Depois de na quinta-feira um homem ter sido absolvido por ter batido na mulher "apenas duas vezes", o Bloco de Esquerda anunciou ontem a apresentação para breve de um projecto-lei que visa combater a violência de género. A deputada do Bloco de Esquerda, Helena Pinto, lembrou que «a violência contra as mulheres é esmagadora nos números e sobretudo é fruto da sua subalternidade e de séculos de discriminação, estando enraizada nas concepções mais conservadoras que, ainda hoje, atribuem um papel estereotipado às mulheres» sublinhando que «é a inversão destes valores que é preciso acautelar na lei».
Veja aqui a intervenção completa de Helena Pinto.
O Bloco de Esquerda prepara-se para apresentar um projecto-lei para combater a violência de género. O anúncio foi feito hoje pela deputada Helena Pinto: «O Bloco proporá a criação de unidades especiais para a violência de género no âmbito dos tribunais, matéria que deverá ser tida em consideração no âmbito da reforma da organização judicial».
A deputada recordou os diversos acórdãos em tribunal que desculpabilizam as agressões masculinas: «Já conhecíamos a célebre tese que desculpabiliza uma violação, pelo facto de se usar mini-saia e sobretudo por não se poder esquecer que se encontravam em "coutada do macho latino". Depois ficámos a saber que a ausência de sexo pode ser atenuante em caso de homicídio conjugal. Assim como, também deixar esturricar a comida ou ir ao café, também podem contar como atenuantes, em situação de homicídio».
Helena Pinto referiu-se igualmente a uma situação bem mais recente, de um homem absolvido por ter batido apenas duas vezes na mulher: «Mas ontem, fomos novamente surpreendidos por um novo acórdão do Tribunal da Relação do Porto, que absolveu um homem, que agrediu a sua mulher, mas cuja conduta foi qualificada de ofensa à integridade física e não de crime de maus tratos conjugais». «Ai da mulher que se atreva a incumprir o papel que a sociedade lhe determinou porque de vítima transforma-se em instigadora da sua própria sorte», concluiu a deputada.
Com o projecto-lei hoje anunciado, o Bloco de Esquerda pretende também retirar margem de manobra aos tribunais para punirem os agressores meramente pelo crime de ofensas à integridade física, devido à excessiva «exigência da intensidade e da reiteração para a qualificação da conduta como crime de violência doméstica». A não alteração da legislação implica «a sujeição total ao poder discricionário do Procurador do Ministério Público, que decidirá o que é ou não intenso, e mesmo que passe por este crivo, dificultará a prova em sede de julgamento, pois a mesma terá que ser produzida em relação a todos os factos, nomeadamente quanto à sequência de datas que justifica essa reiteração».