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Que ninguém se afogue no Rubicão
Há três atitudes que se destacam entre os observadores ou ex-protagonistas (dos protagonistas tratarei noutro artigo ao longo da semana).
Há a demissão: não quero fazer parte disto, não contem comigo. É a atitude de Sérgio Sousa Pinto, e é nisso apoiado pelo dirigente da UGT, Carlos Silva, além do óbvio Luís Amado, que ainda estava no governo Sócrates e já defendia um acordo com o PSD, tal como Francisco Assis sempre o fez.
Há o ultimato: ninguém passa a soleira da porta sem jurar fidelidade. É a atitude de Paulo Pedroso. Escreve ele: “É certo que a campanha eleitoral não deu ao BE e ao PCP um mandato claro para renunciar à renegociação unilateral da dívida nem para comprometer estes partidos com metas políticas compatíveis com a permanência de Portugal no Euro.” Não têm “mandato claro” mas devem renunciar à renegociação “unilateral” da dívida (curioso subterfúgio, porque o autor nada esclarece sobre se deve haver “outra” renegociação da dívida e, já agora, a haver, qual seria). Não sei se Pedroso acredita que um governo sério tenha margem de manobra financeira com a dívida pública a 130%. Se sim, parece ingénuo e ninguém pode levar a mal. Se não, podia contribuir para a solução.
E há finalmente a atitude mais curiosa de todas: um acordo com a esquerda é a “receita para o desastre” e é “brincar com o fogo” mas vamos a isso, que é legal e constitucional e ai de quem disser o contrário, tanto mais que “um entendimento de governo com o PCP e o BE na hipótese de a direita não ter maioria absoluta estava desde o início na equação pós-eleitoral do líder do PS”. É a opinião de Vital Moreira e só passaram dois dias entre uma posição e outra. No meio, “O PS não pode casar-se com a extrema esquerda parlamentar nem amantizar-se com o governo de direita. Será que é preciso um desenho para explicar?!”. Sim, um desenho dava jeito.
Portanto, isto está confuso. Um protagonista sai e passa a observador porque não pode ser. Outro observador apoia se não se fizer nada que incomode a Europa. E o terceiro diz que sim e que não, mas está disponível para nos fazer um desenho.
Se o Rubicão for ultrapassado, que ninguém se afogue porque seria uma maçada.
Artigo publicado em blogues.publico.pt a 13 de outubro de 2015
Comments
F. Louçã
F. Louçã
Como penso que sabe, sou monárquico e social-democrata desde 35 anos atrás. Contudo votei BE.
O que se vai lendo e ouvindo a propósito da possibilidade, ou não, de se formar um governo à esquerda, tem muito que ver com estigmas, esses sim radicais e extremistas. O tipo de "abate de carácter" do BE foi muito presente nas campanhas pré-eleitoral e eleitoral, tendo como principal timoneiro o populista Paulo Portas, que devia estar antes preocupado com outras coisas mais importantes: os problemas do país e dos portugueses, e as soluções para os mesmos. É disso que todos precisamos.
Esta situação é aliás uma réplica do que uns senhores da Europa, numa postura muito agressiva neo-nazi - e é de lembrar que parte deles eram socialistas e social-democratas - fizeram face ao Siriza e o seu líder Tsipras, e portanto à Grécia e aos gregos: espremeram, espremeram para além de todos os limites, depois espetaram-lhe a agulha, e vampirizaram-lhes o sangue todo. E sem desculpa para se esquecerem que a Grécia foi durante décadas governada por dois partidos muito corruptos, que nunca se preocuparam com o país e o seu povo, e que propiciaram muitos negócios a países que com eles lucraram, desde logo a Alemanha. Nesses tempos não fizeram nenhum ataque àqueles partidos, pois o interesse era óbvio.
Mais travessia do Rubicão ou do Tejo, o importante é que tudo seja reflectido e executado com verdade, transparência e bom senso, e sem jogos ardilosos de baixo nível.
Ter capacidade de entender o "outro" como sendo esse outro alguém como nós próprios, com o mesmo respeito com que queremos ser tratados, é algo de fundamental. É um princípio de boa e sã convivência entre gente crescida que se espera que sejamos todos.
Cumprimentos,
Paulo Figueiredo
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