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Laranja perigosa paira sobre os Jogos Olímpicos

O agente laranja, normalmente chamado de “último legado” da Guerra do Vietname, está novamente em evidência porque um dos seus fabricantes, a multinacional Dow Chemical, aparece entre os patrocinadores dos Jogos Olímpicos de Londres. O Vietname não boicota esta competição, mas apresentou um protesto formal perante o Comité Olímpico Internacional (COI). Por Helen Clark, da IPS
Guerra do Vietname. Foto: Reprodução/historia espetacular

O ministro do Desporto do Vietname, Hoang Tuan Anh, expressou a sua “profunda preocupação” pelo multimilionário patrocínio da Dow Chemial.

Agente laranja é o nome em código utilizado para herbicidas e desfolhantes empregados pelas Forças Armadas dos Estados Unidos durante a sua invasão do Vietname (1964-1975). Após a normalização das relações entre Estados Unidos e Vietname em 1995, Washington destinou fundos para operações de limpeza, mas estas concentraram-se em lugares concretos como ex-bases aéreas, onde foi armazenado o agente laranja, e não nas populações humanas que sofreram os efeitos nefastos durante anos.

A crescente cooperação entre os dois países ficou evidente com a visita, em junho, ao Vietname, do secretário de Defesa dos Estados Unidos, Leon Panetta, e com as três realizadas nos últimos dois anos pela secretária de Estado, Hillary Clinton. Contudo, isso não mudou de forma significativa a atitude de Washington de não contemplar indemnização para as populações gravemente prejudicadas por terem sido expostas ao agente laranja.

“Creio que muitos vietnamitas estão descontentes com a decisão dos organizadores das Olimpíadas de 2012. E está totalmente justificado”, declarou à IPS o general na reserva Nguyen Van Rinh, chefe da Associação de Vítimas do Agente Laranja do Vietname. Este desfolhante contém uma das dioxinas mais tóxicas que se conhece, e os cientistas estimam que umas poucas partes por milhares de milhões podem ser daninhas para a saúde de qualquer ser vivo. Calcula-se que entre 2,1 milhões e quatro milhões de pessoas foram afetadas pelo agente laranja.

O governo vietnamita atribui a ele a presença de cancro e má formação em, aproximadamente, 500 mil crianças de segunda e terceira gerações. A Cruz Vermelha do Vietname disse que cerca de três milhões de vietnamitas foram prejudicados pelo herbicida, entre os quais pelo menos 150 mil meninas e meninos que nasceram com más formações congénitas. Porém, os cientistas norte-americanos manifestam-se precavidos a respeito das estimativas e investigações vietnamitas sobre o dano humano causado pelo agente laranja e questionam a qualidade dos seus estudos.

Entretanto, as veteranas de guerra norte-americanas supostamente prejudicadas pelo composto químico foram indemnizadas e receberam apoio para os seus filhos. Os bebés nascidos com espinha bífida (fendida ao meio) ou outras más formações, devido a causas desconhecidas e cujos pais estiveram em zonas onde o agente laranja foi espalhado, também receberam compensações. O Instituto de Medicina da Academia Nacional de Ciências dos Estados Unidos no seu informe intitulado Veteranos e Agente Laranja: Resumo e Destaques de Investigações, Atualização 1996 conclui que “os testes sobre a associação entre a exposição a herbicidas utilizados no Vietname e a espinha bífida em filhos de veteranos são limitadas ou sugeridas”.

Há algum tempo os ambientalistas também se preocupam com o facto de a multinacional Monsanto, fornecedora mundial de sementes, fazer incursões em silêncio no Vietname. Temem um segundo “legado inesquecível” de um consórcio que participou da produção do agente laranja. Segundo numerosos estudos, a campanha com esse composto tóxico destruiu dez milhões de hectares de terras cultiváveis e aproximadamente 20 mil quilómetros quadrados de terras altas e florestas de mangues.

Rinh questionou o ministro da Agricultura do seu país, Cao Duc Phat, pelo trabalho da Monsanto neste território durante uma sessão da Assembleia Nacional. Depois, declarou que as suas perguntas foram vagamente respondidas pelo ministro e, também, se queixou de que nem as perguntas nem as respostas foram registadas nas atas. Chuck Searcy, um veterano de guerra norte-americano que regressou ao Vietname há uma década para trabalhar em projetos de remoção de minas e outras munições, revelou que foram “os Estados Unidos que começaram a falar de processos judiciais e questões legais” em relação ao agente laranja.

O facto de o governo norte-americano ter aceitado, embora depois de várias reclamações, que os herbicidas causaram danos significativos ao seu pessoal, e ter pago indemnizações irritou muita gente no Vietname. As culturas modificadas geneticamente “começaram a gerar grandes suspeitas em muitos vietnamitas porque o agente laranja foi produzido pelas mesmas companhias que afirmam que o herbicida é seguro”, pontuou Searcy.

Um grupo de cem vietnamitas levou o seu caso contra a Dow Chemical e a Monsanto até ao Supremo Tribunal de Justiça dos Estados Unidos. O julgamento começou em 2004, mas no começo de março de 2009 foi indeferido pelo alto tribunal, o qual determinou que não estava estabelecido um vínculo entre a dioxina e as más formações congénitas dos vietnamitas afetados. Além disso, segundo a legislação norte-americana, nenhuma das duas empresas pode ser considerada responsável, pois agiram sob ordem do governo.

Em resposta à carta de protesto do Vietname, ao COI, a Dow Chemical disse à VietWeek, uma revista em inglês publicada pela Than Nien News, que a lei de Produção de Guerra absolve as empresas, pois foram obrigadas a produzir o desfolhante pelo governo. “Creio que a cooperação entre Estados Unidos e Vietname para encontrar e implantar soluções para o problema parece estar um pouco melhor”, disse Rinh à IPS. No entanto, “a maioria são palavras e esses comportamentos são apenas um pequeno esforço e estão muito longe do que deveriam estar a fazer”, ressaltou.

Envolverde/IPS

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