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Da Indignidade do Estado

Neste processo só há uma saída de Direito: reabilitação do Capitão Artur Garcia Gomes, reconhecimento do seu contributo para a liberdade e reintegração na Força Aérea, sua única exigência, aliás.

O Capitão Piloto Aviador Artur Garcia Gomes (Cap. A.G.) desertou em 1972 por “se recusar escrever discursos fascistas e cooptar jovens para o regime” fascista. Na Venezuela integrou activamente o Movimento Democrático de Libertação de Portugal e Colónias. Com o 25 de Abril o Estado Português não rejubilou com o regresso à Pátria de quem a ajudou a reabilitar perante o mundo; ao invés, sustentou uma condenação de 10 a 14 anos de prisão e destitui-o da FA por actos praticados em luta pela liberdade.

Perante o espanto do Cap.A.G. o Estado português não só foi incapaz de dar como nulas as conclusões dum processo iníquo e fascista como o adulterou e falsificou..

O Cap.A.G. não pôde vir a Portugal para tentar resolver a situação. Ameaçado de prisão nem um salvo conduto – o fascismo concedeu-o a Humberto Delgado e Henrique Galvão – lhe concederam. Falamos do pós-25 de Abril.

Só depois de uma amnistia (1986) regressou a Portugal onde tenta sem sucesso que lhe façam justiça. O seu processo foi corrompido e falsificado, os documentos que enviou foram ignorados ou desapareceram, não obteve resposta aos vários requerimentos.

Foram-lhe propostas, à má fé, saídas sem saída, como a lei de reconstituição das carreiras só aplicável a situações depois do 25 de Abril e, esperando por nova lei que a inviabilizaria, a atribuição de uma pensão por «Méritos Excepcionais» que, portanto, não pôde ser concedida.

O Estado tentou abrir mais dois processos para “resolver” a situação, mas não fez a única coisa a que estava obrigado: rever, eliminando as adulterações dolosas do processo 1.00.63. da FAP. A FAP novembrista núcleo duro do patriotismo colonialista (lá de cima o napalm parece fogo de artifício) não foi responsabilizada pelos estranhos acontecimentos. Neste processo só há uma saída de Direito: reabilitação do Cap.A.G., reconhecimento do seu contributo para a liberdade e reintegração na Força Aérea, sua única exigência, aliás.

Depois de três duríssimas greves de fome, de finalmente haver legislação ad hoc tornada sem efeito pela fuga de Barroso para Bruxelas, de lhe ter sido garantida a aplicação da «lei antiga» - não tão antiga quanto a violação da Constituição pelo Estado – o Cap.A.G. recebeu o ofício 1757 de 16-04-2010 do Ministério da Defesa Nacional. Cale-se então tudo o que a antiga musa canta: comunica-se ao Capitão Artur Garcia Gomes, que tem direito ao maior reconhecimento mas que, como estamos num Estado de Direito, não pode ter direito àquilo a que tem direito! Complicado?

A lei é geral e abstracta, não se podendo aplicar a um só indivíduo. E como poderá haver casos semelhantes, nada feito. Assim uma injustiça – um crime contra os direitos fundamentais garantidos pela Constituição – não é corrigida porque pode obrigar à correcção de outras injustiças! Eis até onde pode chegar a pusilanimidade ou a indignidade do Estado democrático.

De qualquer modo o capitão piloto aviadorArtur Gomes “já tem direito à sua pensão por nove anos e meio de serviço mais as percentagens de aumento do tempo de serviço quando completar 70 anos!”

Publicado em 2 de Julho de 2010 no semanário “SOL”

Sobre o/a autor(a)

Coronel na reforma. Militar de Abril. Escreve com a grafia anterior ao acordo ortográfico de 1990
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