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A luta não vai tirar férias
Com o novo decreto-lei sobre os apoios sociais, o Governo pretende poupar 200 milhões de euros com os mais pobres. Como? Mudando as regras de cálculo do rendimento dos agregados, a forma de se definir a capitação, alterando as fórmulas das prestações, tomando como referência o Indexante dos Apoios Sociais (419 euros) em lugar do salário mínimo (475 euros), contabilizando os rendimentos ilíquidos, entre muitas outras coisas. Para isso, tem o apoio do PSD, que já assegurou que não quer revogar esse decreto. O famoso decreto 70/2010 vai ter um impacto profundíssimo também na acção social escolar. Reunidos esta semana com associações de estudantes e com responsáveis pelos serviços de acção social, confirmámos o que já sabíamos: cerca de 20 mil bolseiros do ensino superior podem perder a bolsa; metade dos bolseiros, ou seja, cerca de 40 mil, serão afectados – por exemplo, baixando de escalão e recebendo bolsas mais baixas. As famílias mais penalizadas serão as dos trabalhadores dependentes, que não podem deixar de declarar o que ganham. E serão os bolseiros que recebem cerca de 100 euros por mês, valor que só lhes permite pagar as propinas, a pagar a factura. Nas palavras dos responsáveis da Acção Social, os efeitos serão “devastadores”, em particular num país em que as propinas aumentaram, numa década, cerca de 400%.
Perante isto, estudantes e serviços de acção social estão em suspenso à espera que saia um novo regulamento que possa mitigar alguns destes efeitos. As candidaturas às bolsas começaram em Maio, mas ninguém sabe ainda quais serão as regras a partir das quais os pedidos entregues serão analisados. Se no ano passado o prazo médio de resposta aos pedidos de bolsa foi de 4 meses (4 meses em que o estudante tem de inventar como viver sem dinheiro, havendo muitos casos em que chegou a meio ano a demora das respostas), este ano esse atraso vai ser muito maior, porque sem regulamento as instituições não podem sequer começar a analisar os processos. Além disso, é provável que, com o agudizar da crise social, haja mais estudantes a precisar de bolsa. É impossível querer ter mais qualificação sem cuidar das condições mínimas de quem quer estudar.
Quando todos esperavam uma palavra e um compromisso do Ministro do Ensino Superior, Mariano Gago foi ontem ao Parlamento anunciar que provavelmente a meio de Agosto (e veremos se será a meio de Agosto…) o regulamento estará feito. Desde Fevereiro que o Ministro anuncia um novo regulamento de todas as vezes que vai à Assembleia da República. Ontem, anunciou basicamente que os estudantes não podem contar com bolsas antes de Janeiro, porque esse é o resultado de tal demora. Mas mais grave, manteve um silêncio de chumbo sobre o conteúdo desse regulamento. Não ficamos a saber quantos alunos serão excluídos da acção social escolar. Não sabemos qual a parte dos 200 milhões de euros que o Governo quer poupar com o apoio aos mais pobres que vai caber à acção social. Não sabemos quantas estudantes vão ver a sua bolsa descer de valor. Não foi assumido nenhum compromisso concreto. O silêncio e a ocultação foram a única resposta. O prolongamento da incerteza e da angústia de milhares de estudantes o único efeito desse silêncio.
Já é hábito as decisões mais importantes que afectam estudantes e professores do ensino superior serem tomadas em Agosto. O Ministro sabe que em Agosto as escolas estão de férias e a Assembleia da República não reúne. Mas nem por isso deixará de contar com a nossa acção. Para a semana, será entregue no Parlamento uma petição pela igualdade no Ensino Superior com milhares de assinaturas. E a agitação que se sente terá de certeza os seus efeitos. Nesta matéria, como em outras, a voz da justiça vai ter de valer mais que a obsessão da injustiça do Bloco Central. Que se desengane o Ministro: por nós, a luta não vai tirar férias.
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