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Financiamento partidário e isenções fiscais: fugiu-lhes o pé do chinelo!
I - O tema do financiamento dos partidos políticos e campanhas eleitorais é sempre um tema sensível nos debates parlamentares, desde logo por serem os visados de tal regime jurídico a tomarem as decisões.
Por isso, o debate em torno destas matérias deve ser feito de forma serena, franca e leal, não devendo resvalar nem para o populismo e muito menos para a gincana política. No debate de 27 de Outubro de 2016 não foi, infelizmente o que sucedeu.
O comportamento do Grupo Parlamentar do PCP no dito debate foi lamentável e desnecessário, cabendo aqui dizer que é legítimo e respeitável que o PCP se oponha a medidas neste âmbito, mas que já não é curial que se arrogue no direito de afirmar que o Bloco de Esquerda esteja a “cavalgar a onda que se vê por essa Europa fora dos movimentos de extrema-direita que atacam os partidos para atacar a democracia”. Ao Deputado João Oliveira fugiu o pé do chinelo com esta afirmação. E se foi por este motivo que o PCP votou contra a iniciativa legislativa do Bloco de Esquerda, a todo o Grupo Parlamentar do PCP fugiu o pé para o chinelo.
II - Para o Bloco de Esquerda sempre foi clara a necessidade de assegurar um financiamento dos partidos políticos e das campanhas eleitorais tendencialmente público, com vista a prevenir fenómenos de menor transparência e fenómenos de corrupção.
Por outro lado, e considerando que a recuperação de direitos e rendimentos não atingiu o patamar que o Bloco de Esquerda deseja (e creio que também o PCP o deseja), entendeu, e bem, o Bloco de Esquerda (aliás como também o PCP na sua iniciativa legislativa), que se deveriam converter os cortes temporários nas subvenções para financiamento dos partidos políticos e campanhas eleitorais em cortes definitivos, e bem assim quanto aos limites de gastos em campanhas eleitorais.
Mas o Bloco de Esquerda foi mais longe e, ao mesmo tempo que propunha a redução das subvenções, propunha uma ainda maior redução dos limites de despesas em campanhas eleitorais. Desta forma, reduzindo a despesa do Estado com as subvenções se garantia uma maior limitação do financiamento privado às campanhas eleitorais.
De igual forma a iniciativa legislativa do Bloco de Esquerda pretendeu ainda mais que os movimentos financeiros respeitantes a partidos políticos e campanhas eleitorais se processem por via bancária e com identificação dos intervenientes.
Já houve partidos que justificaram a origem de donativos com doadores de nome pitoresco como “Jacinto Leite Capelo Rego”, cuja fonética parece mais adequada a uma qualquer canção de Quim Barreiros, salvaguardando-se o bom nome do artista e o devido respeito por quem seja portador de tal nome.
Outros partidos tratam de se vitimizar sempre que se fala na necessidade de restringir os pagamentos em numerário, logo dizendo que tal medida é antidemocrática e que visa “impedir a realização da maior iniciativa político-cultural do País”.
III – Outro objectivo do Bloco de Esquerda, na sua iniciativa legislativa, era o de extinguir os benefícios fiscais dos partidos políticos em matéria de impostos sobre o património imobiliário (IMI e Imposto de Selo, futuramente substituído pelo adicional de IMI), bem como em matéria de Imposto Sobre Veículos.
O Bloco de Esquerda apresentou-se às eleições legislativas de 2015 com a proposta de acabar com várias isenções de IMI e, coerentemente, começou pelas anunciadas quanto aos partidos políticos para de seguida avançar para as restantes.
Por outro lado, a Proposta de Lei de Orçamento de Estado para 2017 contempla um adicional de IMI para patrimónios imobiliários elevados e ainda o aumento do Imposto Sobre Veículos.
O Bloco de Esquerda percebe a necessidade destas alterações como forma de garantir financiamento para a recuperação de direitos e rendimentos, acreditando eu que o PCP também entende e apoia estas medidas.
Aliás, o Deputado João Oliveira no debate parlamentar do dia 27 de Outubro afirmou que “O adicional do IMI vai fazer-nos muito provavelmente pagar mais impostos e não é por isso que não concordamos com ele”.
O que o Grupo Parlamentar do PCP não disse (ou nem sequer lhe ocorreu) foi:
i) Que o adicional do IMI não será aplicável aos partidos políticos, visto que a Lei de Financiamento dos Partidos Políticos e Campanhas Eleitorais continuar a manter uma norma que isenta os partidos políticos dos “demais impostos sobre o património previstos no n.º 3 do artigo 104.º da Constituição” - o artigo 10.º, alínea e) da referida Lei – isto para além da isenção de IMI sobre o valor tributável dos imóveis ou de parte de imóveis de sua propriedade e destinados à sua actividade, conforme o artigo 10.º, alínea d) da Lei de Financiamento dos Partidos Políticos e Campanhas Eleitorais;
ii) Que a iniciativa legislativa do Bloco de Esquerda, que mereceu o voto contra do PCP, previa a revogação também desse benefício fiscal do adicional ao IMI (curiosamente a iniciativa legislativa do CDS, partido conhecido pela sua aversão à proposta de adicional ao IMI, mantinha esta isenção aos partidos políticos).
Ao PCP bastava neste debate ter afirmado serenamente que os partidos políticos são merecedores, pela função que exercem, dos benefícios fiscais que dispõem e ter-se manifestado e votado contra a iniciativa legislativa do Bloco de Esquerda. Sublinhe-se que esta proposta não visava directamente o PCP ou o seu vasto património imobiliários. Era escusado ao PCP, através de João Oliveira, tentar colar a proposta do Bloco de Esquerda a propostas de movimentos de extrema-direita para defender o seu ponto de vista!
Mas pior, assumindo o PCP no debate parlamentar de dia 27 de Outubro que terá de suportar o adicional de IMI, não se compreende que tenha inviabilizado a extinção de um benefício fiscal que o desonera dessa obrigação contido na iniciativa legislativa do Bloco de Esquerda.
Fica agora o PCP obrigado a propor, pelo menos, a revogação do artigo 10.º, alínea d) da Lei de Financiamento dos Partidos Políticos e Campanhas Eleitorais ou, em alternativa, a propor que o mesmo não seja aplicável em sede de adicional de IMI.
Estou certo que o Bloco de Esquerda apoiará e aprovará semelhante iniciativa do PCP, com o respeito, ponderação e serenidade que faltou ao PCP para com o Bloco de Esquerda no debate do dia 27 de Outubro.
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João Oliveira tem ódio ao BE!
João Oliveira tem ódio ao BE! Isso é visível! É um daqueles homens fanáticos e cinzentos que encontramos no PCP. Felizmente já não são muitos! E na base, no povo, os trabalhadores habituaram-se a lutar juntos por uma vida digna e já não ligam a fanatismos! O BE mostra a sua classe ao não responder a estas provocações! O povo já está atento a estas tentativas para os dividir e não cai na esparrela! A luta entre os partidos de esquerda só é útil à direita! É claro que, no que respeita às isenções fiscais aos partidos, o PCP jogou e joga em causa própria, pelos seus interesses. O resto é a tentativa de o desmascarar com demagógicas aproximações do BE à direita extremista europeia que sabe muito bem ser uma falsidade que não lhe fica bem!
Caro Sr. Rui Costa,
Caro Sr. Rui Costa,
Gostaria de lhe chamar a atenção para alguns pontos:
1) O PCP já paga IMI e será abrangido pelo adicional de IMI pois detém património não afecto à actividade partidária (Quinta da Atalaia?): http://www.dn.pt/portugal/interior/pcp-abrangido-pelo-imposto-sobre-gran...
2) Em momento algum você se refere ao cerne da questão, ou seja, o que o fim da isenção de IMI para partidos políticos implica em termos de política/democracia local e da capacidade dos partidos de fazer chegar as suas posições à população e nesse sentido fazer valer a sua utilidade pública. Se o objectivo do BE é efectuar uma "revolução fiscal para acabar com a punição do trabalho", como é que o concilia com as dificuldades que o fim da isenção introduz na capacidade das pessoas se envolverem na democracia? Qual foi a ponderação? Será que o BE ponderou a redução do número de deputados no parlamento mas abdicou dela porque não traria fundos suficientes ao Estado? Se é justiça fiscal num sentido literal que o BE quer, porque não acabar com as isenções de hospitais, sindicatos, organizações sem fins lucrativos e outras? Como é óbvio, o fim da isenção fiscal a estas entidades traduzir-se-ia num decréscimo da qualidade da nossa democracia e do serviço às populações e minaria os próprios objectivos do BE. A questão que paira no ar é, portanto, porque motivo o BE propôs semelhante coisa e julgo que a intervenção do deputado João Oliveira vai nesse sentido.
Cumprimentos
Caro Senhor Pedro Magalhães,
Caro Senhor Pedro Magalhães,
Como deve compreender, enquanto jurista, não avalio as obrigações fiscais do PCP por artigos de jornal. Assim, importa esclarecer o seguinte:
1 - O PCP apenas está isento de IMI , sobre o valor tributável dos imóveis ou de parte
de imóveis de sua propriedade e destinados à sua actividade artigo (10.º, n.º 1, alínea c) da Lei de Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais);
2 - Assim, quanto aos demais prédios, o PCP não beneficia de isenção de IMI, sendo natural que pague IMI sobre esses prédios;
3 - Quanto aos demais impostos sobre propriedade, designadamente o futuro adicional de IMI, o PCP está isento, sejam os prédios destinados ou não à actividade partidária (10.º, n.º 1, alínea e) da Lei de Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais);
4 - Sobre as motivações do PCP não me cumpre pronunciar, nem pretendo fazer processos de intenção, como fez o Senhor Deputado João Oliveira relativamente à proposta do Bloco de Esquerda;
5 - No entanto, é certo que ao reprovar a proposta do Bloco de Esquerda, consciente ou inconscientemente, o PCP se subtrai ao pagamento do adicional de IMI em relação a todos os prédios de sua propriedade;
6 - A intenção do Bloco de Esquerda é clara: defendendo o Bloco de Esquerda o fim das isenções de IMI, começa por dar o exemplo propondo o corte das dos partidos políticos, avançando depois para outras;
7 - Mais uma vez reiterando que não me cabe mover processos de intenção, o que é certo é que a iniciativa legislativa do PCP propõe um pesado corte nas subvenções ao funcionamento dos partidos políticos mantendo o que mais o beneficia: a isenção de IMI.
Conclua como entender, perante factos insofismáveis.
Cumprimentos,
Rui Costa
Boa tarde Sr. Rui Costa,
Boa tarde Sr. Rui Costa,
Obrigado pela sua resposta.
Antes de mais, factos são factos, insofismáveis ou não. Como e quem os determina, já é outra questão. A sua (i.e., dos factos) interpretação, outra.
Embora não prejudique o seu argumento, creio que se terá equivocado, na alínea da LFPPeCE a que se refere o seu ponto 1: julgo ser a alínea d) e não a c) do Art. 10, número 1. Por outro lado, julgo que a imprensa tem um papel a desempenhar nesta e noutras áreas, nomeadamente dar a conhecer opiniões divergentes. Aparentemente, a peça no DN dá a entender (não o diz explicitamente, parece-me) que dois fiscalistas não são da opinião de que o PCP ou outros partidos ficariam isentos do adicional de IMI, excepto caso os imóveis sejam para fins industriais ou turísticos. Pegando ainda no seu texto, João Oliveira - salvo erro, licenciado em Direito - usa o termo "provavelmente", revelando alguma incerteza face a este ponto. Mais ainda, não sendo eu jurista e estando apenas em parte habituado a lidar com documentos deste género, não consigo perceber porque motivo o "adicional de IMI" não seria abrangido pela alínea d), Art. 10, número 1, (e não pela alínea e)) excepto se for considerado um outro/novo tipo de imposto - o que evidentemente não é, embora não me seja difícil imaginar o contrário caso se faça uma leitura legalista desligada da realidade objectiva do imposto.
Voltando ainda ao segundo ponto do meu comentário, ao qual me parece que você se esquivou (habilmente?), gostaria que me respondesse, enquanto membro/simpatizante do BE, a alguns pontos. Prevê algum efeito negativo da proposta do BE que cita sobre a actividade partidária em Portugal? O que aconteceria se o fim da isenção proposta se estendesse a outras entidades com utilidade pública? É ou não é verdade, que existe desde há muito tempo (Cavaco, Portas, etc) uma campanha de descredibilizar os partidos como agentes de mudança nas sociedades como se tivessem todos as mesmas responsabilidades por fracassos do passado? Qual a parte do espectro político que começou e continua a alimentar esse tipo de ideias? Porque motivo sente o BE que deve "dar o exemplo" para prosseguir com a sua "revolução fiscal"? Será a existência dessas isenções a causa das desigualdades em Portugal? Se sim, porquê? Caso contrário, não será isso cooptar narrativas da direita política? Não poderá a proposta ser interpretada como inconsequente ou teatro político destinado a garantir publicidade e não a resolver problemas estruturais no desenvolvimento do país? Obrigado pelo seu tempo.
Cumprimentos
Senhor Manuel Magalhães,
Senhor Manuel Magalhães,
Nunca é devido agradecer o estrito cumprimento de um dever, que neste caso foi dar-lhe resposta. Voltando a esse cumprimento de dever sou de dizer-lhe:
1 - Tem razão quanto à questão da isenção do IMI: está prevista no artigo 10.º, n.º 1 alínea d) da Lei de Financiamento dos Partidos Políticos e Campanhas Eleitorais e não na alínea c). Mas tem também interesse falar na alínea c), visto que a mesma isenta os partidos políticos do pagamento de IMT na aquisição de prédios urbanos para a sua actividade, benefício fiscal que a iniciativa legislativa do Bloco de Esquerda pretendia também extinguir. Mais um benefício fiscal para o rol...
2 - Quando ao adicional de IMI, a ser aprovado, este constitui um novo imposto sobre o património, autónomo face ao IMI, atendendo à diferente incidência e taxa definida autonomamente no Código do IMI e para o qual não relevam os benefícios fiscais. Daí que, a meu ver, caia na previsão do artigo 10.º, n.º 1, alínea e) da Lei de Financiamento dos Partidos Políticos e Campanhas Eleitorais.
3 - Quanto aos Benefícios Fiscais de IMI de outras entidades, estes encontram-se tratados no Estatuto dos Benefícios Fiscais, em especial no seu artigo 44.º, pelo que a sua alteração e eventual revogação não tinham cabimento na iniciativa legislativa do Bloco de Esquerda aqui em análise. E sim, é fundamental que se reveja o Estatuto dos Benefícios Fiscais onde se acoitam várias iniquidades fiscais!
4 - Como já ficou claro do texto inicial e das respostas fácticas que tive oportunidade de lhe deixar, o Bloco de Esquerda ao propor a redução das subvenções, fê-lo em valor mais considerável em relação às subvenções de campanha (35% a 40%) que às subvenções para funcionamento dos partidos políticos (em 10%) e, concomitantemente reduziu ainda em percentagem superior os limites de despesas de campanhas eleitorais. Esta medida privilegia o peso do financiamento público da actividade de campanha eleitoral (em 50%), apesar da redução do valor absoluto das subvenções.
5 - Já o PCP defendeu a redução do financiamento para o funcionamento dos partidos políticos em 40% (O Bloco de Esquerda, como referi, apenas defendeu 10%, tal como as restantes forças políticas). Ora, este financiamento é determinante para a actividade dos partidos políticos e é este mesmo que o PCP pretende ver drasticamente reduzido em 40%. Diga-me agora, Senhor Magalhães, quem aparenta ter uma deriva contra os partidos políticos?
6 - Mas pior, ao mesmo tempo que o defendeu a redução do financiamento para o funcionamento dos partidos políticos em 40% , usou esse argumento da veia populista para criticar quem defendeu o fim de isenções fiscais que sobretudo ao PCP aproveitam...
7 - Agora, a quanto à importância do financiamento público para a actividade dos partidos e da utilidade da mesma. Como o Senhor Magalhães já percebeu há muito, o Bloco de Esquerda nesta iniciativa legislativa teve isso em consideração. E já agora, convirá e reconhecerá o Senhor Magalhães que o Bloco de Esquerda agiu com sentido de justiça: é que o financiamento público aqui é reduzido para todos em apenas 10%, quando o PCP propõe 40%. Será que com este corte proposto pelo PCP se reconhece o papel e a utilidade da actividade dos Partidos Políticos? Não me parece. E muito menos me parece quando o PCP, que beneficia mais que qualquer outro partido das isenções de IMI tem nesta forma de financiamento por via de isenção fiscal um modo de se financiar pelo Estado independentemente da repartição do esforço público em função dos resultados eleitorais.
7 - Como já lhe disse, Senhor Magalhães, não venho aqui para mover processos de intenção ao PCP nesta matéria, porque se o pretendesse, a qualquer pessoa com uma inteligência média será fácil perceber quais seriam as consequências para o discurso e credibilidade do PCP. Vim apenas exigir do PCP serenidade e respeito. E se possível, uma atitude consequente.
Os meus sinceros cumprimentos e saudações Democráticas,
Rui Costa
Caro Sr. Rui Costa,
Caro Sr. Rui Costa,
Mais uma vez, obrigado pela resposta, mas devo referir que o meu nome não é Manuel.
Ainda em relação à suposta isenção de pagamento do adicional de IMI, acho bizarro que algo inscrito no "Código do IMI", em particular o "adicional de IMI" tal como refere, seja considerado um imposto diferente do "IMI" com todas as semelhanças que tem, para além do nome. Perdoe a minha ignorância mas há precedentes neste sentido? Se sim, quais? Por exemplo, o IMT tem o seu próprio "Código do IMT". Não deveria haver um "Código do adicional de IMI" para se aplicar a alínea e) do número 1 do art. 10 da LFPPeCE?
No que diz respeito à existência de iniquidades fiscais, não duvido que existam várias (ocorre-me o exemplo da banca) mas é necessário definir critérios que guiem o processo - em nome da justiça, transparência e isenção - caso contrário, estaremos a preparar o terreno para que se inscrevam disparates ao sabor do vento nas nossas leis, nomeadamente limites ao défice e à dívida na Constituição. Por exemplo, o CDS defende o fim da isenção de IMI para partidos e sindicatos mas exclui a Igreja enquanto o BE exclui os sindicatos mas não a Igreja, logo à primeira vista há aqui sectarismo QB. Qual foi o critério que um e outro utilizaram? No Manifesto Eleitoral 2015 do BE, defende-se a o fim da isenção de IMI para fundos imobiliários, Igreja(s?), partidos políticos e colégios privados como parte de uma "revolução fiscal para acabar com a punição do trabalho", o que parece ser coerente com a exclusão dos sindicatos - enquanto representantes dos trabalhadores - dessa lista. Contudo, o princípio subjacente é que a punição do trabalho se deve ao incumprimento do défice por sua vez devido à falta de pagamento de impostos, nomeadamente por parte dos visados pelo fim das isenções, o que é manifestamente falso - e é na verdade uma narrativa muito cara à direita portuguesa - mas que não explica porque motivo as restantes entidades com isenções não foram incluídas. Será que o fim das isenções para essas entidades não contribuiria para o fim da "punição do trabalho"? A resposta é óbvia e revela que ficou qualquer coisa por explicar. Logo, e a julgar pelo documento, o objectivo do fim das isenções selectivas não é simplesmente cumprir o défice através de uma revolução fiscal e também não é fazer uma reforma das isenções com base em princípios abrangentes, transparentes e que vão para além do momento presente. Em relação a este último ponto, e embora se trate de uma nova legislatura e exista uma nova direcção do partido, o BE não defendia alterações ao IMI em 2011 e agora defende, apesar da situação financeira do país ser alegadamente mais grave na altura.
Apesar desta lacuna, parece que tanto o PCP como o BE concordam que há situações em que a utilidade pública deve dar direito a isenções fiscais, de tal modo que nem um nem outro propõe o fim das isenções fiscais como tal. Aliás, a lista de isenções do IMI inclui, para além dos sindicatos, monumentos nacionais, prédios para o abastecimento de água às populações, associações desportivas e juvenis, instituições de segurança social, etc e estas entidades não mereceram a atenção do BE - e a meu ver bem. As divergências surgem, portanto, em relação às entidades que devem merecer essas isenções e porquê - terreno fértil para debate político, naturalmente.
Contudo, não acompanho alguns dos argumentos que refere nos pontos 4, 5, 6, 7 e 7(8) e considero mesmo alguns, com todo o respeito, falaciosos. Aliás, o mesmo argumento que o Sr. Rui Costa utiliza para dizer ou sugerir que o PCP age em interesse próprio ao votar pela manutenção das isenções de IMI a partidos políticos é o mesmo que o poderia levar a concluir que o BE apenas propõe o fim das mesmas porque o imposto só o afecta marginalmente - a julgar pelos valores referidos no artigo do DN - e portanto age para se beneficiar demagogicamente e em prejuízo de alguns partidos e da democracia em geral. Não creio que sejam estes os motivos num caso ou noutro.
Aliás, o alinhamento de uma posição política (como a manutenção do estatuto fiscal existente) e o interesse monetário de um partido político ou entidade não revela necessariamente algo sinistro e reprovável. É-o, contudo, quando entra em conflicto com os princípios ou objectivos desse partido/entidade, ou quando os objectivos em si são reprováveis. De outro modo, o mero acto de concorrer a eleições indicaria necessariamente um caso de oportunismo com vista à obtenção de fundos. Não me parece que tal seja uma posição defensável.
E será que não há princípios por detrás das posições assumidas por cada partido? Neste caso em concreto, o PCP não quer a isenção para si e outra coisa para os outros partidos, da mesma forma que o BE não quer o fim da isenção só para os outros, logo não existe uma tentativa de discriminar entre partidos - embora a proposta do BE tenha, em termos práticos, uma incidência diferenciada. A ausência de critérios bem definidos para o fim das isenções de IMI e outros impostos também é um factor que deveria inspirar apreensão. Por outro lado, a proposta para o fim das isenções de IMI para os partidos políticos iria punir necessariamente a actividade política e a sua utilidade pública de acordo com um critério que não atribui peso à mesma, caso contrário seriam definidas regras diferentes (por exemplo, seriam cobradas taxas mas inferiores às cobradas noutras situações). Mais, colocaria limitações grosseiras à manutenção ou expansão de actividades políticas junto das populações por esse país fora, nomeadamente longe dos centros urbanos. Um outro ponto de vista - válido a meu ver - referiria que as restantes actividades que actualmente não beneficiam de isenção também podem configurar utilidade pública e portanto também merecem essa isenção. Contudo, esse não é o argumento do BE: o BE propõe nivelar ao contrário, penalizando as entidades que beneficiam de isenção, e selectivamente pois não abrange todas as isenções. Ou seja, face a uma situação já de si injusta - pois não me revejo naqueles que romantizam o IMI como sendo uma ferramenta para a justiça social - o BE propõe estender a injustiça a mais alguns através de um aparente critério de equidade fiscal em sentido literal e portanto indiferenciado. Se é verdade que o Estado atravessa dificuldades financeiras - e é, também não deixa de ser verdade que a proposta do BE implicitamente atribui mais valor ao encaixe financeiro (estimado em cerca de 1 milhão de euros anuais...) e ao exemplo dado por tal medida do que à consequente penalização da actividade política. Logo, parecem existir vários motivos para rejeitar as alterações propostas pelo BE e não apenas um.
Também não o acompanho nas suas considerações sobre o financiamento estatal dos partidos e campanhas. Mais do que uma questão de números, interessam-me os princípios. Ambos os partidos concordam em reduzir a participação do Estado no financiamento dos partidos e campanhas mas não o seu fim. O BE privilegia o financiamento estatal dos partidos a partir de subvenções em detrimento do financiamento de campanhas. O PCP alegadamente fará o juízo oposto. Quais são as implicações de uma e de outra? Não tendo disponibilidade para calcular qual das propostas pouparia mais ao Estado, parece-me que há de qualquer modo implicações de uma e outra posição. As campanhas eleitorais são relativamente curtas e pontuais enquanto os partidos existem 365 dias por ano com despesas sensivelmente fixas (se excluirmos as campanhas). Se tanto o PCP como o BE concordam que o Estado não deve contribuir tanto para a actividade política, seja através de subvenções ou pagamento de despesas de campanha, faz algum sentido que se corte menos no financiamento das campanhas (despesas avultadas num curto espaço de tempo, que salvo erro requerem a realização de um empréstimo, e directamente relacionadas com os órgãos do Estado) do que no financiamento dos partidos (despesa sensivelmente constante ao longo do ano e sensivelmente proporcional ao número de membros de cada partido), que se pretende que seja tendencialmente realizado através dos seus membros. Por outras palavras, o Estado deve ter uma participação tendecialmente menor no normal funcionamento dos partidos (pois estes querem-se independentes e sustentáveis) do que no financiamento de campanhas directamente relacionadas com os órgãos do Estado (pois existe uma responsabilidade directa em garantir o financiamento). O caso oposto seria algo contraditório face ao princípio enunciado mas de qualquer modo, é uma questão quantitativa e não qualitativa. No entanto, admito que o corte proposto seja elevado e que talvez pudesse ser suavizado ao longo de várias eleições.
Evidentemente o corte de 40% nas subvenções também terá um efeito negativo sobre a actividade política em Portugal mas há atenuantes. Em primeiro lugar, não penaliza a actividade política de acordo com a maior ou menor proximidade à população, i.e., presença dos partidos ao nível local, o que deve ser valorizado. Em segundo lugar, o montante da subvenção não pertence a ninguém à partida, pois é atribuído com base nos resultados eleitorais, e irá prejudicar mesmo quem propõe o corte. Em terceiro lugar, é feito com base em princípios transparentes, iguais para todos e partilhados por quase todos os partidos. Em quarto lugar, é de fácil execução em comparação com o fim da isenção de IMI pois resolve-se na fonte.
Em suma, e para não me alongar mais, julgo que ambos os partidos podem e devem aprender com este episódio, e não necessariamente aquilo que os respectivos dirigentes referem.
Cumprimentos e continuação de bom trabalho
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