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ELEIÇÕES PORTUGUESAS: ALGUÉM AS QUER GANHAR?

Uma cartilha sobre cada um dos principais partidos portugueses e o que os motiva para o período eleitoral, incluindo as expectativas específicas para as eleições europeias de 7 de Junho (2009)

 

REF 09LISBON289

DATA: 06/02/2009 (?) 10:10

CLASSIFICAÇÃO: CONFIDENCIAL/NOFORN

 

DE: Embaixada em Lisboa

PARA: RUEHC / Secretário de Estado em Washington DC 7645

INFO: RUEHZL / European Political Collective

 

CONFIDENCIAL Secção 1/3 de Lisboa 000289

 

NOFORN //apenas para ser visto por cidadãos americanos//

SIPDIS //para distribuição na rede SIPRNet//

 

E.O 12958 DECL: 21/04/2019

 

TAGS: PGOV PREL PO

 

ASSUNTO: ELEIÇÕES PORTUGUESAS: ALGUÉM AS QUER GANHAR?

 

REF: LISBOA 88

 

Classificado por: Conselheiro para questões políticas e económicas Troy Fitrell por motivos 1.4 (b, d)

 

1. (C/NF) Resumo. O que se segue é uma cartilha sobre cada um dos principais partidos portugueses e o que os motiva para o período eleitoral, incluindo as expectativas específicas para as eleições europeias de 7 de Junho. Portugal tem 3 eleições este ano; para além das eleições para o Parlamento Europeu a 7 de Junho, há eleições legislativas e municipais no Outono. O período eleitoral já está em curso, mas os principais partidos estão assolados por divergências internas. Nenhum está a fazer uma campanha convincente e a apatia dos eleitores é o maior problema, já que o Parlamento Europeu está muito distante do quotidiano dos portugueses. Ao que tudo indica, apenas um quarto dos eleitores inscritos tenciona votar a 7 de Junho, e irão votar em listas compostas por figuras partidárias que não aliciam ninguém. Por isso, as eleições europeias não servirão de teste crucial para as eleições nacionais, nem mesmo como indicador do estado de espírito no país. A extrema esquerda vai certamente ganhar alguns lugares no Parlamento Europeu, mas o primeiro-ministro socialista no poder, Sócrates, está mais preocupado em manter a maioria absoluta no parlamento português. Fim de resumo.

 

2. (C/NF) Como em muitas outras partes do mundo, os portugueses deixaram-se entusiasmar pelo drama eleitoral nos EUA em 2008. Um dos temas incessantemente repetido nos comentários foi a admiração pelo processo das primárias, em que os eleitores vão restringindo o campo de candidatos numa sucessão de plebiscitos abertos. Em Portugal, porém, o desejo de um processo de primárias degenerou numa guerrilha mortífera no interior dos partidos, de tal modo que nenhum parece ter uma estratégia adequada para vencer sob o sistema português de listas partidárias.

 

3. (C/NF) As eleições de 7 de Junho para o Parlamento Europeu assinalam as primeiras de três eleições em Portugal este ano. As eleições legislativas e locais são esperadas para o Outono, o mais tardar no final de Outubro, com as datas ainda por definir. Os analistas já estão opinar acerca do significado que as eleições europeias terão em termos das eleições nacionais — aliás, o discurso político está totalmente concentrado em assuntos mais apropriados para eleições nacionais, como o crime, o desemprego, e as infraestruturas. O quadro é complexo, porque as eleições nacionais deste ano serão as primeiras em que um terço dos lugares legislativos estão reservados para mulheres. A contribuir para os conflitos internos está também o facto de a delegação portuguesa no Parlamento Europeu diminuir de 24 para 22, na sequência de reformas institucionais, garantindo que pelo menos dois políticos portugueses são ter de deixar a boa vida de Bruxelas e Estrasburgo.

 

4. (C/NF) Mas as eleições europeias vão dizer-nos muito pouco acerca do estado de espírito nacional, porque se espera que a participação seja pouco significativa. A afluência às urnas nas eleições europeias é tradicionalmente muito baixa, e é pouco provável que se repita a participação de 38 por cento de 2004. Nenhum dos partidos está a fazer uma campanha de grande impacto: os outdoors são raros e com mensagens vagas, e regista-se pouco empenho das bases. O facto de a votação decorrer num fim-de-semana prolongado vai condicionar ainda mais a ida às urnas.

 

5. (U) Segue-se uma cartilha sobre cada um dos principais partidos portugueses e o que os motiva para o período eleitoral, para além de expectativas específicas para as eleições europeias de 7 de Junho.

 

PARTIDO SOCIALISTA (PS)

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6. (C/NF) Todos os sinais deviam ser positivos para os socialistas no poder, mas quem os ouvir falar não dá por isso. O primeiro-ministro Sócrates assumiu o controlo de um aparelho governamental disfuncional e de uma economia em mau estado quando o PS ganhou as legislativas em 2005. Sócrates esteve à frente de um orçamento de austeridade e de reformas internas substanciais, que de um modo geral permitiram controlar os problemas económicos de Portugal, cumprindo os padrões da UE com dois anos de antecedência. Sócrates disse-nos em privado que a vitória do PS lhe trouxe um capital político "que só é útil se for utilizado." Por isso, enfrentou a oposição dos sindicatos que formam a base tradicional do PS para implementar reformas laborais, aumentando a idade de reforma e cortando benefícios para lidar com aquilo a que chamou uma "bomba-relógio demográfica." Tendo enfrentado — e vencido — estas batalhas no princípio do mandato, Sócrates pode oferecer cortes fiscais e aumentos da função pública neste ano eleitoral.

 

7. (C/NF) Sócrates e os seus pragmatistas deslocaram o partido para o centro. E embora isso tenha enfraquecido os partidos da oposição no centro-direita e à direita, também acabou por fortalecer os partidos de esquerda mais pequenos e desiludiu a ala esquerda mais activa do próprio PS. Sócrates aposta em ganhar mais votos ao centro do que os que vai perder para a extrema esquerda. É possível que esteja errado a curto prazo, mas talvez seja uma

 

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manobra astuta a longo prazo, sobretudo se conseguir sobreviver às eleições nacionais deste Outono. Ao mesmo tempo que altera a posição do partido no espectro político, Sócrates está também de olhos postos nas alterações demográficas do país. O PS autopromoveu-se como o partido da Europa (e Sócrates foi o anfitrião do Tratado de Lisboa nos finais de 2007). Nas questões sociais, como o aborto, o divórcio e o casamento homossexual, a política do PS está em linha com a norma europeia, mas aliena os católicos portugueses, socialmente conservadores, que constituem um bloco eleitoral decisivo.

 

9. (C/NF) Embora o PS necessite de aumentar o número de mulheres nas listas das legislativas para cumprir o critério de um terço, os líderes mandaram embora três deputadas que são consideradas apoiantes de Alegre. Muita da cobertura mediática do partido reflecte a frustração da ala esquerda por o PS "já não ser socialista." Sócrates mantém-se optimista, mas vai ter mais dificuldade em governar se o seu partido perder a maioria absoluta no parlamento. Alegações de corrupção com respeito a Sócrates quando era ministro do Ambiente não deverão resultar em sanções formais, mas desgastam-lhe a imagem (Ref A).

 

PARTIDO SOCIAL DEMOCRATA (PSD)

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10. (C/NF) O partido de centro-direita PSD é o segundo maior partido português e o rival natural do PS, de centro-esquerda. Poder-se-ia pensar que as divisões internas no PS encorajariam o PSD a aproveitar a situação, fortalecendo a unidade interna. Mas não foi isso que aconteceu, já que o PSD vai no terceiro líder em dois anos, com a possibilidade de outra mudança de líder antes das eleições no Outono. A actual líder, Manuela Ferreira Leite, ganhou umas eleições internas muito disputadas, com três candidatos, no Verão passado. O seu ponto forte é que, como antiga ministra da Economia, está em condições de combater o PS naquele que é tradicionalmente o seu ponto mais fraco. Infelizmente, foi ministra da Economia durante o pior período económico dos últimos vinte anos, a seguir ao qual o PSD, então no poder, foi varrido do poder por uma grande maioria que votou no PS. Ferreira Leite negou ulteriormente ao seu maior rival, Pedro Passos Coelho, um lugar na liderança do partido, libertando-o para apresentar a suas próprias propostas ao público numa "viagem de auscultação" por todo o país. O Presidente Cavaco Silva é do PSD, mas evita as lutas internas do partido e procura obter equilíbrios dentro e entre os partidos.

 

11. (C/NF) Os deputados do PSD debatem tanto se o partido deve defender "mais cortes fiscais" ou "melhores cortes fiscais" que ninguém sabe — e muito menos eles próprios — qual é a posição do partido. O PSD é bem visto em questões de infraestruturas e é socialmente mais católico que o PS, o que o mantém na corrida, apesar das dúvidas relativas à competência da direcção. O PSD tem boas hipóteses de recuperar a Câmera de Lisboa, se o antigo primeiro-ministro Santana Lopes vencer o competente mas cáustico actual presidente, o socialista António Costa. O PSD não tem sido capaz de tirar proveito das alegações de corrupção contra Sócrates porque vários dos seus líderes enfrentam alegações semelhantes.

 

PARTIDO POPULAR (CDS-PP)

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12. (C/NF) O partido à direita do centro, o CDS-PP, passou pela mesmas trapalhadas na liderança até o antigo líder e ex-ministro da Defesa Paulo Portas regressar para tomar as rédeas do partido em Abril de 2007. Portas pode ser cáustico, mas também é altamente respeitado. Colocou o CDS-PP no centro da maioria dos debates políticos, preenchendo o vácuo criado tanto pelo PS como pelo PSD. As sondagens actuais colocam o CDS-PP abaixo do limiar de representação no parlamento nacional. Com o apoio popular a um nível tão baixo, não é provável que o CDS-PP obtenha um bom resultado nas eleições europeias, mas muitos acreditam que Portas vai conseguir reunir apoio para as eleições nacionais. Os apoiantes do CDS-PP são geralmente abastados e com níveis elevados de escolaridade, o que corresponde a um grupo demográfico pouco significativo em Portugal.

 

EXTREMA ESQUERDA: COMUNISTAS, BLOCO DE ESQUERDA E VERDES (PCP, BE E PEV)

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13. (C/N) O Partido Comunista Português (PCP) já foi uma das principais forças políticas, mas hoje é uma sombra do passado.

 

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Porém, o abandono da extrema esquerda por parte dos socialistas deu ao PCP um novo alento, e as sondagens atribuem-lhes resultados semelhantes aos de outrora, apesar da ausência de bons líderes. O Bloco de Esquerda (BE) contempla uma esquerda mais jovem. O BE fez uma oposição energética e combativa às propostas reformistas do PS.

 

14. (C/NF) Tanto o PCP como o BE esperam para ganhar mais apoio nas eleições legislativas, mas são demasiado pequenos para governar. Ambos almejam formar uma coligação com o PS, não admitindo que a liderança do PS está a afastar-se da extrema esquerda e preferiria um governo com uma maioria frágil a uma coligação com a extrema esquerda.

 

15. (C/NF) O "outro" partido de esquerda, os verdes (PEC), conta mais pela ligação com outros partidos ecologistas no mundo do que por ter uma plataforma substancial. A atenção global tem ajudado de alguma forma os resultados do PEC, mas o partido afastou recentemente uma deputada eloquente e respeitada da comissão nacional e vê-se agora sem qualquer representante público respeitado.

 

EXPECTATIVAS EM TORNO DAS ELEIÇÕES EUROPEIAS

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16. (U) A actual delegação de 24 deputados portugueses no Parlamento Europeu está assim distribuída:

 

PS: 12

PSD: 7

CDS-PP: 2

PCP: 2

BE: 1

 

17. (C/NF) O número um da lista do PS, Vital Moreira, deu nas vistas por trocar galhardetes em público com a ala esquerda do PS em comícios de campanha e depois propor um imposto a nível europeu sobre as transacções financeiras, que foi ridicularizado pela oposição e repudiado pelo primeiro-ministro Sócrates. O PS ficaria feliz se mantivesse 10 membros na nova delegação de 22 membros. Os líderes do PSD não inspiram confiança, mas o PSD deve manter os sete deputados às custas do CDS-PP (que concorreu coligado com o PSD da última vez). Os dois lugares do CDS-PP foram conquistados no pico da popularidade e capacidade de influência do partido, pelo que mantê-los será por si só um sucesso. O PCP e o BE têm uma base eleitoral mais pequena, mas com tendência a afluir às urnas em grande número em dias de eleições. O PCP espera conseguir quatro lugares e o BE três. Seria um extraordinário sucesso se conseguissem sete deputados entre eles, mas é praticamente certo que vão conseguir mais do que os três que têm agora.

 

COMENTÁRIO

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18. (C/NF) Mas será que alguém quer ganhar isto? O PS no poder devia passear calmamente pelas três eleições, dada a gestão desastrosa da economia pelo PSD da última vez que esteve no governo, mas quezílias internas, gaffes estúpidas e a crise da economia global deixaram a porta aberta a outros. As alegações de corrupção afectam praticamente todos os partidos, mas os eleitores portugueses não parecem atribuir-lhes grande importância. As sondagens indicam que a maioria pensa que os políticos são corruptos, por isso alegações específicas — como as que enfrenta o PM Sócrates — não são um impedimento. Em plena pré-campanha para as eleições europeias de 7 de Junho, as campanhas descambaram já todas em ataques negativos contra indivíduos específicos, muitos dos quais — como Sócrates e Portas — nem sequer são candidatos, o que é uma estratégia dúbia num processo eleitoral com base em listas partidárias.

 

Para mais notícias da Embaixada de Lisboa e informação acerca de Portugal é favor consultar o nosso site Intelink:

 

http://www.intelink.sgov.gov.wiki.portal:port ugal

 

STEPHENSON

 

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