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Florestas, a variável de ajuste da contaminação climática

O reflorestamento aparece como solução de emergência para o aquecimento global. O seu financiamento é muito complexo e nem existe consenso em duas questões básicas: o que é uma floresta e qual o seu valor. Por Stephen Leahy/IPSNews.
Floresta Amazónica. Foto Lubasi/Flickr

As florestas podem converter-se na variável de ajuste da contaminação climática. Como os países aumentam, em vez de reduzirem, as suas emissões de gases-estufa, especialistas acreditam que é impossível conter a elevação da temperatura mundial sem diminuir drasticamente o desmatamento. A cada ano, são destruídos 13 milhões de hectares de florestas, um problema ao qual a Organização das Nações Unidas (ONU) decidiu dedicar este 5 de Junho, Dia Mundial do Meio Ambiente.

Em 2010, as emissões mundiais de dióxido de carbono – o gás-estufa mais abundante – foram 5% mais altas do que em 2008, informou no final de Maio a Agência Internacional de Energia. Por isso, a meta de manter em dois graus Celsius o aumento da temperatura mundial é cada vez mais inalcançável. Na fotossíntese, a vegetação absorve gás carbónico presente na atmosfera que, já solidificado como carbono, permanece “sequestrado” ou “preso” nas árvores enquanto estas estão viverem.

“Precisamos que as florestas fechem essa brecha de carbono”, disse Stewart Maginnis, director do Programa de Conservação Florestal, da União Internacional para a Conservação da Natureza (UICN). Os compromissos de redução de emissões assumidos em 2009 pelos países signatários do Acordo de Copenhaga não bastam para impedir que as temperaturas mundiais excedam os dois graus, limite que a ciência acredita que pode evitar uma mudança climática desastrosa.

O desmatamento representa 17% dessas emissões anuais. “Não há plano B. Precisamos desesperadamente que as florestas e o reflorestamento absorvam o excesso de carbono” da atmosfera, disse Maginnis ao Terramérica, de Kigali. As florestas não só armazenam dióxido de carbono como libertam oxigénio e proporcionam água para 50% das maiores cidades do mundo. As florestas abrigam mais da metade dos animais e das plantas silvestres, e o sustento de aproximadamente 1,6 mil milhões de pessoas depende delas, segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma).

O desmatamento continua a um ritmo alarmante: a cada ano, 13 milhões de hectares (equivalentes à superfície da Nicarágua) são destruídos para se explorar madeira ou ganhar terra para a agricultura e a pecuária. O Pnuma, a UICN e muitas outras organizações acreditam que a melhor, e talvez a única, oportunidade de conter esse processo é a iniciativa REDD+ (Redução de Emissões de Carbono Causadas pelo Desmatamento e pela Degradação das Florestas).

Os países e as indústrias que devem reduzir suas emissões de carbono podem abatê-las de facto, ou adquirir créditos de carbono para compensá-las, financiando programas REDD ou REDD+. Quando a iniciativa vai além de maximizar o armazenamento de carbono, garantindo a protecção da biodiversidade e o sustento das comunidades locais, chama-se REDD+. “As REDD+ são a única maneira de mobilizar fundos suficientes para enfrentar as causas do desmatamento”, disse Maginnis.

No entanto, a REDD e outros mecanismos de mercado não funcionarão para proteger as florestas, disse Bram Büscher, do Instituto Internacional de Estudos Sociais, da Universidade holandesa Erasmus. “Num sistema económico capitalista, fazer dinheiro vai contra os benefícios ecológicos”, disse Büscher ao Terramérica. “É simplista afirmar que com a REDD todos ganham. O capitalismo supõe que haja ganhadores e perdedores”, ressaltou. “Estamos tentando manipular o sistema para torná-lo funcional para a economia verde. É uma farsa”, acrescentou.

A ONU e outras instituições impulsionam mudanças para economias verdes mediante a crescente adopção de energias limpas e renováveis e a redução drástica da exploração de recursos naturais, de resíduos e de contaminação, assegurando ainda a satisfação das necessidades dos mais pobres. O capitalismo criou a crise múltipla que enfrentamos, e é pouco realista acreditar que também será a solução, destacou Büscher, que trabalhou em África por mais de uma década. Para ele, a “REDD é um novo tipo de colonialismo. É nos países ricos onde são necessárias mudanças reais e urgentes”.

As nações industrializadas têm de implementar reduções importantes em seu consumo de energia e de recursos, mas, “não estão dispostas a isso”, afirmou Büscher. Muitos europeus protestaram contra o plano de construção de uma estrada que atravessaria o Parque Nacional Serengueti, na Tanzânia. A China precisa dela para extrair metais raros usados na fabricação, por exemplo, de telefones celulares. “Quem, na Europa, está disposto a deixar de comprar o último celular inteligente?”, perguntou Büscher.

Maginnis, por outro lado, insiste que a REDD não é uma desculpa para que os países ricos não combatam a sua própria contaminação. Pelo contrário, argumenta, estas nações devem concretizar grandes reduções nas emissões e desembolsar uma quantia elevada em investimento inicial para conservar e plantar florestas. “Temos que conseguir que a REDD tenha sucesso, e isto exclui esquemas irrestritos de mercado. Trata-se de garantir uma adequada posse da terra e direitos para as comunidades locais”, afirmou.

O desmatamento costuma ser resultado de pressões económicas externas. Se não for abordado, estarão condenados os esforços para conservar ecossistemas e atenuar a mudança climática, conclui o estudo “Embracing Complexity: Meeting the Challenges of International Forest Governance. A Global Assessment Report” (Abarcar a Complexidade: como Cumprir os Desafios da Governança Florestal Internacional. Um Informe de Avaliação Mundial).

A iniciativa REDD promete mobilizar fundos para a conservação a fim de resistir a essas pressões, mas são necessárias instituições firmes para que as florestas estejam realmente protegidas, disse Jeremy Rayner, presidente da União Internacional de Organizações de Pesquisa Florestal, que publicou o estudo em Janeiro. Inclusive, os programas REDD “explicitamente valorizam mais o armazenamento de carbono do que a melhoria da saúde da floresta e o sustento das pessoas” que vivem delas, conclui o informe.

A REDD não é a solução para todos os problemas, disse Rayner ao Terramérica. “Na maioria das regiões, as instituições não são suficientemente fortes para dirigir a sua implantação”, afirmou. As soluções de mercado podem ter um papel nalguns lugares e o financiamento mediante empréstimos ou doações pode funcionar muito melhor em outros, explicou. Além disso, há problemas sérios para dar um valor às florestas, e nem mesmo há consenso sobre o que é uma floresta. “Há quem afirme que uma plantação de palma é uma floresta porque sequestra carbono. Para saber o que funciona em cada lugar, devemos testar diferentes mecanismos de um modo aberto e transparente”, recomendou.


Artigo de Stephen Leahy/IPSNews/Envolverde.

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