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Compensação de emissões poluentes é "armadilha"

Compensação de emissões é fazer negócio com a morte do planeta. dizem activistas em CochabambaA Conferência de Cochabamba reflectirá a força da resistência social à compensação de emissões de gases com efeito de estufa, afirmam dirigentes sociais. Artigo de Frank Chávez, da IPS.

 
A Redução de Emissões de Carbono Causadas pelo Desmatamento e pela Degradação das Florestas (REDD) é o tema central da mesa de debate número 14 na Conferência Mundial dos Povos sobre a Mudança Climática e os Direitos da Mãe Terra, que tem por meta elaborar uma proposta que promova o fortalecimento da conservação das montanhas naturais, reconhecendo os direitos dos indígenas.

Por este mecanismo se propõe que os países mais ricos paguem para serem mantidas florestas de regiões tropicais como forma de compensar suas emissões de gases-estufa. Um encontro prévio à conferência realizado por organizações indígenas e de outros sectores sociais da Bolívia aprovou uma resolução exigindo das nações industrializadas que reduzam drasticamente suas emissões de gases como dióxido de carbono, metano e óxido nitroso, responsáveis pelo aquecimento global.

O documento transformado em uma proposta central deste grupo de trabalho reclama a criação de uma instância internacional que regule o cumprimento do pagamento da chamada dívida climática. “Copenhague foi uma decepção, o planeta está morrendo”, disse à IPS em tom firme o médico boliviano José Ramírez, que há 43 anos vive na Alemanha. A referência é a falta de resultados na 15ª Conferência das Partes da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática (COP-15) realizada em dezembro na capital dinamarquesa.

Representando as organizações Médicos Contra a Guerra Nuclear (IPPNW) e Solidariedade Alemã Estrangeira, este activista confia na emergente força dos movimentos sociais para resoluções a favor das florestas. A queda do consumo e a vida em harmonia com o planeta, recolhendo a experiência boliviana do “Viver bem”, serão um acordo mundial e a participação da sociedade civil não pode ficar sem resposta, disse este médico partidário de “romper com o sistema capitalista” e que acompanhou os debates em Copenhague e agora é ator nas discussões em Cochabamba.

Por sua vez, o indígena guatemalteco Felipe Gómez, do Programa sobre Desenvolvimento Endógeno Sustentável Mesoamérica, disse à IPS que “a política de cuidados com as florestas em troca de dinheiro é uma armadilha e representa uma ameaça enorme dos governos partidários desse esquema e das empresas multinacionais”. Gómez explica que o pagamento de compensações pelas emissões de carbono tem implicações desconhecidas. “A comunidade receberá o dinheiro, mas qual será o destino da comunidade?”, pergunta.

Sua companheira de delegação, a indígena Andrea Rocché, também recorda à IPS que seu povo aprendeu com os antepassados a “conservar a natureza e praticamos com nossos filhos a protecção e o amor à vida silvestre”. Gómez se mostra temeroso quanto aos impactos de uma “mercantilização do problema”. Diante de uma situação de mudança climática, a resposta dos países industrializados ocorreu com termos de mercado, replica. Uma saída para o tema da crise ambiental, na opinião deste líder dos povos indígenas da Guatemala, deve começar com um reconhecimento do ser humano em sua integridade e a compreensão de que sua existência está condicionada à vida da natureza.

“O ser não pode ser separado do saber e tampouco se pode separar o saber do fazer”, diz em uma interpelação a única ciência divulgada pelos países industrializados, dos quais é cobrado um reconhecimento de outros conhecimentos dos povos sobre saúde, economia e política. “Quando forem reconhecidos os sistemas próprios dos povos se admitirá que não existe uma ciência única ou uma cultura que defina o pensamento para dividir. Deve-se romper com o monoculturalismo científico”, afirma.

No Equador, o programa “MUYU: fruta comida, semente semeada”, conseguiu incorporar-se nas actividades escolares com tarefas de reflorestamento e cultivos em viveiros. Seu criador, o colombiano Hernando Rojas, chegou à conferência para divulgar seu êxito participando da mesa 16, sobre Estratégias de Acção. Rojas é autor do livro “Pura vida!”, onde expõe um pensamento “para compartilhar com a natureza e a humanidade, resistindo ao sistema de produção, mercado e consumo competitivos, partindo da filosofia do Viver Bem”.

Sobre as campanhas em favor da compensação pela conservação das florestas, tem uma opinião enérgica, e explicou à IPS que “o problema não está em negociar com os que destroem o planeta e geram o aquecimento global e a corrida armamentista. Se o povo não tiver poder, não terá força para deter os que destroem a natureza e a humanidade. Por isso, a proposta do presidente boliviano, Evo Morales, para convocar uma consulta mundial, é uma prioridade”, disse Rojas. Também ratifica uma estratégia destinada a conservar as florestas e reflorestar pela acção dos povos.

A proposta que apresenta na conferência consiste em deter o actual sistema de produção baseado no mercado, enfrentá-lo e promover o Viver Bem. O activista colombiano pede geração de energia limpa à margem da exploração de combustíveis fósseis e uma corrida contra as multinacionais, as quais responsabiliza de perseguirem apenas o lucro. Uma proposta de compensação é uma atitude de dupla moral e uma forma de disfarçar o verdadeiro objectivo. “É uma maneira de fazer negócio com a morte do planeta e, quando se trata de negócios, não há limite”, afirma Rojas.

 


Artigo IPS/Envolverde

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Termos relacionados Energia nuclear, Internacional