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Partidas e contrapartidas

Os negócios envolvendo contrapartidas estão hoje na ordem do dia. Todos ouvimos falar na compra de submarinos e material militar, através de concursos públicos onde um dos factores de adjudicação era relacionado com as contrapartidas prometidas pelas empresas concorrentes.

Este modelo, apesar do que as notícias indiciam, não foi realizado apenas para a compra de material militar. No ano 2000, no concurso público para adjudicação de licenças 3G para operadores de telecomunicações, um dos critérios que foi usado era, exactamente, as contrapartidas que as operadoras se comprometiam a executar. Aliás, este critério foi tão importante que tinha um peso de 50% na decisão final.

O resultado do concurso público para emissão das licenças 3G resultou num compromisso, por parte das operadoras, que, segundo contas governamentais, ultrapassaria os 1.300 milhões de euros. Era quase metade, portanto, do que as contrapartidas que são, hoje em dia, indicadas no negócio de compra dos submarinos e outro material militar.

A comissão de inquérito que avalia a acção do Governo relativamente à Fundação para as Comunicações Móveis tinha, como um dos objectivos, avaliar a execução das contrapartidas. E, devido à importância que os 1.300 milhões de euros têm, esse foi um dos caminhos que o Bloco de Esquerda considerou essencial percorrer.

Uma das conclusões a que a comissão de inquérito já chegou é que em 2006, seis anos depois do concurso, muito pouco havia sido executado das contrapartidas. Por outro lado, em 2009 já aparece a indicação de que as obrigações estavam já praticamente cumpridas por parte das operadoras. Esta alteração drástica da execução das contrapartidas deu ainda mais força à intenção do Bloco de Esquerda de clarificar a execução das contrapartidas. Contudo, a essa vontade do Bloco de Esquerda, cedo se ergueu uma parede intransponível por parte de PS e PSD para que não se enveredasse por esse caminho. Essa foi a partido que o bloco central pregou a todos quantos esperavam uma clarificação desta vertente do processo.

A transparência e a clareza dos concursos públicos são um dos pilares de um estado de direito. O PS e PSD, com a sua união para que não fosse avaliado o processo relativo às contrapartidas das licenças 3G, lesaram esse princípio. No entanto, perdida esta batalha, a luta pela clarificação dos concursos públicos, particularmente aqueles que envolvem a execução de contrapartidas, tem ganho novos aliados com os escândalos que têm vindo a público. Outros concursos públicos, nomeadamente os relativos à compra de material militar, não poderão deixar de ser avaliados.

A realidade impôs-se ao bloco central e, cada vez mais, se torna inevitável a criação da comissão de inquérito que o BE propôs para avaliar as contrapartidas dos negócios militares. Uma das conclusões que parece estar desenhada à partida é transversal ao tipo de concurso público em questão: a realização de concursos públicos que tenham a execução de contrapartidas como um dos critérios é um processo que facilmente fica refém dos interesses do mercado e desvirtuado do seu objectivo.

Sobre o/a autor(a)

Deputado, líder parlamentar do Bloco de Esquerda, matemático.
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