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O capitalismo selvagem do séc.XIX

"Capitalismo selvagem do Séc.XIX". Foi com estas palavras que o Reitor da Universidade Independente, Rui Verde, definiu as condições de trabalho a que a sua universidade e as outras submetiam os professores. Mas a falta de pagamento de salários aos docentes da Universidade Independente nunca foi motivo de preocupações para o Ministro da Ciência e do Ensino Superior, que concluiu na altura não existir "degradação pedagógica" nesta instituição. O Esquerda.net reproduz um  recente comunicado da Direcção do SNESup (Sindicato Nacional do Ensino Superior), que merece uma leitura atenta.

 

Comunicado do SNESup:

"Em 2006 surgiu o primeiro problema sério na Uni comunicado ao ministério. Não estavam a ser lançadas notas de alunos por professores que se sentiam lesados por falta de pagamento de salários. Foi ultrapassado e resolvido. Após este episódio a análise da inspecção-geral concluiu que não havia degradação pedagógica"

Mariano Gago, em 9-4-2007

Ao que se depreende, ao Ministério e à sua inspecção-geral só interessam a degradação pedagógica, e as actuações que atingem os alunos.

Essa forma de degradação que consiste em não pagar os salários aos professores, pelos vistos, não é indício de degradação global das condições da instituição, não interessa ao Ministério e aos seus inspectores.
 
Se os professores recorrem à "forma de luta" do não lançamento de notas, então sim, aqui del-rei, o problema é mesmo sério.

Para governo do Senhor Ministro, informamo-lo de que nos tempos "aúreos" da Uni,  o SNESup ouviu o Dr. Rui Verde admitir com louvável franqueza  que as condições laborais do pessoal docente eram as do "capitalismo selvagem do Século XIX",  acompanhou a situação de um colega que se encontrava a dar aulas na Uni sem ter sido contratado  directamente  pela entidade proprietária - um curioso caso de subcontratação - e, mais recentemente, num processo executivo no interesse de um seu associado, ficou ciente de que já não existiam bens que garantissem os créditos  reclamados.
 
Se isto não é degradação, então o que é degradação?

Também para governo do Senhor Ministro,  informamo-lo de que o SNESup tem sido  contactado nos últimos anos por docentes, nem sempre associados, de outras duas universidades privadas, a propósito de incumprimentos laborais e designadamente de atraso de pagamento de remunerações.  Numa delas o não lançamento de notas como forma de obter  a  satisfação de créditos laborais  tem largas  tradições  mas não será  caso totalmente desesperado, uma vez que ainda recentemente conseguimos fazer penhorar alguns activos.

Será que quem acabou por arranjar coragem para fechar  uma "universidade" não consegue fechar duas ou três?

O Ministério adormeceu há muitos anos em relação ao controlo das condições em que funcionam de facto as instituições privadas, designadamente as laborais.  Como de resto o está a fazer em relação  às públicas, e como pretende continuar a fazer, pelo que se vê da Proposta de Lei da Avaliação.

Só que adiar até que caia de podre não é solução.

Saudações académicas e sindicais
A Direcção do SNESup

12-4-2007

(...)

Neste dossier:

Dossier universidades privadas

O caso da Universidade Independente relança o debate sobre a natureza e o papel do ensino superior privado. O dossiê desta semana analisa a Ascensão e queda de um negócio muito nebuloso: o florescimento destas instituições esteve frequentemente minado pelas ilegalidades, crimes fiscais e eternas lutas de poder, revelando que são muitos os tentáculos do polvo. Quem fica a perder são também os alunos que, na maioria dos casos, pagam muito para pouca qualidade.

O mercado dita as regras

A Organização Mundial do Comércio, o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional têm ditado as regras das reformas educacionais, principalmente em África e na América Latina. E a tónica dominante tem sido o crescimento do ensino superior privado em detrimento do ensino público. Este é o entendimento dos principais organismos mundiais que sustentam esta globalização: nada pode escapar à esfera do mercado.
Este texto é uma adaptação do artigo de Sabine Righetti, disponível no site da "Com Ciência - revista electrónica de jornalismo científico" 

Governo escolhe o caminho da privatização

Depois de ter anunciado regras mais apertadas na avaliação do ensino superior, o governo aprovou recentemente o novo regime jurídico das instituições do ensino superior. Este diploma prevê a passagem das instituições públicas a fundações de direito privado. Cecília Honório, deputada do Bloco de Esquerda, alerta para as mudanças que se avizinham: "as fronteiras actuais entre ensino superior público e privado esfumar-se-ão. Neste sentido, o governo pode mesmo dar-se ao luxo de dar umas palmadas nas Privadas"

A Universidade Acabou

"A restruturação actual do ensino universitário é um monumental bluff e uma hábil operação de propaganda. Basta ver como todas as virtudes de Bolonha foram deitadas para o caixote do lixo, quer pela resistência das culturas burocráticas dos serviços administrativos, num extremo da escala, quer pela pressão mercadorizadora exercida pelos órgãos dirigentes e pelo orçamento de estado, no outro extremo".

O Estado não pode ser cúmplice

Boaventura Sousa Santos, destacado sociólogo português, tem estado na linha da frente no combate por uma globalização alternativa e contra a mercantilização da educação. Neste artigo fala-nos da forma como o ensino superior privado floresceu nos países periféricos ou semi-periféricos (nomeadamente Brasil, Portugal e Espanha) e explica qual deve ser o papel do Estado na regulação deste mercado "descontrolado" e na promoção de um ensino para todos.   

O capitalismo selvagem do séc.XIX

"Capitalismo selvagem do Séc.XIX". Foi com estas palavras que o Reitor da Universidade Independente, Rui Verde, definiu as condições de trabalho a que a sua universidade e as outras submetiam os professores. Mas a falta de pagamento de salários aos docentes da Universidade Independente nunca foi motivo de preocupações para o Ministro da Ciência e do Ensino Superior, que concluiu na altura não existir "degradação pedagógica" nesta instituição. O Esquerda.net reproduz um  recente comunicado da Direcção do SNESup (Sindicato Nacional do Ensino Superior), que merece uma leitura atenta.

As propinas dos alunos e a precariedade dos professores

Neste artigo é feita uma radiografia do ensino superior privado em Portugal. Neste momento são cerca de 90 mil os estudantes que frequentam este subsistema de ensino, o que significa um volume de fluxos financeiros em propinas na ordem dos 250 milhões de euros por ano. No conjunto das 116 instituições trabalham cerca de 10 mil docentes, a maioria dos quais não exerce a profissão docente como actividade principal, e onde se assiste a um aumento significativo do trabalho a recibos verdes.  

A qualidade nem sempre se paga

Ao contrário do que acontece nalguns países, em Portugal, e à excepção de alguns cursos de algumas universidades, o ensino superior privado nunca se distinguiu pela sua qualidade. O tira-teimas foi feito pelo Conselho Nacional de Avaliação do Ensino Superior (CNAVES) que identificou numerosas insuficiências concentradas sobretudo no ensino privado. Outro estudo deste organismo incidiu concretamente nos cursos de engenharia civil, e mais uma vez as universidades privadas aparecem no fundo da tabela da qualidade.  

Os muitos tentáculos do polvo

A história das universidades privadas em Portugal é uma densa teia de interesses, zangas, irregularidades, branqueamento de capitais e favorecimentos diversos. Como coelhos tirados da cartola, a criação de universidades foi quase sempre feita a partir de cisões e zangas, e existe um núcleo restrito de personalidades que foi passando de umas para as outras, sempre numa lógica de jogos de poder e influência. Houve mesmo várias instituições com dois reitores ao mesmo tempo a disputarem a liderança recorrendo a seguranças privados, ou não fosse este um negócio muito lucrativo. 

Ascensão e queda de um negócio muito nebuloso

Quinze anos depois do boom das universidades privadas, os alunos escasseiam e a qualidade também. A busca dos lucros fáceis conseguidos à custa dos estudantes que não conseguiam lugar nas universidades públicas foi acompanhada da promiscuidade com o poder político de cada ocasião. A inspecção denunciou tudo mas não puniu ninguém.