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Não é a falar que a gente se entende

O debate que costuma acompanhar a questão do papel da tauromaquia na sociedade portuguesa actual é inevitável e, em boa medida, apaixonante: envolve e empolga os participantes, suscita posições vincadas e raramente deixa as pessoas indiferentes. Artigo de Pedro Ribeiro.

O debate ocorre, essencialmente, em dois planos: o emocional e o intelectual.

Emocionalmente, a propensão natural que as pessoas têm para querer o bem dos animais leva-nos a condenar as touradas. É preciso incorrer num exercício de pura dissonância cognitiva para considerar que a tortura é para o bem do próprio animal, ou que ele sai de alguma forma beneficiado dessa situação. Agredir e massacrar um animal fere a sensibilidade da maioria das pessoas. Isso é consensual.

Intelectualmente, o debate tem uma dimensão muito diferente: apela à argumentação, ao raciocínio e ao conhecimento científico. Nestes três elementos, a tauromaquia ressurge como uma actividade desnecessária, extemporânea, negativa e indesejada. Escavam-se os argumentos mais rebuscados tentando defender o indefensável mas, após tudo ser considerado, o princípio fundamental do direito à vida e ao bem-estar dos animais continua a ser o valor mais importante da equação.

A dinâmica do antigo debate em volta do assunto faz com que as mesmas questões sejam reutilizadas inúmeras vezes, perpetuando um assunto que, por mais voltas que se lhe dê, se resume a isto: um animal é massacrado em praça pública, agoniza com os ferimentos que sofreu e, invariavelmente, morre após a lide. A crueza específica deste facto contrasta com a ampla dimensão do debate em volta da questão.

Quanto mais se fala nos argumentos morais, éticos, sociais, científicos e económicos a favor e contra a tourada, mais abandonamos o verdadeiro tema: o touro que é massacrado, que agoniza e que morre. Essa é a questão fundamental que está em jogo. Tudo o resto, por mais interessante que seja no intelectual exercício do debate, é floreado.

A discussão é essencial, sim. A dimensão da tauromaquia em Portugal justifica o exercício responsável de considerar argumentos, medidas, consequências… Porém, a cada argumento usado, a cada consideração, a cada debate corresponde mais uma conceptualização de algo muito real: um animal que morre em agonia.

E sim, tenho perfeita noção do contra-senso que é falar acerca disso.

política: 
Animais
(...)

Neste dossier:

Direitos dos Animais

O modo de produção capitalista e a forma como provocamos sofrimento aos animais não-humanos entram em notória contradição com o conhecimento adquirido acerca da senciência de muitos animais, incluindo todos os animais vertebrados, e a consciência do nosso parentesco evolutivo com as outras espécies. Dossier organizado por Mariana Carneiro.

Debate Direitos dos Animais

Este sábado, o Bloco de Esquerda organizou um debate sobre Direitos dos Animais, que contou com a participação da deputada do Bloco Catarina Martins, o biólogo Hugo Evangelista e o ativista dos direitos dos animais Ricardo Sequeiros Coelho. Após o debate esquerda.net recolheu o testemunho dos três oradores. Ver vídeo.

Cábula para o especialista instantâneo em direitos dos animais

Os preconceitos alastram ao sabor do zeitgeist e uma vez estabelecidos, passam a fazer parte do senso comum e deixam de ser questionados. Neste artigo, Cristina DʼEça Leal e Pedro Ribeiro procuram desmontar algumas dessas “ideias feitas”.

Todos diferentes, todos animais

Somos todos diferentes e o problema não é reconhecer e admitir a diferença, mas sim hierarquizar os outros com base nessa diferença. A inteligência é a capacidade de resolver novos problemas e isso não é exclusivo dos humanos. Artigo de Cristina D'Eça Leal.

Animais: as “coisas” de que não falamos

A questão que aqui se coloca é a de que posição é que devemos assumir perante estes animais. E esta é uma questão crucial na modernização ética da sociedade humana. Artigo de Mariana Pinho.

Uma nova geração que defende os animais

Enquanto vivermos da exploração dos animais nem eles nem nós, humanos, seremos livres. Artigo de Hugo Evangelista.

Direitos dos animais, uma causa da esquerda

A evolução humana prende-se com a evolução da forma como tratamos o outro. Aquele sobre o qual temos poder. A nossa evolução prende-se com o repensar a nossa posição no mundo, na vida, e na nossa posição em relação ao outro que tocamos com a nossa existência. Artigo de Luísa Ferreira Bastos e Ricardo Sequeiros Coelho.

Não é a falar que a gente se entende

O debate que costuma acompanhar a questão do papel da tauromaquia na sociedade portuguesa actual é inevitável e, em boa medida, apaixonante: envolve e empolga os participantes, suscita posições vincadas e raramente deixa as pessoas indiferentes. Artigo de Pedro Ribeiro.

Esterilização e Eutanásia

Defender a Esterilização e em alguns casos até a Eutanásia são posições que geram sempre alguma surpresa quando vindas de quem assume defender os direitos e a protecção animal. Artigo de Cassilda Pascoal.

Circos com animais: The Saddest Show on Earth

O bonito e luminoso espectáculo que pode ser um circo com animais, onde estes parecem felizes e contentes, a saltarem e dançarem, é na verdade a fachada de um campo de tortura e escravatura animal. Artigo de Cassilda Pascoal.

O Conflito Estudantil da Garraiada Académica

Na garraiada académica nega-se o direito inegável de se sentir, superioriza-se uma existência face a outra, na mesma premissa em que assentou a escravatura no Império Português até 1878. Artigo de Irina Castro.

Será o Vegetarianismo um ato político?

Desde sempre a alimentação tem sido o reflexo das culturas dos países, cidades ou comunidades onde a humanidade reside. Por todo o planeta, assistimos a uma diversidade imensa de pratos e sabores que enriquecem os povos ou os demarcam do resto do mundo. Artigo de João Pedro Santos.

Direitos dos Animais: O que deve a esquerda propor?

Na minha perspetiva, importa que a Esquerda continue a manter os temas dos Direitos dos Animais na agenda parlamentar e no debate público. Texto de Manuel Eduardo dos Santos