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A geração adaptável e a produção do consentimento

Publicamos o resumo da comunicação de João Teixeira Lopes, que fala da interiorização por parte de uma larga parte dos “jovens adultos” das novas classes médias urbanas de um ethos baseado na ”flexibilidade”, no “empreendedorismo”, nas “novas tecnologias da informação e da comunicação”.
Foto de Paulete Matos

Uma das contribuições matriciais de Gramsci consistiu em demonstrar que os factores imateriais e simbólicos são tão decisivos quanto os económicos na reprodução do sistema capitalista. Na verdade, a hegemonia é igual à coerção + consenso (ou “coerção revestida de consenso”). Castoriadis, por seu lado, acentua a produção do consentimento como nó górdio da perpetuação do capitalismo: “O sistema capitalista só pode sobreviver tratando de reduzir continuamente os assalariados a simples executantes e só pode funcionar na medida em que esta redução não se opere. O capitalismo está obrigado a solicitar constantemente a participação que ele mesmo trata, por outro lado, de impossibilitar”. Bolstanski e Chiapello mostram ainda como o capitalismo absorve parte das críticas que lhe são dirigidas para se poder metamorfosear.

Ora, falarei precisamente da interiorização por parte de uma larga parte dos “jovens adultos” das novas classes médias urbanas de um ethos baseado na ”flexibilidade”, no “empreendedorismo”, nas “novas tecnologias da informação e da comunicação”.

A artistização do capitalismo pode ser encarada como uma fórmula adaptativa que lhe permite mobilizar os trabalhadores criativos, doravante essenciais para a produção, circulação e destruição de mercadorias em regime de acumulação flexível. Todos esses trabalhadores, enfim, que fazem do seu quotidiano uma obra de arte, antes mesmo de fazerem as obras de arte, e que constituem hoje um núcleo relativamente numeroso e central dos novo pessoal dos serviços com forte pendor intelectual e científico, juvenilizado e tendencialmente precário. Não falamos, pois, apenas do violoncelista, do escultor, do pintor ou do escritor. Falamos, também, de todos os técnicos superiores que trabalham na criação de conteúdos e no manuseamento de informação, frequentemente para grandes grupos económicos globais. Profissionais que conciliam, no seu habitus, “o impulso para resistir” e “a fantasia da autonomia” incorporando discretamente os valores da acumulação flexível em nome de um pendor libertário e anti-burocrático; profissionais que se representam como autónomos, libertos de constrangimentos (horários, rotinas, patrões) e sob a lógica nómada do projecto. Profissionais que transformam as cidades, reciclando espaços urbanos residuais, intersticiais ou vazios numa lógica cultural e artística, gerando novos contextos físicos e organizacionais para as suas práticas (casas e fábricas abandonadas, velhos armazéns, etc.), inserindo-se em novas categorias, tantas vezes de dupla pertença (empreendedores em part-time e assalariados precários, por exemplo), criando novos ambientes organizacionais e cenários de interacção que definem como co-working ou open-spaces; formando cooperativas e associações, saltando da restrita esfera da arte para as mais largas atmosferas estetizantes. Profissionais adaptáveis, num capitalismo em metamorfose parcial. Profissionais, em suma, que vivem o paradoxo, assinalado por Beck de se criarem a si próprios por obrigação social, pressuposto do individualismo institucionalizado da segunda modernidade.

A resistência “vê-se assim deslocada e tornada inócua”, como acertadamente aponta Richard Lloyd aos neo-boémios. Iludidos (alienados?), participam no sistema, ainda que fortemente explorados.

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Neste dossier:

Socialismo 2012

O Fórum de Ideias "Socialismo 2012", organizado pelo Bloco de Esquerda em Santa Maria da Feira, foi o mais participado de sempre. Neste dossier reunimos resumos feitos pelos autores das apresentações nos painéis de debate, artigos sobre algumas das sessões, fotogaleria e vídeos com entrevistas a participantes. Dossier organizado por Luís Branco.

Fotogaleria do Socialismo 2012

A fotógrafa Paulete Matos captou alguns dos momentos das sessões e dos intervalos deste Fórum de Ideias do Bloco de Esquerda.

"É preciso cortar com o memorando da troika para recuperar a economia"

No encerramento do Fórum Socialismo 2012, Francisco Louçã apresentou medidas para travar a agenda de empobrecimento do Governo. E sublinhou que o resultado do primeiro ano do memorando da troika, no qual a direita cortou salários, aumentou impostos e fez disparar o desemprego, é que a dívida portuguesa aumentou 18.374 milhões de euros.

"A esquerda europeia tem de ser a melhor oposição à austeridade"

O debate sobre a "Encruzilhada da Europa em Crise e a Alternativa da Esquerda" juntou no Socialismo 2012 a eurodeputada Marisa Matias e dirigentes do Parti de Gauche francês e do Syriza grego.

"O modelo privatizador liquidou a social-democracia"

Na sessão de abertura, Luís Fazenda e Pedro Nuno Santos debateram "os caminhos do socialismo". O deputado do PS garantiu que nunca haverá uma cisão de esquerda no seu partido e Luís Fazenda defendeu o regresso à agenda da esquerda do tema da propriedade pública de setores fundamentais para financiar o Estado Social e as políticas socialistas.

"RTP não pode deixar de ter dois canais"

No painel do Fórum Socialismo 2012 sobre a ameaça privatizadora ao serviço público de televisão, o cineasta António Pedro Vasconcelos defendeu a necessidade de dois canais de serviço público e criticou a irresponsabi-lidade dos partidos que endividaram a empresa para agora a entregarem com lucro garantido aos privados.

A "Sociedade da Austeridade" em debate no Socialismo 2012

O sociólogo António Casimiro Ferreira apresentou o painel "Crítica da teoria política da austeridade"  e defendeu que o modelo de austeridade que Portugal vive "é um ajuste de contas histórico com o 25 de Abril".

Lei dos Compromissos e do Setor Empresarial Local são devastadoras para a criação cultural

O diretor do Centro Cultural Vila Flor, em Guimarães, esteve no Socialismo 2012 para apresentar o painel "Fora de Lisboa também se faz cultura". Mas com a recente Lei dos Compromissos do Estado e a do Setor Empresarial Local, agora publicada, José Bastos antevê "a extinção de muitas companhias" que hoje asseguram a presença da cultura em muitas localidades.

Vídeos do Socialismo 2012

Publicamos os vídeos da sessão de abertura e encerramento do Socialismo 2012, bem como entrevistas a António Pedro Vasconcelos sobre a privatização da RTP, a José Bastos sobre as ameaças à criação artística no país e a Casimiro Ferreira sobre o modelo de austeridade hoje imposto à sociedade.

Gramsci e as Relações Internacionais

Publicamos a comunicação de Bruno Góis, intitulada "Gramsci e as Relações Internacionais: um tubo de ensaio", sobre as origens e a evolução do pensamento das Relações Internacionais.

Encruzilhadas da dívida

Publicamos o resumo da comunicação de João Camargo, "Encruzilhadas da dívida: cenários, mitos e realidades", que pretendeu fazer uma reflexão aberta sobre as consequências das variadas propostas políticas e económicas para lidar com a questão das dívidas.

Trabalho sexual é trabalho (?)

Publicamos o resumo da comunicação de Alexandra Oliveira, que partiu dos estereótipos sobre a prostituição e as pessoas que se prostituem para chegar a uma visão próxima e subjectiva que devolve a voz aos actores do trabalho sexual

A actualidade do projeto de Karl Polanyi

Publicamos o resumo da comunicação de João Rodrigues, intitulada "O liberalismo é utópico, o socialismo é realista: A actualidade do projecto de Karl Polanyi"

“Juntar forças na pluralidade das opiniões”

O deputado bloquista Pedro Filipe Soares explica que, com esta iniciativa, o Bloco pretende “juntar forças na pluralidade das opiniões”. O Socialismo 2012 começa hoje, pelas 21h30, em Santa Maria da Feira, com uma sessão que conta com as intervenções de Luís Fazenda e Pedro Nuno Santos. Ver programa.

O impacto da ‘Crise de 1929’ na Ditadura

Publicamos o resumo do painel apresentado por João Paulo Avelãs Nunes, "A ‘Crise de 1929’, a ‘Grande Depressão’ e o respectivo impacto na Ditadura Militar e no Estado Novo".

Precarização em Portugal e o trabalho na nova economia

Resumo da comunicação de Moisés Ferreira sobre os desafios que a nova economia coloca ao trabalhador enquanto sujeito psicológico.

Canábis, da proibição à descriminalização

Um dos painéis de debate do Socialismo 2012 intitulou-se "Drogas: proibicionismo é solução?". Pedro Pombeiro, da MGM Lisboa, explica a história legislativa das drogas nas últimas décadas em Portugal.

O estertor do marcelismo e o combate à ditadura

Publicamos o resumo da comunicação de Miguel Cardina, "Becos da História: o estertor do marcelismo, o combate à ditadura e a construção de uma hegemonia de esquerda".

A geração adaptável e a produção do consentimento

Publicamos o resumo da comunicação de João Teixeira Lopes, que fala da interiorização por parte de uma larga parte dos “jovens adultos” das novas classes médias urbanas de um ethos baseado na ”flexibilidade”, no “empreendedorismo”, nas “novas tecnologias da informação e da comunicação”.

O que falta no SNS? Orçamento? Profissionais?

Resumo da comunicação de Cílio Correia sobre os problemas com que se defronta o SNS e a contestação de vários aspetos da política de Saúde do Governo PSD/CDS.

Gramsci e o Rendimento Social de Inserção

Um dos painéis de debate foi apresentado por Ricardo Sá Ferreira e intitula-se "Gramsci e o RSI: hegemonia e discurso sobre a pobreza em Portugal". Publicamos aqui o resumo.

Feminismos e Austeridade

Magda Alves e Nádia Cantanhede apresentaram um dos painéis de debate sobre o impacto da crise e das respostas austeritárias sobre as mulheres. Publicamos aqui o resumo.

Da crise de 1890 ao sonho republicano

Publicamos aqui a comunicação do historiador Luís Farinha, centrada na situação portuguesa na viragem do século XIX.

30 anos de "Blade Runner"

Num dos painéis do Socialismo 2012, Ivar Corceiro revisita o filme "Blade Runner", lançado em 1982, sublinhando as suas características de crítica do modelo capitalista. Publicamos aqui o resumo.

O grande assalto aos bancos - onde estão os ativos?

Publicamos o resumo da intervenção de José Castroque apontou a responsabilidade dos bancos na atual crise através das escolhas desastrosas nos seus investimentos financeiros, que hoje estão a ser pagas pelos contribuintes através do seu salário e do desmantelamento de serviços públicos.