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O Syriza e o novo memorando
O Parlamento grego aprovou na madrugada desta quinta-feira novas medidas apresentadas pelo governo de Alexis Tsipras, seguindo as exigências da troika. Foi mais uma noite de ácidos debates em que a dúvida principal era se a rebelião de uma parte importante do grupo parlamentar do Syriza se manteria. Às 4 horas da manhã, a contagem verificou que apenas três deputados mudaram o voto em relação ao passado dia 16 de julho, havendo 36 deputados do Syriza que se recusaram a aprovar as medidas exigidas pelo ultimato da troika.
Numa discussão penosa de se acompanhar, o primeiro-ministro voltou a argumentar que não acredita no plano, mas que não havia outra alternativa senão assiná-lo para evitar o mal maior que seria o “Grexit” proposto por Schäuble ou a falência desordenada.
Esta segunda aprovação de medidas legislativas imposta pela troika apenas veio confirmar as palavras da presidente do Parlamento, Zoe Konstantopoulou, no debate anterior: “Se o Parlamento não resistir hoje à chantagem, voltará a ceder outra vez. Se legislar aceitando os ultimatos, fá-lo-á de novo, e ver-se-á forçado a fazê-lo muito em breve”.
Virão novas exigências, novos ultimatos
Quem julga que a Grécia entrará na normalidade porque o BCE voltou a aumentar a liquidez à banca grega, desengane-se: as negociações do terceiro memorando ainda estão para vir. E com elas virão novas exigências, novos ultimatos, novas humilhações. A procissão ainda está no adro, quanto mais não seja porque as contas do acordo não batem certo, “os seus dispositivos são atamancados e irrealistas” e “não têm nenhum sentido do ponto de vista económico”. Mas o garrote em torno da Grécia não vai afrouxar porque o seu objetivo não é resolver a crise. A sua lógica não é económica, é política: castigar o povo grego que ousou expressar a sua vontade, destruir qualquer vestígio do que significou a vitória do Syriza nas eleições gregas.
No debate desta quinta-feira, Tsipras reconheceu erros do governo nas negociações, sem os especificar. O erro maior, porém, parece quase consensual e foi resumido assim por Paul Krugman:
"Acreditaram que podiam simplesmente exigir melhores condições sem ter um plano alternativo", disse. "Nem calculei que pudessem tomar uma posição sem ter um plano de urgência".
Por não ter adotado desde o início as medidas que permitiriam jogar na mesa das negociações a ameaça real da saída do euro, Alexis Tsipras viu reduzida a cinzas a força que lhe deu o referendo, porque os líderes da eurozona ignoram com soberba qualquer pronunciamento do povo. Outra coisa não seria de esperar de uma instituição como o Eurogrupo que, como descobriu o próprio Varoufakis, não existe em termos legais, embora tenha o supremo poder de determinar a vida dos europeus sem prestar contas a ninguém.
Que armas tem o Syriza?
No debate desta quinta-feira, Alexis Tsipras defendeu que a troika teve uma vitória de Pirro, porque a Europa nunca mais será a mesma. Mas isto só será verdade se o Syriza abandonar a obediência à troika consignada no acordo, se recusar o papel de executor de um plano de massacre e humilhação da Grécia.
As medidas do ultimato vão provocar mais recessão a um país exangue. Isso é o que podemos dar como certo. Será que é possível contar com uma reestruturação da dívida que liberte recursos para voltar ao crescimento? Mas, depois de tantos meses de pseudo-negociações em que Schäuble sempre levou a melhor, alguém acredita nesta ideia? Ou não passa de uma perigosa ilusão?
Aceitar impor as medidas do ultimato da troika para supostamente impedir um mal ainda maior cria uma lógica de ferro que conduz ao descrédito do governo da esquerda e da luta contra o memorando, como apontou Zoe Konstantopoulou ao denunciar o plano do “parêntesis da esquerda”.
Essa lógica em nada ajuda também a esquerda europeia que luta contra a austeridade e se mobilizou em apoio à Grécia.
O Syriza foi mais forte quando convocou e venceu o referendo que rejeitou a austeridade. Foi essa a legitimidade maior que recebeu e é a essa a que deve ser fiel. É aí que vai encontrar forças para enfrentar a chantagem e os ultimatos.
Tirar as lições dos últimos cinco meses é rearmar-se diante da troika, apesar do tempo perdido, preparando minuciosamente o plano de saída do euro, para executar diante do próximo ultimato que inevitavelmente virá.
São medidas difíceis? São. Mas mais difícil é impor ao povo grego medidas brutais que se sabe de antemão que nada resolverão. O papel do Syriza não pode ser o de um benévolo feitor colonial, que aplica uma austeridade brutal tentando amenizá-la com medidas de distribuição dos sacrifícios. Esse seria o caminho da autodestruição. Porque o povo grego não precisa de mais sacrifícios; precisa de autodeterminação. Foi isso que o referendo mostrou, e essa demonstração de soberania de um povo não pode ser – nem será – esquecida.
Comments
Para resistir é preciso ter
Para resistir é preciso ter planos alternativos. E a maneira de evitar o pânico e a incerteza é discuti-los abertamente e ir ajustando.
Lendo o programa do BE aqui
http://www.bloco.org/media/manifestolegislativas2015.pdf
não encontro referências à necessidade de saída do euro ou da UE para poder aplicar as medidas que querem. O PCP tem uma ambiguidade semelhante.
O tempo voa. Mais do que discutir se os países devem ou não discutir a saída do euro como moeda única ou da UE é discutir os detalhes de como é que a transição será implementada.
coisas que podem ser feitas:
- criação de sistema bancário paralelo ao euro
- planeamento económico com vista à substituição de importações para estimular a economia local
- uso dos meios de comunicação para tentar condicionar os comportamentos de manada em pânico das pessoas (desencorajar corridas aos bancos, supermercados, etc.) e encorajar o uso da nova moeda local
Parece não haver dúvidas, o
Parece não haver dúvidas, o erro maior do Syrisa foi o de não ter plano B para aquilo que toda a gente atenta sabia que iria acontecer. Mas por que razão se menosprezaria a história recente das actuações da troika e pensaria que desta vez, talvez, a coisa fosse diferente. Será que Tsipras pensou que se não conseguisse conquistar Junker tinha ainda a possibilidade de Varoufakis conquistar Lagarde. Claro que não! Não existia plano B porque infelizmente o Syrisa nasceu e cresceu convencido de que o capitalismo é um mal menor e que basta um conjunto de boas vontades para transformar o inferno numa sauna saudável. Se assim não fosse a hipótese da saída do Euro estaria desde sempre na primeira linha das preocupações do partido, e o mandato recebido nas eleições, a acontecer, contava com essa hipótese e a estratégia seria muito diferente.
Vejo com agrado que, nos dias de hoje, também no Bloco se começa a ouvir falar da hipótese da saída do Euro. Reconheço que para qualquer partido de esquerda e responsável não seja fácil falar disto ao povo, porém, as circunstâncias actuais obrigam a que esta questão se discuta de maneira séria. Esta discussão implica outras bem profundas, ou antes se é que não se tinham apercebido, outras discussões implicam esta. Não podemos falar de nacionalizações ou controlo público da banca no quadro do Euro, assim como é impossível, neste quadro, falar de controlo público de sectores estratégicos da economia como a energia e as telecomunicações, por exemplo.
Comecemos desde logo a preparar o futuro. O caminho é longo mas apenas com esse mandato dado pelo povo esclarecido valerá a pena.
Quoque tu Luis?
Quoque tu Luis?
Preparar minuciosamente o plano de saída do euro?
Por mais minucioso e preparado que esse plano fosse, a sua execução em capitalismo, isto é mantendo as alavancas da economia nas mãos dos bancos, da burguesia grega e internacional, seria um desastre de proporções épicas.
A única alternativa é expropriar a banca e as principais alavancas da economia grega, repudiar a divida, romper com o capitalismo e tomar medidas socialistas.
Seria fácil? Não!
Mas, contaria com ao apoio entusiástico dos trabalhadores gregos, que tomariam o seu destino nas suas mãos, e dos trabalhadores europeus.
É por não ter esta perspectiva de ruptura socialista, é por pensar que poderia obter um "acordo honroso" com os mandantes do capital europeu e mundial que Tsipras acabou por capitular indo contra o mandato popular expresso nas eleições e no referendo. Lembremos que o propósito confesso de Varoufakis é de "salvar o capitalismo dos próprios capitalistas".
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