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Violência doméstica: só 2% das denúncias dão condenação

Há muito crime e pouco castigo nos casos de violência domésticaDesde o ano 2000, quando a violência doméstica passou a ser crime público, o número de denúncias aumentou todos os anos, atingindo o valor total de 109.786 ao fim de seis anos. Mas os números publicados na edição deste Domingo do jornal Público mostram que apenas cerca de 2% das denúncias dão de facto origem a uma condenação. A nova lei do governo recentemente discutida no parlamento merece duras críticas do Bloco de Esquerda, dado que "constitui um retrocesso" e não vem responder à esta urgência social.  

O número de denúncias de violência doméstica registadas na PSP e na GNR vem crescendo ano após ano desde que foi considerada um crime público: 11.162 ocorrências em 2000, 12.697 em 2001, 14.071 em 2002, 17.527 em 2003, 15.541 em 2004, 18.193 em 2005, 20.595 em 2006 e 21.907 em 2007.

No entanto, destas quase 110 mil denúncias, apenas 3.324 subiram à barra dos tribunais, dando origem a 2252 condenações, cerca de 2% do total das denúncias. E destas condenações apenas uma pequena parte dá origem a prisões efectivas. Tomando como exemplo o ano de 2006, registaram-se 20.595 denúncias, foram constituídos 1033 arguidos, condenados 495, dos quais apenas 35 foram presos. Tendo em conta que a maior parte dos crimes de violência doméstica nem sequer chega à fase da denúncia, torna-se ainda mais patente o cenário de impunidade que caracteriza esta situação social. 

O número tão baixo de condenações "choca" o psicólogo criminal Carlos Poiares, ouvido pelo Público. "O velho ditado português 'em briga de marido e mulher não se mete a colher' continua a ter aplicação", lamenta. Na opinião do professor da Universidade Lusófona, "os dispositivos de controlo social têm de ser mais eficazes". Por seu turno, Joana Marques Vidal defende a criação, como em Espanha, de equipas multidisciplinares, médico legista e psicólogo incluídos, que actuam imediatamente.

Esta semana, numa audição parlamentar promovida pelo Bloco de Esquerda, Elisabete Brasil, da União de Mulheres Alternativa e Resposta, defendeu a existência de um tribunal específico para tratar de casos de violência doméstica.

Nesta audição, foram ouvidas as propostas de diversas associações, muitas das quais vão ao encontro do que o Bloco de Esquerda tem defendido, ao nível da necessidade de se ter em conta a especificidade da violência de género.

A deputada do Bloco, Helena Pinto, referiu que a proposta do Governo "está no limiar de um retrocesso no combate à violência doméstica", considerando que, nesse diploma "a violência de género é subestimada", transfere-se "a responsabilidade para a vítima" e "põe-se em causa" o caminho arduamente percorrido até ao reconhecimento da natureza pública do crime de violência doméstica.

Nesta legislatura o Bloco apresentou diversas propostas sobre este assunto. A mais recente um novo Projecto-Lei que altera o Código Penal, numa questão fundamental: o conceito de crime continuado não pode aplicar-se aos crimes cometidos contra as pessoas. Ou seja, cada agressão protagonizada à mesma mulher pelo mesmo agressor deve constituir um crime individualmente e não ser diluída num único crime continuado, com uma pena total menor.

A proposta de criação de Juízos de Competência Especializada na área da violência doméstica e o reforço da protecção das vítimas são outras das propostas do Bloco de Esquerda

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