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Raposo, a invasão da Ucrânia e a mentira que, antes de o ser, já o era

Como o artigo de Henrique Raposo foi publicado a 7 de abril, às 10h03m da manhã, Henrique Raposo manifestou a sua indignação com uma abstenção que foi um voto favorável e que aconteceu… duas horas depois do seu texto ser publicado.

Num artigo publicado no passado dia 7 de Abril, Henrique Raposo destilou um chorrilho de epítetos e insultos sobre o Bloco, o que está longe de ser uma novidade. Entre eles inclui a seguinte reflexão: «E este redil, há muito desconstruído por Orwell, diz assim: a verdade não existe, a verdade empírica e moral é uma invenção "burguesa”. Ou seja, o pós-verdade é a essência destes radicais. A verdade é aquilo que interessa ao partido, aliás, a verdade é o ódio que as pessoas do partido sentem, e pouco mais.» Peço ao leitor que retenha esta reflexão.

Certamente por amor à verdade, Henrique Raposo arranca então para denunciar: “nesta guerra, o BE senta-se no muro e recusa tomar uma posição.  Na verdade, o BE gostava de ter a coragem do PCP, gostava de apoiar a Rússia, mas são demasiado hipócritas para isso. Por isso, sentam-se no muro da abstenção, o que torna a sua posição ainda mais amoral.”

Falemos então da “recusa em tomar posição”. A 23 de Fevereiro, a direção do Bloco emite um comunicado condenando a agressão militar à Ucrânia. A 24 de Fevereiro, Catarina Martins afirma “há um país que está a ser invadido à margem de qualquer lei internacional e isto merece a mais veemente condenação e merece ação.” A 1 de Março, o Parlamento Europeu aprova uma resolução condenando a invasão, resolução essa que contou com o voto favorável do Bloco. Curiosamente, também por essa altura, outros Henriques Raposos da nossa praça resolveram mentir sobre o voto do Bloco. Felizmente, houve órgãos de comunicação social que corrigiram essas notícias falsas. Henrique Raposo não lê o jornal em que escreve. Nem sequer os títulos.

Mas Henrique Raposo não se limita a acusações infundadas, mas genéricas. Sem medo de ser concreto, informa que “ontem, no Parlamento Europeu, a abstenção dos deputados do BE representa precisamente esta equivalência amoral (repito: amoral) entre a Ucrânia e a Rússia”.

Vamos aos factos. Na semana passada, foi votada uma resolução sobre os desenvolvimentos na Ucrânia e as sanções contra a Rússia. O Bloco votou a favor dessa resolução. Fez, aliás, propostas adicionais, infelizmente chumbadas, no sentido do perdão da dívida da Ucrânia e da exigência de toda a informação aos paraísos fiscais sobre os ativos de oligarcas russos. Também houve uma sobre as ligações de Putin à extrema-direita europeia, mas, lendo o artigo de Raposo, suspeito que este tópico lhe interesse menos. Mas também votámos a favor dessa.

Um pormenor divertido é que Henrique Raposo denuncia esta suposta abstenção numa votação que supostamente teria acontecido a 6 de abril. Ora, a votação da resolução estava, de facto, agendada para 6 de abril, mas acabou por ser adiada para o dia seguinte, por atrasos nos compromissos finais.

Como o artigo de Henrique Raposo foi publicado a 7 de abril, às 10h03m da manhã, Henrique Raposo manifestou a sua indignação com uma abstenção que foi um voto favorável e que aconteceu… duas horas depois do seu texto ser publicado. Quando os factos não interessam, nem é preciso esperar que eles tenham lugar. Em Henrique Raposo, a mentira, antes de o ser, já o era.

Claro que nada disto interessa. Como Raposo já explicou, tudo isto é hipocrisia e o Bloco gostava era de ter a “coragem do PCP” para “apoiar a Rússia”. Agora condena, mas dantes apoiava. Ora, Henrique Raposo, como já comprovámos, mente conscientemente. Mas o leitor poderá saber mais sobre a posição do Bloco através desta recolha que o Esquerda.net fez sobre toda a cobertura que foi fazendo do regime de Vladimir Putin desde 2006: “Repressão, corrupção e apoio à extrema-direita: o reinado de Putin visto pelo Esquerda.net”. O regime russo já era, de resto, caracterizado no manifesto fundador do Bloco como uma Economia Mafiosa.

O ódio e repulsa de Henrique Raposo em relação ao Bloco não são novidade para quem tem o azar de o ler. Ficam os leitores também a saber o que não lhe causa repulsa nenhuma: a mentira consciente e deliberada. Voltemos então ao início, adaptando a prosa de Raposo: “a verdade é aquilo que interessa a Raposo, aliás, a verdade é o ódio que Raposo sente, e pouco mais.”

Artigo publicado em expresso.pt a 11 de abril de 2022

Sobre o/a autor(a)

Eurodeputado e economista.
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