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Brasil: Temer não consegue vencer camionistas

Nem os acordos nem a repressão conseguiram desmobilizar os camionistas, que entram no 10º dia de greve esta quarta-feira, o mesmo dia em que começa a greve dos petroleiros. Jornal fala em “tempestade perfeita” que assola Temer. Por Luis Leiria.
Camionista num bloqueio em Seropédica, estado do Rio de Janeiro – Foto de Tomaz Silva/Agência Brasil
Camionista num bloqueio em Seropédica, estado do Rio de Janeiro – Foto de Tomaz Silva/Agência Brasil

O presidente Temer tentou de tudo para acabar com a greve dos camionistas. Anunciou dois acordos; chamou as forças federais para reprimi-los. Nem uma coisa nem outra tiveram sucesso. Nesta terça-feira, a greve chegou ao nono dia e no essencial mantém-se, junto com os bloqueios de rodovias, apesar de ter sido amenizada a situação de desabastecimento de combustíveis em alguns estados devido à mobilização de camiões-tanque escoltados pela polícia.

Uma greve dos petroleiros (trabalhadores da Petrobrás) começa esta terça e deve ganhar mais força na quarta. Os sindicatos culpam a política de preços de combustíveis praticada pela direção da Petrobrás, a responsável pelos abismais aumentos de preço. A política de liberalização total dos preços (há variações de preços diárias) foi implementada pela nova diretoria de Pedro Parente, nomeada por Temer, e beneficia única e exclusivamente os acionistas da empresa.

Uma greve geral que derrubasse de vez o moribundo e odiado governo federal pareceria uma medida evidente num país que já está praticamente paralisado. Mas as centrais sindicais mais poderosas, incluindo a CUT, hegemonizada pelo Partido dos Trabalhadores, assinaram uma nota colocando-se à disposição para intermediar “a busca de um acordo que solucione o caos social para o qual o País caminha” (nota da CUT, da Força Sindical, da UGT, da CTB, da Nova Central e da CSB). O contraponto foi dado pela pequena mas combativa CSP-Conlutas, que apelou à greve geral.

Fracasso do governo em toda a linha

Depois de um primeiro acordo anunciado quarta-feira dia 23, que apenas contentou as grandes empresas de camionagem e foi ignorado pelos camionistas autónomos (cerca de 70% do total), o governo achou que tinha resolvido a questão ao anunciar um segundo acordo na noite de domingo. Com efeito, mesmo a entidade dos camionistas que denunciara o acordo anterior agora apoiava este último. Mas o resultado foi nulo: os camionistas queriam mais e não desmobilizaram. Organizados em grupos do WhatsApp e em canais do Youtube, entre outras redes, radicalizaram-se ainda mais quando Temer anunciou o recurso a forças federais para os reprimir.

Na segunda-feira, os principais meios de comunicação, as redes de televisão e os jornais dos grandes grupos de média anunciavam o fim da greve. Mas bastava visitar alguns canais do Youtube para perceber que a realidade nas centenas de bloqueios de camionistas nas rodovias não era essa. A greve prosseguiu. Mais de uma dezena de aeroportos mantiveram-se sem combustível. Os cidadãos continuaram a ter muita dificuldade para encontrar gasolina nos postos para abastecer os seus automóveis. Alguns estados, como Minas Gerais, dispensaram esta semana a maior parte dos seus funcionários, incluindo os do ensino. Escolas fechadas, universidades fechadas, muitos trabalhadores não conseguindo chegar aos locais de trabalho porque os transportes públicos funcionaram muito reduzidos – este é o panorama do Brasil na tarde desta terça-feira.

A repressão de Temer não funcionou. Arredar camiões de muitas toneladas de centenas de bloqueios não é fácil. Em S. Paulo, a polícia lançou de helicóptero gás lacrimogéneo sobre manifestantes que cortavam o trânsito de uma rodovia, numa manifestação de impotência, porque não havia tropas de choque no terreno para desmontar o bloqueio.

Mostras de desespero

Então, o governo começou a dar mostras de desespero. O ministro Carlos Marun, da Secretaria de Governo, afirmou que a Polícia Federal já tinha feito pedidos de prisão para empresários do transporte, causando espanto entre os colegas. Ninguém leva a sério a vontade do governo de prender empresários. O ministro da Fazenda anunciou o aumento de impostos para compensar a redução do preço do diesel, para ser desmentido logo em seguida e recuar no dia seguinte.

A Folha de S. Paulo dava conta nesta terça-feira do desconforto de muitos deputados da direita diante da desastrosa atuação do governo e resumia assim a “tempestade perfeita” que assola Temer:

“- enfrenta uma greve de caminhoneiros sem precedentes;

- tem níveis recordes de impopularidade;

- não fez a economia deslanchar, e agora tem de lidar com a alta do dólar;

- perdeu a capacidade de aprovar reformas no Congresso;

- é investigado pela PF em razão de decreto no setor portuário.”

Disputa nas ruas

Diante de um movimento pujante e heterogéneo como o dos camionistas, era natural que a extrema-direita, que mostra um nível crescente de organização, procurasse influenciar o movimento, levando a ele a sua campanha a favor de uma intervenção militar. Aproveitando-se do facto real de Michel Temer ter sido o vice de Dilma Rousseff, tentam fazer crer aos camionistas que a política de Temer tem a mesma matriz que a de Dilma, e que Temer é “de esquerda”. Pode parecer absurdo que uma greve peça uma intervenção militar, porque um regime militar, por definição, não tolera greves. Mas há uma parcela, difícil de quantificar, dos camionistas que se deixam levar por esse canto de sereia. Tanto mais que a esquerda socialista, que também apoia a greve, é ainda fraca, e o PT, que dirige a maior central sindical, está no mínimo dividido em relação ao apoio aos camionistas.

Na segunda-feira, uma manifestação da extrema-direita ocupou a avenida Paulista, na cidade de S. Paulo, pedindo a intervenção dos militares, mobilizando apenas algumas centenas de pessoas. Em Brasília, uma manifestação semelhante contou com cerca de mil participantes, segundo a Polícia.

Mas o maior representante da extrema-direita, o deputado Jair Bolsonaro, pediu o fim dos bloqueios das estradas, afirmando que a paralisação dos caminhoneiros já chegou ao seu ápice e precisa acabar. “Não interessa a mim, ao Brasil, o caos agora”, afirmou, explicando que o caos seria o derrube do presidente Michel Temer. “Se faltasse um ano e meio, dois, três, tudo bem, pô.”

O candidato presidencial que lidera as sondagens caso Lula não possa ser candidato demarcou-se também da defesa de intervenção militar. “Se tiverem de voltar [os militares], que voltem pelo voto”, disse, para não “dar essa bandeira para o PT dizer que foi golpe, porque aí foi golpe mesmo”, afirmou.

Para esta quarta-feira, a Frente Povo Sem Medo, dirigida pelo MTST de Guilherme Boulos, e a Frente Brasil Popular convocam manifestações no mesmo dia da greve dos petroleiros, pela redução do preço do gás e do combustível e em apoio às greves dos camionistas e dos petroleiros.

Artigo de Luís Leiria, para esquerda.net

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Jornalista do Esquerda.net
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