado em junho deste ano, após uma luta fracional pública de dois anos no interior do Partido Comunista do Nepal Unificado.

Na oposição, o partido de Baidya convocou a greve geral de sexta-feira, 14 de setembro. Se, aparentemente, a mobilização aparece como uma guerra de maoístas versus maoístas, na realidade não o é. A poderosa greve geral de meio-dia, demonstrou que a revolução socialista no Nepal se mantém viva e que seu curso é ascendente. Não se trata, portanto, de uma luta entre maoístas. Trata-se da luta da revolução socialista contra aqueles maoístas que se colocam no seu caminho, defendendo a débil e impotente burguesia nepalesa.

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