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Estado de Israel: o rufião mimado

Israel quebrou todos os compromissos que alicerçam o cessar-fogo precário, entre o Estado de Israel e a liderança do Hamas, e expande a ocupação de forma silenciosa. O poder que domina em Israel comporta-se como um rufião mimado que tem aquilo que quer e dispensa qualquer puxão de orelhas.

Os holofotes acendem, liga-se o direto, apertam-se mãos, acena-se a cabeça e elaboram-se discursos hábeis sobre o processo de paz. Após 8 dias de um bombardeamento constante, onde foram lançados mais de 1.200 ataques aéreos pelas forças Israelitas, causando 166 mortes, procede-se um cessar-fogo entre o Estado de Israel e a liderança do Hamas, com o Egito servindo de intermediário. O Ministro dos Negócios Estrangeiros do Egito, Mohamed Kamel Amr, faz a mediação para se chegar a um cessar-fogo que é aceite por ambas as partes e contém 3 pontos essenciais:

1) Israel deverá parar todas as hostilidades na Faixa de Gaza, o que inclui incursões pelo ar, pela terra e pelo mar;

2) Todas as fações Palestinianas terão que por fim às hostilidades na Faixa de Gaza contra Israel, incluindo os ataques na fronteira e o lançamento de mísseis;

3) A abertura das passagens e a facilitação do movimento de pessoas e bens, tendo em especial atenção os cidadãos que vivem na Faixa de Gaza.

Todas estas medidas deveriam ser cumpridas 24 horas após o cessar-fogo. Deveriam, mas nada foi cumprido. Sem grandes surpresas, aconteceu o expectável: Israel quebrou todos os compromissos que alicerçam este cessar-fogo precário e expande a ocupação de forma silenciosa.

Israel quebrou o primeiro compromisso quando o cessar-fogo não tinha mais que uma semana. No dia 29 de novembro, a frota israelita capturou 6 pescadores palestinianos por estarem a 5 milhas da costa de Gaza. Entenda-se que, de acordo com os Acordos de Oslo de 1993, os pescadores palestinianos podem pescar até 20 milhas da costa. Mas isso não interessa, Israel faz o que quer, quando quer. No dia seguinte, a frota israelita abriu fogo a um barco de pesca palestiniano por estar a 3 milhas da Cidade de Gaza. Entre 29 de novembro e 5 de dezembro, os militares israelitas conduziram 47 incursões na Cisjordânia e uma na Faixa de Gaza. Os drones, aviões telecomandados do exército israelita, continuam a circular sobre as cidades. O cessar-fogo não tem significado nenhum.

No dia 30 de novembro, 9 dias após o cessar-fogo e 1 dia após o reconhecimento da Palestina como Estado observador não-membro na ONU, Israel aprova um plano para a construção de um colonato ilegal com mais de 3000 casas, cortando qualquer possibilidade de acesso das aldeias palestinianas a Jerusalém Oriental. Esta língua habitacional parte a Cisjordânia a meio. Conjugado com o labirinto de check-points militares e os restantes colonatos, a circulação dos palestinianos torna-se uma impossibilidade e a criação do Estado Palestiniano uma obra messiânica. Por cada passo que derem na construção de um Estado, os palestinianos serão punidos.

Entretanto, o bloqueio à faixa de Gaza mantém-se e nada foi feito para o aliviar,. O bloqueio intensifica o desastre humanitário naquela prisão ao ar livre. Assim rasga-se o compromisso e a vida de quem habita Gaza.

O cessar-fogo já apresentava as suas debilidades porque não aborda os eixos principais que estruturam a instabilidade no médio oriente: o bloqueio israelita a Gaza, a ocupação dos territórios palestinianos por parte de Israel e o não reconhecimento do Hamas como governo eleito na Faixa de Gaza. O que já era precário, desmoronou. Existe um fosso enorme entre aquilo que o Estado de Israel faz e aquilo que diz por uma simples razão: não querem saber. Fazem aquilo que lhes apetece, sem condicionantes ou consequências. É a lei do mais forte.

Desligam-se os holofotes, ouve-se o som agudo do fim da transmissão e abana-se a cabeça. Fica a promessa do governo israelita de somente desenvolver o processo, deixando a paz de lado. O poder que domina em Israel comporta-se como um rufião mimado que tem aquilo que quer e dispensa qualquer puxão de orelhas.

Sobre o/a autor(a)

Mestre em Sociologia. Assessor do Bloco de Esquerda no Parlamento Europeu.
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