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Efeitos de Chernobyl podem durar séculos

Quase 25 anos depois do pior acidente nuclear da história, novas descobertas científicas sugerem que os efeitos da explosão em Chernobyl foram subestimadas. Por Pavol Stracansky, da IPS.
As novas pesquisas confirmam que os problemas são maiores do que disseram em 2006 a Organização Mundial da Saúde e a Agência Internacional de Energia Atómica. Foto Stuck in Customs/Flickr

  
Especialistas publicaram, no mês passado, uma série de estudos indicando que, contrariando conclusões anteriores, as populações de animais diminuíram na área de exclusão em torno do lugar onde funcionava a antiga central nuclear soviética, e que os efeitos da contaminação radioactiva depois da explosão foram “assombrosos”. Cada vez mais javalis com altos níveis de césio são encontrados no lugar.

Esta informação foi divulgada meses depois que médicos na Ucrânia e Bielorrússia detectaram aumento nas taxas de cancro, mutações e doenças do sangue, que pensam estar relacionado com Chernobyl. Por outro lado, uma pesquisa norte-americana publicada em abril constatou aumento nos defeitos de nascença, aparentemente devido à exposição continuada a doses de radiação de baixo nível.

Para activistas contrários à energia atómica, esses estudos demonstram que os moradores da região afectada sofrerão consequências devastadoras, talvez por séculos. “Este é um problema que não acabará em poucos anos. Estará ali por centenas de anos”, disse à IPS Rianne Teule, da organização Greenpeace. “As novas pesquisas confirmam que os problemas são maiores do que disseram em 2006 a Organização Mundial da Saúde (OMS) e a Agência Internacional de Energia Atómica (AIEA), e continuarão existindo e aparecendo em outros estudos. Não é algo que acaba logo”, acrescentou.

A catástrofe aconteceu em abril de 1986 quando explodiu um dos blocos da central localizada na actual Ucrânia. Estima-se que a radioactividade total de Chernobyl foi 200 vezes maior do que as liberações combinadas das bombas nucleares lançadas pelos Estados Unidos em 1945 sobre as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki. A explosão e os incêndios geraram uma gigantesca nuvem radioactiva que se espalhou por toda a Europa, obrigando à evacuação de 350 mil pessoas de áreas próximas à usina.

Anos depois, a Organização das Nações Unidas (ONU), OMS, AIEA e outros organismos uniram-se aos governos de Rússia, Bielorrússia e Ucrânia para criar o chamado Fórum Chernobyl, a fim de realizar um grande estudo sobre os efeitos do desastre e divulgar suas conclusões em 2006. A pesquisa concluiu que houve apenas 56 mortes directas (47 socorristas e nove crianças com cancro da tiróide), e estimadas quatro mil mortes indirectas.

Entretanto, o relatório foi duramente criticado por outros grupos, para os quais foi enormemente subestimado o número de mortes e o potencial do acidente. Alguns questionaram a postura da AIEA, que apoiou por décadas o uso de energia nuclear com fins pacíficos. Estudos alternativos contradiziam algumas das conclusões do Fórum Chernobyl e alertavam que os efeitos na saúde seriam muito mais devastadores.

O relatório Torch, publicado em 2006 pelos cientistas britânicos Ian Fairlie e David Summer, menciona a incerteza sobre os efeitos na saúde pelas exposições a baixas doses de radiação ou a radiação interna por ingestão de alimentos contaminados. Também indicaram que foi subestimada, pelo menos em 30%, a quantidade de partículas radioactivas liberadas pela explosão no meio ambiente.

Números oficiais dos países afectados também contradizem as conclusões do Fórum Chernobyl. A Agência Internacional para a Pesquisa sobre o Cancro, da ONU, concluiu que o número mais provável de mortes relacionadas com o desastre seria de 16 mil, enquanto a Academia Russa de Ciências calculou que até agora ocorreram 140 mil mortes na Ucrânia e na Bielorrússia e 60 mil na Rússia. A ucraniana Comissão Nacional de Radiação elevou esse número para 500 mil.

Médicos ucranianos e bielorrussos informaram à imprensa da Ucrânia, no começo deste ano, que houve crescimento nos casos de cancro, na mortalidade infantil e em relação a outros problemas de saúde que, estão convencidos, são efeitos do desastre. “Os números apresentados pela ONU e AIEA não coincidem com os que outras agências das Nações Unidas prognosticam em termos de mortes por cancro”, disse Oksana Kostikova, do Hospital para o Cancro Infantil, de Minsk. Por outro lado, as 16 mil mortes apontadas pela Agência Internacional para a Pesquisa sobre o Cancro é uma “avaliação mais correcta do que a que vemos diariamente”, acrescentou.

O médico norte-americano Wladimir Wertelecki publicou em abril os resultados de uma ampla pesquisa sobre os efeitos em nascimentos na Ucrânia, revelando maiores níveis de anomalias em certas regiões do país. Segundo o especialista, este fenómeno estaria relacionado com a exposição continuada a baixas doses de radiação. Wladimir afirmou que as descobertas do Fórum Chernobyl deveriam ser revistas para que sejam conhecidos os reais efeitos do acidente atómico. “A posição oficial é que Chernobyl e os defeitos de nascença não estão relacionados. Essa posição deve ser reconsiderada”, afirmou.
 


Artigo Envolverde/IPS

Termos relacionados Energia nuclear, Ambiente
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