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Bloco quer extensão das moratórias de créditos à habitação

Por estes dias, quantas famílias demasiado grandes em casas demasiado pequenas? Quantas a suportar confinamento e pandemia com frio, por não conseguirem aquecer a casa? Quantas ameaçadas de despejo com o fim das moratórias?
Catarina Martins no comício dos 22 anos do Bloco de Esquerda - foto de Andreia Quartau
Catarina Martins no comício dos 22 anos do Bloco de Esquerda - foto de Andreia Quartau

Na sua intervenção no comício online dos 22 anos do Bloco de Esquerda (e que publicamos na íntegra abaixo), Catarina Martins começou por salientar que “hoje, ao longo do dia, mais de 600 pessoas passaram pela conferência autárquica do Bloco”.

Falando de duas décadas de vida do Bloco, Catarina Martins afirmou “Nunca desistimos de nada”, lembrando a frase de Miguel Portas, e sublinhou que “sem o Bloco este país seria muito diferente. O Bloco é o partido que nunca ficou à espera”. “São mais de duas décadas em que não caminhamos sozinhos, fizemos cada uma destas lutas lado a lado com gente muito diferente em muitos momentos. O Bloco trouxe esquerda à esquerda. Nem sempre foi fácil, temos um orgulho enorme neste caminho”, sublinhou.

A concluir, a coordenadora do Bloco de Esquerda lembrou a crise da habitação, para sublinhar que “Se se pede ao país que fique em casa, é de casa que o país precisa” e propor: “Garantir uma casa decente. É essa a nossa proposta. Uma proposta que cruza as responsabilidades centrais e municipais.”

E apelou ao primeiro-ministro, António Costa: “não espere que seja tarde demais; não espere pelo início da vaga de despejos e falências. As moratórias têm de ser estendidas já”.

Intervenção integral de Catarina Martins no Comício online dos 22 anos do Bloco de Esquerda

Quem agora nos acompanha em direto das redes, talvez não saiba. Mas o Bloco acabou de fazer um dos seus maiores debates de sempre. Hoje, ao longo do dia, mais de 600 pessoas passaram pela conferência autárquica do Bloco, com momentos em que se juntaram mais de 300 pessoas e com cerca de 100 intervenções.

Bem sei que ficamos com o amargo de não termos este dia e este encontro partilhando o espaço e os abraços. Bem sei que estamos todos fartos das videoconferências. Mas que grande dia.

Catarina Martisn com outras militantes bloquistas no local de onde foi transmitido o comício virtual
Catarina Martisn com outras militantes bloquistas no local de onde foi transmitido o comício virtual

Autarcas do Bloco de todo o país trocaram experiências e propostas sobre a crise e como sair dela. Temos feito muito caminho na intervenção em todo o país. Temos feito caminho em novos patamares de exigência no trabalho local: da transparência, de políticas sociais emancipadoras, de lutas pelo ambiente e pela qualidade de vida. Sabemos das enormes dificuldades de abanar um quadro autárquico muito cristalizado e conservador. Mas temos provas dadas na capacidade e qualidade da intervenção e orgulhamo-nos desta rede incansável que faz a diferença em todo o país.

 

A última grande iniciativa presencial que fizemos - há já um ano, antes do primeiro confinamento - foi também sobre democracia e território.

Um encontro em Coimbra, estarão lembrados, onde trabalhámos propostas sobre a criação da escala regional de participação democrática. Porque para nós, a regionalização não pode ser um debate estéril sobre cadeiras de poder mas uma exigência concreta para a coesão social e territorial, o fortalecimento dos serviços públicos e do alargamento da sua cobertura, o planeamento participado e criterioso do território e dos recursos naturais, a resposta aos desafios da emergência climática.

Como afirma o manifesto fundador do Bloco, viemos para romper “o círculo vicioso de um rotativismo ao centro, onde todos falam de mudança mas nada se transforma”. É essa luta transformadora que, por difícil que seja, transportamos também na política local. E que hoje é tão fundamental como há 22 anos.

“Nunca desistimos de nada.” E se é certo que o caminho não é sempre fácil e vivemos vitórias como derrotas, sabemos o que toda a gente reconhece: sem o Bloco este país seria muito diferente. O Bloco é o partido que nunca ficou à espera.

No reconhecimento da dignidade de cada pessoa, mesmo quando alguns se opunham e outros hesitavam, foi o Bloco quem teve sempre a coragem de se levantar pelos direitos LGBT, pela descriminalização do aborto, por uma política de drogas que é ainda hoje das mais avançadas na Europa, pelo combate à violência doméstica, pelo direito à nacionalidade ou pela despenalização da morte medicamente assistida. Se há coisa que estes 22 anos nos ensinaram é que pode demorar, pode ser preciso insistir uma e outra vez, mas que nos avanços pela liberdade não se pode ficar à espera.

A dignidade de cada um e cada uma não fica em lista de espera e é porque não faltamos à luta que a conquistamos.

Na defesa de quem trabalha, mesmo quando alguns acham que é no mal menor que se vence a crise, o Bloco teve a coragem de ir à luta pelo salário, pela pensão, pelas escolas e pelos hospitais públicos. Somos tão determinados na criação de pontes e maiorias que puxem por um país mais justo, como na recusa de chantagens ou jogos que abandonem quem trabalha e constrói este país. O Bloco nunca hesitou na defesa dos trabalhadores precários, na proteção do SNS, na justiça fiscal que combate o regime do privilégio. Se a elite económica anda há 22 anos incomodada com o Bloco, é porque fizemos o nosso trabalho.

São mais de duas décadas em que não caminhamos sozinhos, fizemos cada uma destas lutas lado a lado com gente muito diferente em muitos momentos. O Bloco trouxe esquerda à esquerda. Nem sempre foi fácil, temos um orgulho enorme neste caminho.

 

Há 4 anos, conheci a Carla, a Rosário, a Alessandra e outras moradoras da Rua dos Lagares, na Mouraria, em Lisboa. À boleia da Lei Cristas - que o PS aceitou alterar mas nunca revogar - acabavam de receber ordem de despejo das suas casas. Mas estas mulheres decidiram lutar. E nós lutámos com elas. 4 anos passados, finalmente têm casa para viver; habitação da câmara, no centro histórico, como sempre exigiram.

Agora quase parece fácil. Mas pensemos na luta e determinação destas mulheres, na angústia de ficar sem teto, na força para seguir uma luta sem desfecho garantido. Esta é a nossa gente. E esta é a nossa luta.

A habitação é um dos maiores problemas do nosso país, da nossa democracia. O pilar social anunciado com a constituição de abril, mas nunca realmente construído. Todas as desigualdades estruturais do país, todas as discriminações e opressões, se agudizam no acesso à habitação.

Penso na vitória das mulheres dos Lagares, mas também na angústia sem luz ao fundo do túnel em tantos bairros da Amadora, onde estou agora, ou no Centro Histórico do Porto, a minha cidade, e um pouco por todo o país.

Se a crise na habitação era um dos maiores problemas antes da pandemia, nada se resolveu ou ficou mais fácil quando o país confinou.

Se se pede ao país que fique em casa, é de casa que o país precisa. Uma casa decente.

Há dezenas de milhares de famílias sem teto ou em casas precárias. E precisam de resposta. Mas há também centenas de milhares de famílias com rendimentos médios para quem pagar uma casa se tornou um pesadelo. E que também precisam de resposta. É para todos os que falamos. Lutamos convosco por uma casa decente. É esse o nosso compromisso.

A recuperação de que o país precisa é a que respeita a gente que aqui vive e trabalha. E terá de garantir a casa.

Esperar uma recuperação de mercados que continue a expulsar pessoas dos centros das cidades em nome dos vistos gold, dos privilégios fiscais dos não residentes ou incentivos à turistificação maciça do território é um perigo que não podemos aceitar. Acabar com regimes de privilégio é o primeiro passo de uma política de habitação decente.

Desistir de colocar o investimento na habitação no coração do Plano de Recuperação, é um erro que não deixaremos passar.

Em Portugal a habitação pública é residual. Essa demissão pública, impede tanta gente de ter acesso a uma casa decente enquanto proliferam as casas vazias ou as casas sem condições.

O confinamento não é igual para todos porque nem todos têm as mesmas condições.

Por estes dias, quantas famílias demasiado grandes em casas demasiado pequenas? Quantas a suportar confinamento e pandemia com frio, por não conseguirem aquecer a casa? Quantas ameaçadas de despejo com o fim das moratórias?

 

Garantir uma casa decente. É essa a nossa proposta. Uma proposta que cruza as responsabilidades centrais e municipais.

Com intervenção pública nas casas vazias, reabilitando e arrendando a preços acessíveis, para aumentar a oferta e regular o mercado. Casas decentes, a preços decentes.

Com apoio para garantir eficiência energética e acabar com a vergonhosa taxa de mortes por frio no nosso país. Casas decentes, sem frio.

Com adaptação das casas de quem tem menos mobilidade, seja pela idade ou por deficiência, para que a institucionalização não seja imposta a quem preferia ficar em sua casa. Casas decentes, para toda a gente.

E, desde já, planear o fim da pandemia e proteger a casa de morada da família. Não é aceitável que, quem tanto perdeu com a crise, perca também a casa com o fim das moratórias.

É necessário garantir que todas as moratórias são estendidas, porque a crise está longe do fim, é necessário garantir também que o seu prazo acompanha a efetiva recuperação. Para as famílias como para as pequenas empresas. Se as moratórias forem cessadas antes de haver recuperação económica, teremos uma enorme vaga de despejos e falências.

E será necessário preparar um grande programa de recuperação das dívidas para as empresas e pessoas em dificuldades, com planos de reestruturação ajustados, e a prioridade de proteger a morada de família.

Esta não é uma decisão que possa esperar. As moratórias sobre as hipotecas da Associação Portuguesa de Bancos terminam em março. Março é já amanhã. O governo prometeu que seriam transferidas para as moratórias do Estado, que terminam em setembro, mas isso não aconteceu. E por isso hoje, deixo aqui este apelo a António Costa: não espere que seja tarde demais; não espere pelo início da vaga de despejos e falências. As moratórias têm de ser estendidas já.

Nenhuma crise, nem mesmo a provocada por um vírus, afeta toda a gente da mesma forma. Em todas, aumentam as desigualdades. No resto do mundo, como em Portugal, as grandes fortunas continuam a crescer.

A responsabilidade política é fazer escolhas. Uma intervenção pública pelos mínimos é premiar o privilégio e cavar mais as desigualdades. No Bloco de Esquerda lutaremos pela máxima responsabilidade e exigência: uma resposta justa para a crise.

Justiça. É assim há 22 anos. É assim que somos. Seguimos juntas, juntos.

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