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Educação: As promessas por cumprir

Apesar dos percalços, sossegue-se o Partido Socialista - a máquina governamental de propaganda está bem e recomenda-se. Com a abertura do novo ano escolar - na Educação - fez prova de vida: desde meados de Agosto que cada medida foi anunciada, encenada, inaugurada pelo menos 4 vezes; nas últimas semanas Primeiro-ministro, Ministro e secretários de Estado de todos os tamanhos têm sido chamados à grande campanha de salvação da Ministra da Educação.

O Governo protege os seus - nenhum esforço ou cerimónia é poupado para salvar e tentar repara a falta de credibilidade da equipa ministerial da 5 de Outubro.

E é certo - a propaganda pode muito, mas não pode tudo.

Não serve para esconder as fragilidades e recuos do Governo em matéria de educação. E acima de tudo, não isenta - não nos isenta a todos - de um debate sério, de uma avaliação atenta à realidade, tantas vezes preocupante, em tantas áreas do sistema educativo.

Até porque este ano há riscos acrescidos.

É por isso chocante que, depois de meses de alerta por parte de especialistas, pais e professores ligados à questão da educação especial, e que têm vindo a mostrar como a nova legislação lançada pelo governo vai deixar milhares de alunos com necessidades educativas especiais sem qualquer tipo de apoio, não tenha havido um único momento no recente Festim Governamental para acautelar que tal acontecerá.

São estes os alunos mais vulneráveis do sistema educativo, é exactamente perante estes alunos que o país, que a escola pública não tem o direito de falhar. Apesar disso a preocupação do Ministério e do Governo do PS é nula. Chegam de todo lado, aqui mesmo a esta Assembleia, relatos de pais assustados, com filhos em escolas de educação especial que não abriram portas este ano porque há Direcções Regionais de Educação que têm falhado consecutivamente os seus compromissos. E ninguém sabe bem o que vai acontecer, ninguém sabe bem o que vai acontecer as estas crianças...

É chocante e hipócrita que o Governo - o Sr. Primeiro-Ministro - se desloque às escolas para entregar prémios de mérito de 500 euros aos melhores alunos. A crítica não sequer para a encenação em estilo Estado Novo, mas antes porque esses 500 euros não vão chegar para pagar em muitos casos sequer metade das propinas do seu 1º ano de estudos superiores. Na prática, o Sr. Primeiro-ministro foi às escolas cobrar aos melhores alunos que queiram continuar os seus estudos no sistema público do ensino superior os 500 euros que faltam do pagamento da propina.

É chocante a forma como governo propagandeou as alterações no âmbito da ASE. Note-se: ninguém nega a importância do alargamento da base de incidência. Mas façamos as contas.

O governo negociou com as editoras escolares aumentos nos manuais escolares acima da inflação - inflação mais 3% no 1º ciclo; inflação mais 1,5% no 2º e 3º ciclo.

Façamos de facto as contas. Veja-se o que acontece no 6º ano de escolaridade, crianças com 11 ou 12 anos -  o governo aumentou em 1 euro (1 euro!!) a comparticipação nos livros para o escalão A, passando de 94 para 95 euros, e 0,5 euros (50 cêntimos) para o escalão B. Em média, os livros para este ano de escolaridade custam 200 euros. Ou 400 euros para alguns anos do 3º ciclo. Os pais, as famílias interrogam-se: festeja-se o quê, exactamente...?

É chocante a burocracia criada em torno do novo passe escolar - as transportadoras pedem os papéis das escolas, as escolas pedem as confirmações das Direcções Regionais - nada acontece, mas o Governo lava as mãos. Está contente com os cartazes publicitários que espalhou pelas cidades, e isso chega-lhe.

Como é chocante ver o anúncio de requalificação de escolas secundárias (até 2015, isto é, pelos próximos dois governos...), quando sabemos que o encerramento de escolas promovido pelo ME faz com que milhares de crianças iniciem por estes dias as suas aulas - muitas o primeiro dia des escola das suas vidas - em contentores instalados em recreios. Por estes contentores, a festa socialista da educação não passou.

E as promessas por cumprir, cada vez mais distantes. Depois de um consenso político alargado sobre a necessidade de estender a escolaridade obrigatória até 12º ano, o Ministério apressa-se a dizer que sim, mas que também. Que quer que todos cheguem e façam o 12º ano, sonha com isso, gostava muito - mas alargar a escolaridade obrigatéria até lá... agora não, talvez mais tarde.

E os debates e reformas que ficam por fazer - e que fazem falta. São urgentes na requalificação do sistema educativo - o debate sobre a estrutura e os conteúdos curriculares que tirem a escola da esquizofrenia da multiplicação de disciplinas; a necessidade de criar equipas multidisciplinares de combate ao abandono e insucesso escolar - programas de tutoria que o ME recusa, ano após ano.

E quem vai às escolas por onde não passou a caravana governamental não vê festa. Pelo contrário.

Vê o clima de desmotivação dos professores, a multiplicação burocrática sem que finalidade útil. Vê o que aconteceu com a avaliação experimental dos professores contratados no ano passado - muitos nem conhecem a sua avaliação e voltaram a ser contratados, outros estiveram em escolas que deram classificação idêntica a todos, mas não voltaram a ser contratados... Uma farsa - a farsa deste modelo de avaliação de desempenho - que o ME se prepara para relançar de novo este ano, sem tirar qualquer lição do processo e das críticas ouvidas durante o ano passado. Vê os professores com 7, 8, 9 turmas, cerca de metade com mais de 100 alunos; a preparar aulas nos átrios das escolas, e pergunta onde está a festa, que aqui parece que ninguém foi convidado...

É tempo de parar a propaganda e assumir responsabilidades. A um ano de final de legislatura, as promessas do Partido Socialista para a escola pública perderam toda a credibilidade. Foram, vão sendo, sucessivamente sacrificadas para manter em funções a Ministra da Educação. Mas esqueceram pais, alunos e professores. Se não há alteração dramática neste rumo, por esta altura no próximo ano pais, alunos e professores farão a sua festa- mas aí já não convidam o Partido Socialista.

Sobre o/a autor(a)

Investigadora do CES
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