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O R(a)etificativo

Este orçamento não retifica, ratifica a vontade do governo na política da austeridade que está a destruir o país.

O Orçamento Retificativo apresentado pelo governo é um documento que, antes de o ser, já o era. Estranho? Nem por isso. O governo apresentou como motivação para o orçamento retificativo a necessidade de acomodar a despesa relativa à transferência do fundo de pensões da banca. Contudo, o valor aproximado desta despesa já era conhecido em meados de Novembro passado, portanto, ainda antes do debate do Orçamento de Estado para 2012 ter terminado. Logo, este retificativo existe, porque o governo já pretendia que ele existisse. E essa motivação é fácil de explicar: ter uma desculpa para atualizar os dados macroeconómicos, sem ter que dar essa justificação.

Os dados macroeconómicos dão conta das piores previsões. A austeridade está a impor a recessão; a recessão destrói a economia e o emprego; a recessão ataca o desequilíbrio das contas públicas, com menos receita fiscal e mais despesa. Esta é a espiral recessiva que estamos a enfrentar, fruto de um caminho político que nos está a empurrar para um beco sem saída, que não tem qualquer medida capaz de criar crescimento económico. Esta é a imagem da destruição do país levada a cabo pelo Governo da Troika.

Há várias formas para analisar uma economia. Mas, quem considera que a economia deve servir as pessoas, pergunta, antes de tudo o resto, qual é a taxa de desemprego. Aí está a maior prova da incapacidade das políticas seguidas: Em apenas quatro meses, a taxa de desemprego prevista para 2012 passou de 13,4% para 14,5%. A frieza deste retificativo dá conta que o desemprego está fora de controlo e que o governo em vez de trazer soluções, está a criar mais problemas. O mesmo é indicado nos dados da recessão. No mesmo período as previsões que já eram negativas, agravaram-se em cerca de 0,5 pontos percentuais. Significa que iremos ficar cerca de 850 milhões de euros ainda mais pobres do que o previsto. O mau que já nos era prometido, está a ficar pior. Esta degradação das previsões para 2012 para a economia portuguesa dá conta de, em apenas quatro meses, ter sido destruída riqueza em valor similar ao corte líquido que os funcionários públicos tiveram com o corte dos subsídios. Este é, portanto, o caminho dos sacrifícios sem fim à vista.

Os dados das receitas fiscais são um bom exemplo para mostrar que o aumento de impostos subiu para níveis que já não são possíveis de aguentar. O IVA, que aumentou brutalmente em outubro para a eletricidade e para o gás e em janeiro para um largo conjunto de produtos, está a gerar ainda menos receita do que gerou em 2011. As previsões para a receita do IRC e do IRS dão conta de montantes menores do que no ano de 2011, apesar de também terem aumentado. A grande maioria dos portugueses paga impostos acima das suas possibilidades e o país não aguenta esta carga fiscal.

Um Orçamento Retificativo serve para corrigir aquilo que a execução orçamental demonstra que está a correr mal. Este retificativo, identificando o disparar da recessão, um brutal aumento do desemprego e uma clara exaustão fiscal, não apresenta qualquer aprendizagem com esta realidade. Pelo contrário, o governo insiste no erro. Os sacrifícios continuam a ser pedidos a quem já não consegue apertar mais o cinto, em nome de um caminho que se sabe não ter saída. Não há qualquer cêntimo para o apoio à economia, qualquer ideia de crescimento público, ou qualquer medida para trazer justiça à repartição dos sacrifícios. É mais um orçamento sob o domínio da austeridade e, com essa submissão, condena o país ao empobrecimento. Este orçamento não retifica, ratifica a vontade do governo na política da austeridade que está a destruir o país.

Sobre o/a autor(a)

Deputado, líder parlamentar do Bloco de Esquerda, matemático.
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