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Copenhaga: 2 Graus Sem Controlo

Anúncios da Greenpeace anteciparam fracasso da cimeira.O resultado líquido do falhanço destas negociações terá como consequência a perda de vidas humanas, desemprego e migrações em massa. Artigo de Rui Curado Silva.

 

Já era esperado que da Conferência para as Alterações do Clima em Copenhaga não saísse qualquer protocolo ou qualquer documento juridicamente vinculativo. Esperava-se apenas um acordo político prévio sobre as restrições de emissões seguido da definição de uma data limite para elaborar um acordo juridicamente vinculativo no decurso de 2010. Para além de o acordo resultante da Conferência ter sido fraco, não indo além da necessidade de impor um limite à temperatura média do planeta abaixo de dois graus centígrados no horizonte de 2050, o Acordo de Copenhaga foi também marcado pela discórdia visto que teve o apoio apenas de 30 países. Tendo em conta o cenário mais provável, o ponto mais negativo foi a renúncia de estabelecer uma data limite para a elaboração de um protocolo juridicamente vinculativo e o ponto mais positivo foi a definição de um fundo de ajuda aos países em vias de desenvolvimento e aos países mais afectados pelas alterações climáticas. Esse fundo prevê uma ajuda de 30 mil milhões de dólares até 2012 e de 100 mil milhões de dólares até 2010. Foi decidido também continuar as negociações na Cidade do México em Novembro de 2010.

Do Acordo de Copenhaga e das negociações que estiveram na base deste texto, esteve sempre ausente a possibilidade de implementação de um mecanismo de controlo eficaz dos compromissos de redução de emissão de gases de efeito de estufa. De nada serve estabelecer-se limites de emissão se posteriormente não for supervisionada a efectiva implementação das medidas acordadas. O limite de 2°C situa-se pouco abaixo do limite de não retorno, em que o dióxido de carbono perderá a capacidade de se reciclar nas florestas e oceanos, aumentado a probabilidade de a temperatura do planeta aumentar de uma forma descontrolada. É por isso muito importante que o mecanismo de controlo a implementar seja muito preciso. O limite deverá ser forçosamente de 2°C e não 2,3 ou 2,5°C sob risco de entrarmos na zona de não retorno. A experiência de mecanismos internacionais de controlo não é famosa. Por exemplo, em questões mais concretas como é o caso dos mercados financeiros esses mecanismos revelaram uma grande fragilidade e foram incapazes de detectar a diferença entre a realidade e a ficção financeira. Um mecanismo com a mesma eficiência para controlar o clima poderia revelar-se catastrófico.

A China foi o país que maior resistência ofereceu à implementação de um processo de controlo, tendo o seu representante chegado a ameaçar abandonar as negociações. Dada a seriedade das consequências associadas às alterações do clima, que comportam alguma gravidade mesmo para um aumento de 2°C (morte dos corais, extinção de espécies até 30% e baixa da produtividade agrícola nas regiões mais secas) e que estão já a contribuir para o desaparecimento do Tuvalu, será essencial no futuro a adopção de penalizações para países que não respeitem os acordos. A atmosfera é um espaço partilhado por todos, não é pertença da China nem de qualquer outro país ou organização. Não se pode recear mais a reacção da China, tal como se receou a América de Bush, do que as ameaças que pairam sobre o futuro do planeta. O resultado líquido do falhanço destas negociações terá como consequência a perda de vidas humanas, desemprego e migrações em massa. Nada do que possa fazer a China comunista e ultra-liberal ou um hipotético retorno do fanatismo republicano ao governo dos EUA, se compara ao que está em jogo se a temperatura ultrapassar os dois graus centígrados.

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