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Varoufakis: "Cimeira do Euro é o culminar de um golpe de Estado"

"A declaração da Cimeira do Euro de ontem de manhã lê-se como um documento sobre os termos da capitulação da Grécia". O Esquerda.net reproduz neste artigo as reflexões do ex ministro das Finanças sobre o comunicado emitido pelos chefes de Estado e de Governo da zona euro.

“Nunca antes a União Europeia tinha tomado uma decisão que mina de forma tão fundamental o projeto da integração europeia”, refere Yanis Varoufakis num artigo publicado esta terça-feira no seu blogue.

O ex ministro das Finanças acrescenta que "os líderes da Europa, com a forma como trataram Alexis Tsipras e o nosso Governo, infligiram um golpe decisivo contra o projeto europeu".

Segundo Varoufakis, o comunicado emitido pelos chefes de Estado e de Governo da zona euro esta segunda-feira "está pensado como uma declaração que confirma que a Grécia aceita converter-se num vassalo do Eurogrupo".

O Esquerda.net reproduz neste artigo as reflexões do ex-ministro das Finanças grego sobre a declaração da Cimeira do Euro sobre a Grécia:

"Sobre a declaração da Cimeira do Euro sobre a Grécia: Primeiras reflexões

Nas próximas horas e dias, vou estar sentado no parlamento a avaliar a legislação que faz parte do recente acordo da Cimeira do Euro sobre a Grécia. Estou ansioso por ouvir pessoalmente os meus camaradas, Alexis Tsipras e Euclid Tsakalotos, que passaram por tanto nos últimos dias. Até lá, vou reservar o meu julgamento sobre a legislação que temos perante nós. Enquanto isso, aqui estão algumas primeiras reflexões soltas suscitadas pela declaração da Cimeira do Euro.

Um novo Tratado de Versalhes ameaça a Europa – usei esta expressão na primavera de 2010 para descrever o primeiro “resgate” grego que estava a ser preparado naquela altura. Se a alegoria era pertinente então, agora, infelizmente, é muito mais pertinente ainda.

Nunca antes a União Europeia tinha tomado uma decisão que mina de forma tão fundamental o projeto de integração europeia. Os líderes da Europa, com a forma como trataram Alexis Tsipras e o nosso Governo, infligiram um golpe decisivo contra o projeto .

O projeto de integração europeia foi, de facto, fatalmente ferido ao longo dos últimos dias. E, como Paul Krugman diz, com razão, independentemente do que pensa sobre o Syriza, ou a Grécia, não foram os gregos ou o Syriza que mataram o sonho de uma Europa unida e democrática.

Em 1971, Nick Kaldor, conceituado economista de Cambridge, avisou que forjar uma união monetária antes de uma união política era possível, mas levaria não só a uma união monetária falhada mas também à desconstrução do projeto político europeu. Mais tarde, em 1999, o sociólogo germano-britânico Ralf Dahrendorf também alertou que uma união económica e monetária iria dividir em vez de unir a Europa. Todos estes anos tive a esperança de que estivessem errados. Agora, os poderes constituídos em Bruxelas, em Berlim e em Frankfurt conspiraram para dar-lhes razão.

A declaração da Cimeira do Euro de ontem de manhã lê-se como um documento sobre os termos da capitulação da Grécia. Está pensado como uma declaração que confirma que a Grécia aceita converter-se num vassalo do Eurogrupo.

A declaração da Cimeira do Euro de ontem de manhã não tem nada a ver com economia, nem com qualquer preocupação com o tipo de agenda de reformas capazes de tirar a Grécia do pântano. É pura e simplesmente uma manifestação da política de humilhação em ação. Mesmo que se deteste o nosso governo deve-se admitir que a lista de exigência do Eurogrupo representa uma rutura importante com a decência e a razoabilidade.

A declaração da Cimeira do Euro de ontem de manhã sinalizou uma anulação completa da soberania nacional, sem colocar no seu lugar um corpo político supranacional, paneuropeu e soberano. Os europeus, mesmo aqueles que não ligam nenhuma à Grécia, devem ficar atentos.

É gasta muita energia pelos meios de comunicação social sobre se os termos da rendição serão aprovados pelo parlamento grego, e, em particular, se os deputados como eu vão seguir a linha e votar a favor da legislação em causa. Não acho que esta seja a mais interessante das questões. A questão crucial é: será que a economia grega tem qualquer hipótese de recuperação sob estes termos? Esta é a questão que me vai preocupar durante as sessões parlamentares que se seguem nas próximas horas e dias. A maior preocupação é mesmo que uma rendição completa da nossa parte levaria a um aprofundamento de uma crise interminável.

A recente Cimeira do Euro é realmente nada menos que o culminar de um golpe de Estado. Em 1967, foram os tanques que as potências estrangeiras utilizaram para acabar com a democracia grega. Na minha entrevista com Philip Adams, na ABC Radio National’s LNL, defendi que em 2015 outro golpe estava a ser encenado por potências estrangeiras usando, em vez de tanques, os bancos da Grécia. Talvez a principal diferença económica seja que, em 1967, a propriedade pública da Grécia não tenha sido atingida, em 2015 os poderes por detrás do golpe de Estado exigem a entrega de todos os restantes bens públicos, para que possam ser colocados ao serviço da nossa impagável e insustentável dívida".

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