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Repressão em Angola: “A polícia veio para cima de nós com cães e bastões”

O Esquerda.net falou com Francisco Mapanda (Dago Nível Intelecto), que relatou a extrema violência de que foram alvo durante o protesto pacífico. O ativista deixou uma certeza: “Enquanto Angola não for verdadeiramente democrática, continuaremos a lutar”.
Foto retirada da página de facebook de Rosa Conde.

“Exigimos a demissão imediata do senhor Bornito de Sousa (…) Tendo em conta o nosso compromisso com a transparência do processo eleitoral, como uma das formas é evitar a fraude eleitoral, sairemos às ruas em protesto”, lê-se na missiva que os organizadores do protesto enviaram ao Governo Provincial de Luanda, a informar do protesto pacífico.

No Largo 1º de Maio, em Luanda, os ativistas angolanos foram impedidos de “exercer a sua cidadania”. Mais uma vez, a ditadura angolana foi implacável, respondendo ao protesto pacífico de forma extremamente violenta: os manifestantes foram agredidos com bastões e mordidos pelos cães da brigada canina.

O Esquerda.net falou via telemóvel com Francisco Mapanda (Dago Nível Intelecto), que nos relatou os acontecimentos na primeira pessoa. O ativista falou ainda sobre as suas expectativas no que respeita ao processo eleitoral e deixou um apelo: ““Continuem a estar desse lado a transmitir a informação tal como ela é”.

“A manifestação foi convocada por causa de uma situação que está a ocorrer aqui em Angola. Acontece que Bornito de Sousa é, ao mesmo tempo, o número dois da lista candidata do MPLA às eleições gerais, concorrendo assim ao cargo de vice-Presidente, e organizador das eleições, enquanto ministro angolano da Administração do Território. Nesse sentido ele é, simultaneamente, jogador e árbitro neste processo eleitoral”, explicou Dago Nível.

“Isto é eticamente errado! Queremos transparência, queremos eleições livres e justas. Temos de eliminar essa falta de ética na maneira de agir na política. Somos cidadãos, somos livres e a constituição dá-nos o direito de manifestarmos a nossa indignação perante este tipo de situações”, avançou.

Os ativistas convocaram a sociedade inteira, “muito através das redes sociais, e com a ajuda de alguns media alternativos”, a manifestar-se “contra esta situação, em que Bornito de Sousa é, ao mesmo tempo, jogador e árbitro neste processo eleitoral”.

Dago Nível descreve a repressão de que foram alvo:

“O que aconteceu é o que tem acontecido sempre aqui em Angola. Fomos exercer a nossa cidadania, como está previsto na Constituição angolana, e encontrámos um aparato policial que nos impediu de ter acesso ao largo. Entretanto, arrastaram-nos para a berma. Pedimos explicações, mas ninguém nos deu nenhuma explicação legal para o facto de nos estarem a impedir de exercer a nossa cidadania.

Fizemos finca-pé como forma de desobediência civil, porque ordens arbitrárias devem ser desobedecidas. Permanecemos no local e fizemos uma série de protestos: tínhamos levado apitos e cartões vermelhos, alguns ativistas estavam vestidos como jogadores de futebol e fomos dando cartões vermelhos a cada atitude incorreta da polícia. A essa altura ainda não estava lá a brigada canina. Os agentes da polícia que estavam presentes não conseguiam tirar-nos dali, porque não existia nenhuma explicação legal para proibir o protesto.

Entretanto, chegou a brigada canina e aí começou a violência toda contra os ativistas, que protestaram sempre de forma pacífica. Vieram para cima de nós com os cães e porretes para dispersar os manifestantes. Conseguiram quebrar o cordão humano que tínhamos criado à frente da polícia. O nosso protesto foi sempre pacífico. Esse é o nosso carácter, é o que nos motiva, é a paz, sempre foi. Muitas pessoas ficaram feridas durante a repressão. O Luaty Beirão foi mordido por um cão, como eu também fui. O Hitler Samussuku, que também fez parte do processo dos 17+2, foi ferido na cabeça com bastões. Partiram-lhe a cabeça e teve de levar alguns pontos. O Nelson Dibango também ficou com vários ferimentos. Muita gente foi agredida ao ponto de ir parar ao hospital, um deles um rapper que participou no protesto”.  

Questionado sobre se iriam continuar a lutar pela Liberdade e Democracia em Angola. Dago Nível deixou uma certeza: “Claramente que vamos continuar esta luta. Queremos uma Angola verdadeiramente democrática e continuaremos a lutar por isso”.

O ativista sublinhou ainda que em Angola se vive “uma ditadura, para a qual o simples facto de queremos exercer a nossa cidadania é um ato contra a soberania do país”.

No que respeita às suas expectativas quanto ao processo eleitoral, Dago Nível sinaliza que “não vê alguma possibilidade de existirem eleições livres e justas”.

“Porque estamos numa ditadura em que tudo está bem orquestrado é um sistema que acaba por controlar todos os setores. O facto de Bornito de Sousa ser, ao mesmo tempo, o número dois da lista candidata do MPLA às eleições gerais e organizador das eleições, e toda a participação da maquinaria política ligada ao MPLA no processo eleitoral, demonstram que a fraude já começou a ser arquitetada”, acrescentou.

No final da nossa conversa, Dago Nível deixou um apelo: “Continuem a estar desse lado a fazer o que podem quanto àquilo que é a transmissão da informação tal como ela é”.

 

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