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Nuno Sena (2): "O Indie tenta sempre fugir do óbvio"
Nesta segunda parte da entrevista, Nuno Sena fala sobre a forma como o IndieLisboa está estruturado, de forma a facilitar a consulta dos rpogramadores e o acesso do público. Mas insiste: o Indie tem como critério fugir do óbvio. "Não apanham o IndieLisboa a fazer uma retrospectiva de um autor, mesmo que gostemos muito dele, que esteja muito divulgado no mercado português."
Entrevista de Olímpio Alves
O Festival apresenta várias secções. Porquê essa divisão?
As secções do festival e a sua compartimentação têm a ver essencialmente com questões de mais fácil comunicação das propostas de programação. Todos os filmes são diferentes e valem por si, mas percebemos que é mais fácil se os filmes forem enquadrados no âmbito de uma secção, que à partida dá uma série de orientações de leitura do que poderá ser o filme. Por essa razão, criámos a secção Laboratório e IndieMusic a partir da terceira edição, ou a secção IndieJúnior a partir da segunda edição, dedicada ao cinema infanto-juvenil. Foi uma questão de especialização, de fragmentação da programação com o objectivo de facilitar a consulta para os programadores e para o público, que de ano para ano é cada vez maior.
Todos os anos são feitas retrospectivas e homenagens a realizadores, como é feita essa selecção?
Neste festival só acontecem coisas que os três directores do festival querem a nível da programação. Para haver qualquer ideia nova neste festival tem de passar por estas três pessoas. Mesmo que não seja objecto de unanimidade, ela tem de ser muito "acarinhada" por uma pessoa. Todos os filmes e realizadores que são mostrados no festival têm por trás um programador que se apaixonou pelo seu trabalho, isto é importante como génese. Digamos que o primeiro critério é o da paixão, tem de haver uma relação muito especial com o objecto, a vontade de partilha desta paixão com o público.
Como segundo critério, temos tentado fugir ao óbvio. Não apanham o IndieLisboa a fazer uma retrospectiva de um autor, mesmo que gostemos muito dele, que esteja muito divulgado no mercado português. Porque não faz sentido que num festival que só acontece uma vez por ano, que só tem uma oportunidade para mostrar trabalhos que ninguém viu, fazer uma retrospectiva de alguém que já tem alguma referência em Portugal. A nós interessa-nos procurar os novos autores, as novas promessas do cinema.
E a secção IndieJúnior?
O IndieJúnior nasceu na segunda edição, e todos os anos tem acrescentado qualquer coisa.
Pode-se dizer que é a secção que mais tem crescido dentro do festival. Ele aparece, mais uma vez pela identificação de uma lacuna, a inexistência de um evento de grande visibilidade dedicado ao cinema infanto-juvenil, em sala, e havendo pouca tradição no mercado de distribuição portuguesa da exibição de filmes de carácter independente com características adequadas ao público infantil. Achámos que o Indie teria de suprimir essa lacuna.
Estreiam por ano sensivelmente uma dezena de filmes para crianças, mas três quartos desse filmes são produções americanas, com regras narrativas e figurativas muito próximas umas das outras, onde os filmes se assemelham entre si. Exactamente para escapar a esta dieta um bocadinho monótona, é que o IndieJúnior quer mostrar outro tipo de cinema, dedicado às crianças, feito noutras partes do mundo.
Tem sido uma secção que, à imagem das outras, quer mostrar o que melhor se faz, neste caso especificamente para crianças e jovens, que não chega às salas portuguesas ou à televisão ou ao mercado de dvd.
Não há nenhum filme no IndieJúnior que não seja escolhido pelas mesmas razões que é escolhido um filme de outra secção: tem de haver alguém que não só goste muito dele como ache importante mostrar aquele filme a outras pessoas.
Não fará sentido um IndieJúnior permanente, visto existir essa lacuna junto do público mais jovem?
Temos debatido sobre isso. Na verdade, estamos a trabalhar com o Ministério da Educação no sentido de poder apresentar ao longo do ano, nos estabelecimentos de Ensino pelo país fora, programas IndieJúnior que sirvam também de ponto de partida para actividades de exploração dos temas e das formas do cinema Infantil que o festival já mostra. Vamos fazer uma espécie de, não é ainda uma disciplina de educação cinematográfica, mas é uma actividade na escola que pode ser feita em conjunto com os professores e que permite já promover a literacia visual, nomeadamente no campo das imagens em movimento. É essa a aposta deste ano que advém da nossa experiência de três anos a trabalhar nesta secção.
Temos tido um número crescente de espectadores, sobretudo ao nível das escolas, tanto por parte dos alunos como dos professores, com um feedback muito bom, muito positivo.
Esta ideia surgiu, assim, de forma a que outras escolas, noutros locais e noutra altura do ano, pudessem ter um contacto com filmes que são interessantes do nosso ponto de vista e que servem inclusive para promover a cultura cinematográfica e diversificar a experiência como espectadores de cinema.
Como é que o Indie vê o panorama do cinema português?
Por um lado, com muita esperança, muito optimismo porque, através de uma relação muito directa com os realizadores e produtores, queremos contribuir para que o cinema português tenha não só maior visibilidade nacional - e o público português é o que mais interessa cativar para o cinema português -, mas também visibilidade internacional. Portanto, a nossa relação é sempre de optimismo, de passar uma imagem positiva deste cinema. Por outro lado, também temos de ser críticos, não podemos ser apenas entusiastas e achar que tudo é bom.
Apostamos nos filmes em que acreditamos, e queremos sobretudo que esse cinema se fortaleça e seja visto por outras pessoas. Não queremos ser a montra do cinema português, queremos ser uma montra daquele cinema português que a nós nos interessa destacar, revelar e apontar.
Os filmes portugueses presentes no IndieLisboa não esgotam todo o cinema português interessante e importante, longe disso. Mas a nossa maior tarefa também é fazer escolhas.
IndieLisboa ou IndiePortugal?
Bem, o IndieLisboa chama-se assim porque os Festivais estão sempre associados a uma cidade, mas quando são eventos ambiciosos têm de ter essa dimensão nacional ou até internacional. Eu penso que o Indie já "conquistou" Lisboa, penso que já conseguimos trazer um público de fora e que a marca IndieLisboa já diz alguma coisa a espectadores de outras zonas do país, daí também o sucesso das extensões que temos organizado por outras localidades, com programas mais pequenos do que a versão do Festival em Lisboa. Mas sem dúvida que queremos que este seja um Festival de grande impacto em Portugal.
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