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Porta-voz do Departamento de Estado dos EUA renuncia, depois de criticar tortura do soldado Manning

PJ Crowley, porta-voz oficial do Departamento de Estado dos EUA, renunciou depois de ter dito publicamente: "O que o Departamento da Defesa está a fazer a Bradley Manning é ridículo, contraproducente e estúpido".

PJ Crowley, porta-voz oficial do Departamento de Estado, tombou vítima da própria espada, ao dizer que o tratamento dado a Bradley Manning, acusado [ainda sem qualquer prova] de ser a fonte que entregou a WikiLeaks os arquivos sigilosos de telegramas diplomáticos sigilosos, que continuam a ser divulgados, seria "contraproducente e estúpido".

A renúncia vem logo depois de Crowley ter feito aquelas observações, num seminário realizado no MIT, sobre o tratamento que Manning está a receber numa prisão militar dos EUA.

Crowley disse textualmente: "O que o Departamento da Defesa está a fazer a Bradley Manning é ridículo, contraproducente e estúpido".

A frase obrigou o presidente Obama a manifestar-se pela primeira vez sobre o modo como o soldado Manning está a ser tratado na prisão de Quantico, base da marinha, na Virginia. Obama defendeu a tortura de Manning. Disse que havia sido informado pelo Pentágono de que os procedimentos eram apropriados.

Na carta em que apresenta a sua renúncia ao posto, Crowley diz que assume total responsabilidade pelo que disse. Disse que considera a divulgação dos telegramas "crime grave, nos termos da lei dos EUA", mas não desmentiu críticas anteriores ao Pentágono.

Em palavras que podem ainda causar novas dificuldades para Obama, Crowley escreveu que os seus comentários "visavam lançar luz sobre o impacto muito maior, impacto talvez estratégico, de acções clandestinas empreendidas como rotina por agências de segurança nacional dos EUA, na imagem e na liderança global dos EUA. O exercício do poder nos tempos desafiadores que vivemos, e o trabalho dos média, têm de ser prudentes e consistentes com a lei e os valores norte-americanos."

Quando Obama chegou à Casa Branca, disse que um dos objectivos chaves do seu governo seria recuperar a imagem global dos EUA. Denunciou, então, o tratamento degradante que o governo Bush dava aos prisioneiros, como acção contrária aos interesses nacionais dos EUA.

Na carta-resposta oficial, Hilary Clinton disse que aceitara "com tristeza" a partida de Crowley. "PJ serviu a nossa nação com distinção durante mais de trinta anos, em uniforme e como civil" - disse ela.

A renúncia do principal porta-voz significa que a indignação contra a tortura do soldado Manning já alcançou os círculos superiores do governo Obama.

Manning está preso em confinamento ("solitária") há dez meses. Tem sido submetido a condições especiais, alegadamente para evitar que se suicide. Essas condições implicam permanecer 23 horas por dia na cela sob vigilância ininterrupta, e completamente despido à noite.

O regime de segurança máxima ao qual está submetido na prisão de Quantico já foi denunciado como forma de tortura por muitos, inclusive por Daniel Ellsberg, que deu aos média os "Pentagon Papers" sobre a guerra do Vietname [ver "A vergonhosa violência contra Bradley Manning", Daniel Ellberg, 12/3/2011, em redecastorphoto.blogspot.com]. A ONU também está a investigar.

Muitos analistas já chamaram a atenção para o critério ambíguo que se vê por trás da renúncia de Crowley. Glenn Greenwald, repórter da revista Salon, que luta na vanguarda da denúncia contra os maus tratos infligidos ao soldado Manning, disse, pelo Twitter, que "torturar prisioneiros pode-se; manifestar-se contra a tortura de prisioneiros, é proibido".

Na semana passada, o próprio Manning manifestou-se sobre como está a ser tratado. Disse que a tortura visa castigá-lo, mesmo antes de qualquer acusação ou julgamento legal. Disse que, todas as noites, lhe tiram todas as roupas, desde o dia em que fez um comentário sarcástico, ouvido por um dos guardas, sobre o absurdo do regime a que já estava condenado.

Manning foi acusado de vários crimes relacionados com a divulgação de milhares de telegramas diplomáticos sigilosos dos EUA, além de vídeos e imensos arquivos sobre o Afeganistão e o Iraque. Foi preso em Maio de 2010, numa base militar dos EUA próxima de Bagdade, onde servia como especialista dos serviços de informações.

Artigo do jornal britânico Guardian, publicado a 13 de Março de 2011

Traduzido pelo colectivo da Vila Vudu

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