Novo código do trabalho aprovado só com os votos do PS

27 de December 2008 - 0:00
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Fazendo tábua rasa das suas propostas enquanto oposição, o Partido Socialista aprovou o novo código do trabalho, merecendo rasgados elogios dos patrões e da direita. O fim do pagamento de horas extraordinárias, a legalização da precariedade e o ataque s convenções colectivas são algumas das novas regras que fazem de 2008 o ano em que a balança voltou a pender para o lado dos mais fortes. Só que nem tudo foram rosas para PS e Patrões, dado que o Tribunal Constitucional chumbou uma das normas do código, que assim voltará ao parlamento em 2009.





O Código do trabalho foi aprovado no parlamento, em votação final global, no dia 7 de Novembro de 2008. A favor votou apenas o Partido Socialista, tendo PP e PSD optado pela abstenção. BE, PCP e Verdes votaram contra, tal como cinco deputados do PS: Manuel Alegre, Teresa Portugal, Júlia Caré, Eugénia Alho, e Matilde Sousa Franco. No entanto, esta não foi ainda a sentença final da Assembleia da República sobre o diploma, dado que em Dezembro o Tribunal Constitucional confirmou as dúvidas de Cavaco Silva e devolveu o diploma ao parlamento. Em causa está a inconstitucionalidade do alargamento do perídodo experimental de três para seis meses, medida fortemente criticada pela oposição por generalizar a precariedade, permitindo aos patrões prescindirem de contratos a termo através de despedimentos rotativos de seis em seis meses.



Mesmo assim, tanto para a CGTP, como para Bloco e PCP, muitas outras medidas podiam ser consideradas inconstitucionais. Com o novo código do trabalho, os trabalhadores podem ter que laborar 12 horas num dia ou em três dias seguidos. Outra das grandes alterações é a criação do "banco de horas" que na prática acaba com a remuneração das horas extraordinárias, dado que qualquer hora a mais é compensada com uma hora a menos noutra altura. Ou seja, ao permitir trocar horas a mais por horas a menos, as empresas conseguem evitar os encargos que actualmente suportam com horas extraordinárias. Para o especialista em Direito do Trabalho Casimiro Ferreira, a flexibilidade horária foi a grande mortivação para a reforma do código do trabalho. "Num país como o nosso, onde os salários são baixos, as horas extraordinárias servem como complemento de salário. A partir do momento em que se consigam introduzir factores de adaptabilidade na flexibilidade horária, ela traduz-se também em flexibilidade salarial. E aí baixam os custos de produção. Essa é a verdadeira motivação para a reforma do código." Curiosamente ou talvez não, o próprio Partido Socialista, pela boca do deputado Strecht Ribeiro, confirmou esta ideia. "É óbvio que a adaptabilidade vai permitir às empresas poupar nos custos com as horas de trabalho extraordinário".





Outra das medidas mais contestadas é a agilização dos despedimentos. No início das negociações o governo começou por propor a figura do despedimento por inadaptação, fornecendo aos empresários um argumento para despedir sem justa causa. Esta medida viria a cair como moeda de troca para que a UGT assinasse o novo diploma. No entanto, mantiveram-se os "despedimentos simplex", isto é, a simplificação profunda dos despedimentos, com muitas das formalidades a deixarem de ser obrigatórias, ao mesmo tempo que se complica a vida dos trabalhadores que precisam defender-se dos despedimentos sem justa causa.



A posição da UGT em todo o processo negocial ficou aliás envolta em polémica. O seu líder, João Proença, também da direcção do Partido Socialista, participou em várias sessões de esclarecimento a militantes do PS sobre "as vantagens do novo código do trabalho", ao lado de José Sócrates ou do Ministro do trabalho Vieira da Silva. O Bloco de Esquerda denunciou o facto no parlamento, permitindo ao primeiro-ministro exibir uma das suas maiores irritações de todo o ano parlamentar. No dia 25 de Junho, a UGT foi a única central sindical a assinar com governo e patrões o código do trabalho. Quando perguntado por que motivo a UGT repetidamente assina acordos deste tipo João Proença foi lacónico: "Como a CGTP não assina nada, a UGT tem de assinar."



Mas as normas gravosas para os trabalhadores presentes no novo código do trabalho não se ficam por aqui. Em matéria de convenções colectivas reduziu-se a caducidade de 10 para cinco anos. Sócrates considerou mesmo os contratos colectivos de trabalho como "um atraso de vida" e classificou o ataque a estes instumentos como "uma das mudanças mais importantes para Portugal e para o nosso futuro". O novo código do trabalho acaba também com o princípio do tratamento mais favorável, que permitia ao trabalhador não acatar cláusulas ou regras piores do que as consagradas na lei geral. Outra medida negativa para os trabalhadores é aquela que prevê que um trabalhador possa aderir individualmente à convenção colectiva de trabalho no seu sector. Para além do apelo à não-sindicalização que isto implica, os sindicatos pouco representativos passam a ser privilegiados nas negociações, favorecendo ainda mais o lado patronal.



O novo código do trabalho mereceu rasgados elogios de Francisco Van Zeller, o líder dos patrões, que declarou mesmo que "Felizmente temos José Sócrates". E esclareceu: "Os governos de direita são mais tímidos no que respeita a relações de trabalho. Os governos de esquerda são mais ousados, porque é uma matéria que conhecem bem. Este ministro e esta equipa são especializados e souberam muito bem até onde podiam ir. Isto é mérito de especialistas".



Também o PSD fez questão de mostrar o seu agrado com o abandono das propostas que o PS defendeu enquanto oposição, uma verdadeira cambalhota de 180º. As declarações de Rangel não podiam ser mais esclarecedoras: "a primeira melhoria é que o PS abandonou por completo as suas propostas de 2003, de 2002, de 2004, portanto deu uma cambalhota de 180 graus mudando por completo. Vem no bom caminho", congratulou-se o líder parlamentar do PSD.



Quem não gostou da reviravolta do PS foram os trabalhadores que, a 5 de Junho, numa manifestação convocada pela CGTP, expressaram todo o seu desagrado em relação ao novo código do trabalho, com uma mobilização espantosa de mais de 200 mil pessoas.



Por fim, em matéria de combate à precariedade, o governo apresentou algumas medias com pompa e circunstância mas que logo se revelaram muito polémicas. No novo código, os contratos a prazo são penalizados e os patrões passam a pagar 5% da segurança social no caso dos trabalhadores a recibos verdes. Bloco, PCP e os novos movimentos de jovens precários acusaram o governo de querer "legalizar a precariedade", abstendo-se de combater os falsos recibos verdes. Foi o próprio líder da JS quem reconheceu que estas medias não atacam os falsos recibos verdes, "apenas os tornam mais caros para os patrões". E, naturalmente, os patrões apressaram-se em dizer que nenhuma destas medidas os penalizaria, bastando para isso reduzir os salários dos trabalhadores ou recorrer a mais despedimentos.

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