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O telefonema de Sócrates

O “Guardian” noticiou que Sócrates tinha telefonado a Angela Merkel pedindo-lhe ajuda e dispondo-se a “tudo fazer”, posteriormente o gabinete do primeiro ministro negou, mas a notícia não pareceu estranha a ninguém e não é por acaso.

Na semana anterior às últimas eleições presidenciais, o jornal britânico “Guardian” noticiou que Sócrates tinha telefonado a Angela Merkel pedindo-lhe ajuda e dispondo-se a “tudo fazer”, para que não fosse necessário pedir resgate ao chamado fundo europeu de estabilização e ao FMI. O jornal referia que uma testemunha disse que “Sócrates parecia desesperado e desejoso de agradar”. Posteriormente, o gabinete do primeiro ministro negou ao jornal britânico que o telefonema tivesse sido feito.

O telefonema pode não ter existido, mas a notícia não pareceu estranha a ninguém e não é por acaso. Na verdade, a preocupação do Governo é aplicar as exigências do FMI, do directório da União Europeia e da finança, sob o pretexto de evitar o pedido de resgate. Ou seja, aplicar a política do FMI com ou sem a presença do FMI.

Sob a chantagem de taxas de juro altíssimas que visam a salvação dos bancos europeus e que a longo prazo são impossíveis de pagar, o Governo está de facto disposto a “tudo fazer”. Procura que a China e países árabes comprem dívida, mas também tenta vender-lhes importantes empresas públicas portuguesas. Mas, sobretudo, o Governo segue uma política de dura austeridade contra a maioria da população, de cortes sucessivos e cada vez maiores nos serviços públicos, na saúde, na educação, na cultura. As mais recentes notícias apontam, por exemplo, o abandono do ensino superior por milhares de estudantes universitários, devido aos drásticos cortes na atribuição de bolsas de estudo.

Numa entrevista à agência Lusa, o sociólogo Boaventura de Sousa Santos alertava que há um “retrocesso nas conquistas democráticas” que provocará uma profunda crise social, salientando mesmo que a crise social já existe só que “é um pouco surda, porque as pessoas ainda estão num estado de choque, não se deram conta de todas as consequências desta crise”.

É desse “estado de choque” que urge sair. Com ou sem a presença do FMI, o Governo vai prosseguir nos cortes, pretende agora facilitar os despedimentos e que os trabalhadores passem a financiar os seus próprios despedimentos, descontando dos seus salários para um fundo com esse objectivo. Se não reagirmos a esta ofensiva contra os nossos direitos sociais, enfrentaremos uma situação e medidas cada vez piores. A Comissão Europeia e o directório da União Europeia estão a pressionar os Estados para aplicar uma política de ataque ao chamado modelo social europeu, procuram que a maioria da população pague a crise para beneficiar os bancos e a finança.

É preciso que o povo português faça ouvir nas ruas o seu protesto contra esta política de austeridade. Só a multiplicação dos protestos contra este desastre social, em Portugal e na Europa, pode abrir caminho à mudança política necessária, contra a chantagem da dívida e em defesa dos serviços públicos.

Sobre o/a autor(a)

Editor do esquerda.net Ativista do Bloco de Esquerda.
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