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Observador: o jornal da direita aflita

O “Observador” é um caso singular. É mais do que um jornal, pois assume campanhas que o campo austeritário marinou durante anos, mas não chega a ser uma plataforma política.

Em terreno dominado pela família Dos Santos, o “Observador” é um caso singular. É mais do que um jornal, pois assume campanhas que o campo austeritário marinou durante anos, mas não chega a ser uma plataforma política, como foi em tempos o “Independente” de Paulo Portas. Não que José Manuel Fernandes e David Dinis façam por desmerecer a fama de postilhões militantes da direita portuguesa, mas ao reconhecerem no atual governo a possibilidade histórica mais próxima do seu projeto, ficam com uma curta margem para se impor como feudo jornalístico e consciência crítica do seu próprio campo político.

Ainda assim, vale a pena lembrar. O Observador foi forjado a partir das vontades e tostões de:

Luís Amaral, ex-quadro da Jerónimo Martins.
António Pinto Leite, destacado advogado da MLGTS e presidente da Associação Cristã de Empresários e Gestores
António Viana Batista, membro da administração da Jerónimo Martins
Pedro de Almeida, dono da Ardma, holding do mercado de contentores, principal interessada na privatização da CP Carga.
João Fonseca, ex-diretor do Deutsch Bank e acionista de referência da Atrium, sociedade gestora de grandes fortunas.
Carlos Moreira da Silva, administrador da SONAE;
Duarte Schmidt Lino, sócio da maior sociedade de advogados em Portugal, a PLMJ
Duarte Vasconcelos, da Vasconcelos Arruda Advogados e ex-assessor de Oliveira e Costa (BPN) no Governo de Cavaco Silva.
António Champalimaud (filho), dono da Holdaco.
João de Castello Branco, sócio-diretor da McKinsey & Company (seguros) em Lisboa.
Pedro Martinho, administrador do grupo Eurocash (supermercados e distribuição na Polónia).
Filipe Simões de Almeida, administrador da Deloitte em Portugal.
João Talone, ex-administrador do BPN e EDP, agraciado por Cavaco Silva em 2006, atual emissário dos Rothschild em Portugal.
Jorge Bleck, sócio da Vieira de Almeida (advogados), principal sociedade contratada pelo Estado.

E na liderança desta constelação, que mais parece um simpósio de advogados reunidos à mesa do Pingo Doce, os inevitáveis Alexandre Relvas, Filipe de Botton, António Carrapatoso e Rui Ramos, quatro militantes do PSD que há 10 anos lançaram o Compromisso Portugal, plataforma de apoio à eleição de Cavaco e clube de elite da burguesia portuguesa. No total o “Observador” soma 3,2 milhões de capital próprio, um jornal diário exclusivamente online, num tempo de agravamento da crónica crise do jornalismo em Portugal.

Por tudo isto, quando por ocasião dos 40 anos da assembleia constituinte, o “Observador” lança uma campanha pública pela revisão da Constituição, percebemos ao que vem este jornal da direita aflita. A 6 meses das eleições, não se trata de impor um tema que a maioria não quer, que o PS dispensa e que Cavaco não dá suporte. Ainda por cima apresentada por cinco imberbes constitucionalistas. Do que a agenda liberal da direita radical não abdica é da falsa dicotomia entre a necessidade do regime de alternância, erigido pelo centrão, e o ajuste de contas com o passado, que dará passagem a uma sociedade livre do monstro do Estado. O biombo da revisão constitucional, que não chegará, decerto, nos próximos dois anos, cava a fronteira identitária enquanto a direita aproveita os último fôlegos do governo para acordar o essencial ao centro: privatizações e cortes, o letreiro mágico do Tratado Orçamental. A lei é dura, mas é lei.

Em tudo o resto, a luta do “Observador”, continua.

Artigo publicado no blogue Inflexão

Sobre o/a autor(a)

Sociólogo, dirigente do Bloco de Esquerda e ativista contra a precariedade.
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