You are here

Marisa Matias: "As vozes de Copenhaga têm de ser ouvidas"

O debate juntou Marisa Matias, o meteorologista Costa Alves e dirigentes da Quercus, LPN e Geota. Foto André BejaNo arranque da cimeira de Copenhaga, o Bloco convidou associações ambientalistas para o debate sobre as alternativas necessárias para enfrentar as alterações climáticas.

 

O debate contou com a presença da eurodeputada Marisa Matias, de Francisco Ferreira, da Quercus - que interveio a partir de Copenhaga, onde assiste aos trabalhos da cimeira -, do meteorologista Costa Alves e dos representantes da Liga para a Protecção da Natureza, Carlos Teixeira e da GEOTA, Manuel Ferreira dos Santos.

Marisa Matias começou por prestar contas do trabalho desenvolvido na Comissão de Ambiente do Parlamento Europeu, de onde saiu uma das propostas mais avançadas no debate sobre a redução de emissões de gases que contribuem para o efeito de estufa. A eurodeputada bloquista explicou que após as negociações, emendas e compromissos sobre essa proposta, foi uma versão bastante alterada que chegou ao plenário. "A resolução final ficou bastante aquém nas metas de redução de emissões e não representa um grande avanço face a protocolo de Quioto", disse Marisa Matias para justificar a abstenção do Bloco na votação final. Ainda assim, sublinhou que se trata de uma das mais ambiciosas propostas na mesa das negociações em Copenhaga.

Marisa Matias destacou ainda a necessidade de um processo democrático e participado em Copenhaga, para que o acordo não seja uma imposição dos países ricos aos restantes que sofrem mais com as alterações do clima que pouco ou nada fizeram para provocar. E apelou a que o acordo seja juridicamente vinculativo e não apenas político, nomeadamente no que respeita às metas de emissões e ao financiamento dos programas de apoio aos países em desenvolvimento. "Quando vemos as somas que se mobilizaram para salvar os bancos privados, os números discutidos em Copenhaga, para usar uma expressão apropriada ao tema, são apenas a ponta do icebergue", afirmou a eurodeputada, que se recusou a aceitar que tudo já esteja decidido mesmo antes da cimeira começar. "Em Copenhaga estão 15 mil pessoas na cimeira e 30 mil cá fora. Estas vozes têm de ser ouvidas", concluiu.

Em seguida, Francisco Ferreira começou por dizer que o processo que agora desemboca em Copenhaga foi longo e difícil. "Já se perdeu muito tempo e recursos para aqui chegar", disse o dirigente da Quercus, chamando também a atenção para a cimeira europeia que começa na quinta-feira em Bruxelas e que terá igualmente o clima e as propostas da UE no topo da agenda. "A questão da redução das emissões é crucial e estamos muito longe de um acordo", referiu Francisco Ferreira, destacando que "os EUA estão com um nível de ambição muito abaixo do desejável".

A tentativa dos países ricos de afastarem o protocolo de Quioto foi também criticada nesta intervenção, com Francisco Ferreira a informar os presentes da manifestação de delegações africanas no hall da cimeira, denunciando um dos textos que circulam pela imprensa como sendo a base das negociações dos países mais poderosos. E referiu a atitude da delegação de Tuvalu, que interrompeu os trabalhos da Cimeira para protestar contra o facto de alguns países andarem a negociar nas costas daqueles que são mais afectados pelas alterações climáticas.

"São os países desenvolvidos que têm de fazer o maior esforço e não podemos desperdiçar a força da pressão pública e política nesta cimeira", acrescentou Francisco Ferreira, que também participará na manifestação em Copenhaga "onde se esperam 60 mil pessoas".

Em seguida, o meteorologista Costa Alves afirmou que a esquerda demorou muito tempo a dar a atenção merecida ao problema das alterações climáticas. "Elas são o resultado de um modo de produzir, de consumir e de habitar o planeta", acrescentou, dando aos presentes alguns dados concretos sobre a presença dos gases de efeito de estufa no último século. "Se nada for feito para reduzir as emissões, um aumento de 2ºC significará uma nova configuração climática do planeta", afirmou Costa Alves, alertando para uma combinação de vulnerabilidades antigas e novas. "Não será o Apocalipse, mas não estamos preparados para somar à instabilidade social a instabilidade climática", concluiu.

Carlos Teixeira, da LPN, apresentou algumas das propostas da organização no actual debate da cimeira de Copenhaga, destacando a necessidade de introdução de critérios de salvaguarda da diversidade na proposta REDD, que cria créditos de carbono em troca da preservação das florestas tropicais. A LPN defendeu também a introdução de mecanismos de revisão urgente do acordo em Copenhaga que vigorem durante cinco anos e permitam corrigir as medidas naquilo que a ciência vier a determinar. Como exemplo da utilidade da medida, Carlos Teixeira apontou a corrida aos biocombustíveis, que se provou danosa para a segurança alimentar e provocou a crise alimentar nalguns países.

Por seu lado, Manuel Ferreira dos Santos, da GEOTA, considerou "aterrador" o facto da energia nuclear ter sido incluída no pacote de energias de "baixo carbono" na resolução do Parlamento Europeu, como antes tinha sido denunciado por Marisa Matias. "Gosto de 90% do que se discute em Copenhaga e dos 10% que não gosto está a questão do nuclear e das "novas bulas papais", o mercado de emissões de carbono em que os mais poluidores compram créditos para poluir.

Em seguida, o dirigente da GEOTA desafiou o Bloco a apresentar algumas medidas concretas na discussão do próximo Orçamento de Estado, como o aumento do IVA na electricidade e a sua diminuição para 5% na compra de bicicletas. "Não há razão para os carros e bicicletas eléctricas terem o IVA reduzido e estas não", argumentou Manuel dos Santos, aproveitando para desmistificar a propaganda do governo sobre o carro eléctrico, que "é poluente na fonte. A electricidade é a energia mais poluente que temos em nossa casa, porque apenas uma pequena parte é produzida a partir de energias renováveis", concluiu Manuel dos Santos.

 

Termos relacionados Política