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Desmantelamento do Estado – Política Incendiária

Anos sucessivos de desmantelamento dos serviços públicos, particularmente sentidos no abandono do interior, são um fator decisivo na atual situação.

Na atual situação gerada pelos incêndios, observamos um curioso fenómeno. A direita e os seus numerosos comentadores de serviço, que durante anos repetiram a cassete de “menos Estado” e da privatização dos serviços públicos, lamentam agora a falta de capacidade de intervenção do… Estado.

Anos sucessivos de desmantelamento dos serviços públicos, particularmente sentidos no abandono do interior, são um fator decisivo na atual situação.

O desastre agroflorestal que vivemos foi obviamente agravado pelo desmantelamento Ministério da Agricultura. O encerramento de serviços, o desmantelamento de instituições e de serviços públicos, inclusive da Direcção-Geral das Florestas e de um corpo de 1500 guardas florestais, por força das teorias do “menos Estado”, deu um contributo decisivo para o atual caos.

Outra contribuição decisiva é o abandono do mundo rural, que nos é trazido pelas estatísticas das aldeias sem gente, sem vida. Na raiz desse abandono está a política de desmantelamento dos serviços públicos, de encerramento de milhares de escolas, de centenas de unidades de saúde, de postos de correio, de linhas de transporte público, o ataque à agricultura e pastorícia, bem como a destruição de milhares de postos de trabalho, que liquidaram o sonho de milhares de jovens de permanecerem nas suas terras e aí construírem família.

Obviamente só encontramos velhos para enfrentar os incêndios nas aldeias. Os novos não podem fazer outra coisa senão abandonar as aldeias onde a escola fechou (e os filhos teriam de fazer dezenas de quilómetros para chegarem à escola) porque se quer despedir professores, ou a estação dos CTT foi encerrada porque não dá lucros a uma empresa privada…

No dia em que começou o incêndio em Pedrógão Grande havia apenas dois militares num carro em patrulha e um outro no posto da GNR em todo o concelho. Dois homens no terreno era também o que estava disponível nesse fim-de-semana nos concelhos vizinhos de Figueiró dos Vinhos e Castanheira de Pêra. Como se podiam fazer as evacuações de aldeias, cortes de estradas e outras medidas imediatas que a situação exigia?

Desde fim de setembro foram dispensados os vigias da floresta, para obedecer para cortar mais umas décimas no orçamento, obedecendo às ordens de Bruxelas… os exemplos não teriam fim.

Aquilino Ribeiro foi preso pela PIDE, aos 80 anos, quando no livro “Quando os Lobos Uivam”, denunciou o início do caminho que nos fez chegar à atual situação. Como diz um dos personagens de Aquilino quando destruíram os baldios para neles implantar floresta, “a serra é nossa e muito nossa. Queremo-la assim, estamos no nosso direito. Desta forma é que nos faz arranjo. Os de Lisboa querem-na coberta de pinhal...? Semeiem pinhal nos parques e jardins onde têm empedrado e relva só pra vista.”

Sobre o/a autor(a)

Professor e historiador.
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