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Necessidade de esclarecimento dos principais negócios militares
Não apenas pela necessidade de transparência e de escrutínio sobre a forma como o Estado terá acautelado, ou não, os interesses e recursos públicos, mas também devido ao inusitadamente elevado impacto orçamental desta aquisição nas contas públicas.
Há aqui duas matérias que vale a pena discutir separadamente. A primeira é a justificação política e a racionalidade económica para a compra dos submarinos. A segunda é a forma como o Estado português tem gerido o absurdo incumprimento do programa de contrapartidas para a aquisição de equipamento militar.
Comecemos pelos submarinos, a aquisição mais cara de sempre do Estado português. 1.070 milhões de euros. 1.070 milhões de euros que nunca foram conveniente explicados. O mesmo dinheiro que custaria a construção de 3 dos mais modernos hospitais distritais ou a requalificação de quase cem escolas secundárias.
Como não há nenhuma racionalidade estratégica ou de coordenação internacional com as outras forças militares europeias, os defensores desta aquisição vão andando à bolina das justificações do semestre, as quais não convencem nada nem ninguém, a começar pela própria NATO que afirma que a aquisição dos submarinos é "um desperdício".
O caso é tanto mais estranho quando, exceptuando alguns altos responsáveis da Marinha, ninguém parece defender este dispendioso programa. A começar no caricato episódio em que o ex-primeiro-ministro que assinou a compra mais cara de sempre da nossa história garantir que nunca "tomou conhecimento directo ou indirecto" do negócio, à estranhíssima forma como a famigerada ESCOM aparece envolvida ou como, a cada revisão contratual, as condições foram sendo mais gravosas para o Estado, até ao notório incumprimento das contrapartidas. Em suma, tudo, mas mesmo tudo, neste negócio está ainda por explicar.
Mas sendo certo que o primeiro-ministro tem razão quando aqui referiu, em resposta ao Bloco de Esquerda, que são "inaceitavelmente baixos os níveis de cumprimento das contrapartidas" dos submarinos, não é aceitável que o Governo tente fazer deste caso a excepção negocial.
Dos contratos actualmente em vigor, no valor de 2.956 milhões de Euros, as taxas de execução são inferiores a 30%. Apenas 800 milhões, dos quase 3.000 milhões de euros contratualizados, estão a ser cumpridos.
Em alguns casos, os programas de contrapartidas estão quase inteiramente por realizar. No contrato para a aquisição de torpedos o cumprimento do respectivo programa de contrapartidas é de zero por cento. No caso do Avião C295, a taxa de execução era de 1,1%.
O incumprimento das contrapartidas pode significar actualmente uma quebra contratual de 2,2 mil milhões de euros por parte das empresas fornecedoras de tecnologia e equipamento militar, um valor superior a 1,5% do Produto Interno Bruto e superior ao que o Governo espera receber com a inaceitável privatização dos CTT - esse sim um serviço público de valor indiscutível.
Mas não é só o absurdo nível de incumprimento dos contratos de contrapartidas, sem paralelo na administração pública, que está em causa. Qualquer modelo negocial, como é o caso, em que o valor que é pago pelo que se compra não é o valor do material em causa, mas um preço inflacionado por hipotéticas contrapartidas para empresas nacionais escolhidas sabe-se lá como, contrapartidas que depois se não cumprem, ou que não há sequer a intenção de cumprir, tudo isso é meio caminho andado para tornar impossível o seu escrutínio público e fiscalização.
A confusão contratual, fraude, corrupção e desperdício dos recursos públicos com negócios que não acautelam os interesses do Estado são a consequência normal deste peregrino tipo de contrato.
É por isso que, no entender do Bloco de Esquerda, o Parlamento deve aprovar quanto antes a constituição de uma comissão de inquérito que tenha como objecto o conjunto dos contratos das contrapartidas militares.
Registando o aparente progresso que alguns porta-vozes do PS têm vindo a fazer em relação à proposta de um inquérito, gostaríamos de salientar que não nos parece, pelas razões expostas, que este se possa limitar ao contrato dos submarinos, por muito importante que ele seja. O que a opinião pública exige é um inquérito ao negócio global das contrapartidas. Sem manobras dilatórias. Urgentemente.
Fernando Rosas, declaração política na Assembleia da República, em 7 de Abril de 2010
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