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Curdos da Síria avançam para a autonomia…
Os curdos estão em contra-relógio. Sem lugar à mesa nas negociações que decorrem em Genebra (por vontade da Turquia e contra a vontade da Rússia e, até, dos Estados Unidos), os curdos da Síria estabeleceram outras prioridades e tentam aproveitar o tempo e o contexto. A ausência de uma autoridade central na Síria, ou a sua absoluta debilidade, dá aos curdos a oportunidade que há tanto esperavam.
Esta quarta-feira, em Rmeilane, na província de Hassakeh, cerca de 150 representantes de partidos curdos, árabes e assírios, estiveram (e vão continuar) reunidos para definir as bases de um novo sistema de governo para o norte da Síria (a zona curda), entenda-se bases de administração autónoma curda. Para além dos cantões (províncias) de Afrin, Kobani e Jazeera, os curdos conquistaram território ao Estado Islâmico e pretendem agora unificar todo o território que controlam para exercer sobre ele uma administração que seja autónoma de Damasco. Um projecto de declaração já conhecido e que deverá ser divulgado esta quinta-feira, 17 de Fevereiro, refere que uma federação democrática será a única solução para garantir os direitos de todos os indivíduos. Paralelamente a este grito de autonomia, os delegados dizem que este primeiro passo não é um passo em direcção à independência, mas pode ser um exemplo para todo o território sírio.
Já se sabe que a Turquia não quer nem ouvir falar em autonomias curdas e não será de estranhar que um qualquer argumento justifique novos ataques curdos a zonas controladas pelas Unidades (curdas) de Protecção popular (YPG), o braço armado do Partido da União Democrática (PYD), que considera “terroristas”.
A reunião de curdos da Síria e o resultado esperado pode ser visto também como um aviso aos que estão em Genebra a negociar: é preciso contar com os curdos e eles estão dispostos a não deixar isso em mão alheias.
Os curdos controlam cerca de 10% do território sírio e cerca de 75% da fronteira sírio-turca e já falam abertamente de uma solução federal. Em Genebra Turquia e Síria já rejeitaram a ideia. O regime sírio responde que isso será um fracasso absoluto e vai provocar divisões entre os sírios; aTurquia concorda (porque tudo o que é bom para os curdos é mau para a Turquia) e já disse que considera a ideia inaceitável.
Seja como for, considerados pelos Estados Unidos como a força mais eficaz no combate ao Estado Islâmico, os curdos apresentam agora a factura dessa luta que travou o avanço dos fundamentalistas: querem administrar o seu próprio território.
Pinhal Novo, 16 de Março de 2016
josé manuel rosendo
Comments
Era tão bom que fosse tudo assim tão simples...
Pequenos apontamentos 1.O PYD é apenas uma facção curda (pró-PKK ou mesmo filiada no dito) entre outras. 2. O KDP é um partido curdo sírio pró-democracia e anti-PYD, que tem sido sistematicamente perseguido pelo PYD. 3. A região que o PYD pretende federalizar inclui muitas áreas de maioria árabe que têm sido objecto de limpeza étnica pelo PYD. 4. A maioria dos curdos são muçulmanos sunitas. 5. O PYD não é a força mais eficaz contra o IS: os rebeldes sírios expulsaram o Estado Islâmico de quase toda a Síria em 2013-2014, sem cobertura aérea dos EUA, ao mesmo tempo que eram atacados e bombardeados pelo Grande Timoneiro Assad. 5. Já existe na prática um Estado Curdo Independente: a Região Autónoma do Curdistão Iraquiano, que, vejam lá, por acaso tem excelentes relações comerciais e políticas com... a Turquia. 6. Há muitos curdos entre os combatentes do Estado Islâmico. 7. O PYD nunca promoveu eleições nas regiões que controla. 8. Em muitas zonas controladas pelos rebeldes Sírios a governança civil é assegurada por Comités locais eleitos pela população. 9. Há muitos curdos que combatem ao lado dos rebeldes sírios 10. etc., etc.
João Morais, grande parte do
João Morais, grande parte do que diz sobre os curdos sírios é completamente falso.
Em primeiro lugar, não existiu qualquer "limpeza étnica" dos territórios ocupados pelas milícias YPD/YPJ. As organizações de defesa dos direitos humanos que mais diretamente trabalham na Síria rejeitaram a existência de quaisquer provas dessas alegações, que foram muito provavelmente alimentadas pela propaganda do Daesh.
Em segundo lugar, existiram recentemente eleições livres promovidas pelo PYD. Mas foram apenas eleições locais, as eleições para os orgãos mais centrais ainda não tiveram lugar por questões logísticas e dificuldades relacionadas com a guerra contra o Daesh e a Frente Nursa.
O facto de existirem partidos políticos curdos que de distanciam do PYD deve-se à influência do Curdistão Iraquiano, cujas raízes ideológicas são sociais-democratas e defendem um Estado centralista como na prática estão a implementar no norte do Iraque, contra a vontade de Bagdade. Curioso que não faça referência à perseguição dos yazidis e seus dirigentes políticos e militares por parte das autoridades do Curdistão Iraquiano, que tentam a todo o custo suprimir os seus direitos à autonomia e a cultura. O PYD, por sinal, tem vindo a ajudar os yazidis a defenderem-se, ao mesmo tempo em que as minorias muçulmanas, cristãs, entre outras têm sido apoiadas e protegidas pelas autoridades dos cantões sírios.
Também me parece que a sua informação está algo desatualizada, uma vez que já não existe uma única força militar no Rojava, mas uma aliança curdo-arabe chamada "Forças Democráticas Sírias", onde estão filiados dezenas de grupos militares que outrora pertenceram ao "Exercito Livre Sírio" ou que operavam autonomamente e que reconheceram que os curdos eram a força mais eficaz no combate ao Daesh e outros grupos sectários e que defendiam os mesmos princípios democráticos que eles para a Síria.
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