You are here
Os outros contos para crianças
Passos Coelho tem razão: propostas fantasiosas para a resolução dos problemas do país e da Europa é coisa que deve ser denunciada como embuste. Decidiu chamar-lhe ‘contos para crianças’. Identifiquemos pois esses embustes lançados à sociedade portuguesa como promessas de salvação.
O primeiro é o da salvação do país pela austeridade. Há muito que todos sabemos que é um embuste. Não resolveu o problema magno da dívida – que aumentou; não resolveu o problema magno do desemprego – que aumentou; não resolveu o problema magno das fraquezas estruturais da nossa economia – que não cessam de se agravar pela falta de qualificações, pela má organização e gestão das empresas, pela corrupção de nível médio e superior. A historieta de que ‘os sacrifícios dos portugueses’ são o caminho para a salvação do país é um puro e desonesto conto para crianças.
Entretanto, António Costa veio clarificar a sua posição e a do partido que dirige acerca da renegociação da dívida: não equacionará sequer esta hipótese porque não quer ‘levar com a porta na cara’ das autoridades da União Europeia. Não contem com o PS para defender a renegociação da dívida, que fique pois claro. O que António Costa define como caminho é a ‘flexibilização’ da austeridade permitida, segundo ele, pelos planos de Draghi e de Juncker. Ora, diante da cada vez mais óbvia centralidade da dívida na definição do campo das políticas, esta tentativa de fazer passar um futuro governo do PS por entre os pingos da chuva não é outra coisa senão a escolha clara de um campo concreto: o da manutenção do essencial das políticas que nos conduziram aqui. O resto é… conto para crianças.
Por ser assim, quem anuncia querer pôr na agenda política a renegociação da dívida e, em simultâneo, afirma que não haverá governo de esquerda sem o PS, está a centrar o seu compromisso político com o país numa coisa e no seu contrário. Se era necessário, a rutura provocada no quadro da austeridade europeia pela eleição do Syriza mostra que a tarefa histórica hoje assumida pelos partidos social-democratas oscila entre o alinhamento pleno com o campo da austeridade e a tentativa de trazer os protagonistas da rutura para o compromisso das ‘reformas estruturais’. Ou seja, a tese de ser necessário puxar os social-democratas para a esquerda virou ao contrário: são os social-democratas que se oferecem para puxar a esquerda anti-austeridade para a direita. Por ser assim, querer casar a renegociação da dívida com uma aliança de governo com o PS é um conto para crianças.
Comments
Não sei se já reparou que o
Não sei se já reparou que o Syriza está coligado com um partido de direita eurocético e nem por isso está a trair as suas promessas eleitorais. Esta pequena política de ataquezinhos a quem tem propostas próximas (Livre/tempo de avançar) é um bocado ridícula. Como na Grécia o que interessa são os resultados concretos dos acordos políticos (nomeadamente com o PS). Já agora, as grandes conquistas do Bloco foram feitas com quem (despenalização do aborto, casamento gay, bloqueamento das leis inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional)?
Caro cidadão, há um equívoco
Caro cidadão, há um equívoco no seu comentário. Eu não defendo nenhuma aliança de governo com o Partido Socialista. Por isso não estou próximo de quem a defende. E, por isso, não estou a lançar nenhum 'ataquezinho a quem tem propostas próximas'. Eu estou próximo de quem defende coerentemente a renegociação da dívida como nó górdio da política portuguesa. E, sinceramente, não vejo como se pode defender coerentemente a renegociação da dívida e, em simultâneo, defender uma aliança de governo com quem a repudia por recear 'levar com a porta na cara' e anulará qualquer possibilidade de renegociação da dívida quando for força hegemónica da governação.
É possível divergir sem
É possível divergir sem falsificar as posições dos outros. A proximidade a outras forças de esquerda a que me referia eram, nomeadamente, reestruturação da dívida, fim da austeridade, defesa do estado social (saúde, escola e segurança social públicas), fim das privatizações, defesa da Constituição. Assinalo que a afirmação relativa à aliança do Syriza com um partido de direita não mereceu nenhum comentário por parte de José Manuel Pureza.
Muito bem, falemos então da
Muito bem, falemos então da coligação de governo na Grécia. Ela dá razão ao argumento que lhe referi. Porque foi feita entre duas forças, que sendo muito diferentes (radicalmente nalguns pontos), perceberam ambas que a renegociação da dívida é o centro da política, é a questão a que não se pode deixar de dar resposta. É uma aliança de governo, entre duas forças com assentos parlamentares suficientes para formar governo maioritário e que se fixa como tarefa indeclinável a de renegociar a dívida para recuperar os direitos das pessoas. Poderia o Syriza ter escolhido outros parceiros de aliança, mas não o fez porque nenhum outro dava garantias de plena firmeza na questão essencial: a renegociação da dívida. Isto dito, o que se coloca neste momento em Portugal é que, diante das declarações muito claras e reiteradas do Secretário-Geral do Partido Socialista, fica claro que qualquer governo liderado pelo PS não equacionará sequer qualquer renegociação da dívida portuguesa e manterá portanto inevitavelmente o essencial desta governação. Quem se compromete a uma aliança de governo com o PS sabe ficar refém dessa condição. Por isso, podem diferentes forças ter ideias próximas mas se uma delas anuncia disponibilidade para acordos de governo com uma terceira que nega o essencial dessas posições comuns entre as duas primeiras, a proximidade fica no etéreo das semelhanças e de nada valerá.
É possível divergir mas sem
É possível divergir mas sem faltar à verdade. O PS fala de Estado Social mas coloca em causa a sua Sustentabilidade com a Privatização de tudo o que dá lucro e nacionalização do que dá prejuízo ao Estado (Vidé BPN), E com a continuação da austeridade imposta de fora, sacrificando o desenvolvimento económico do país e aumentando a dívida. O que é um autêntico embuste. Não tenho mandato para defender o Syrisa, mas a aliança com um partido nacionalista anti austeridade foi uma medida estratégica de longo alcance para garantir a maioria e neutralizar oposição. Bem visto!
Não sei se já reparou que há
Não sei se já reparou que há uma diferença entre um partido ser maioritário e ser minoritário: o maioritário é que, em princípio, dirige o essencial da política. Uma coisa é um partido "à esquerda do centro" ser maioritário e levar a reboque um partido menor, seja ele de onde for; outra, muito diferente, é uma partido do centro, como o PS, levar a reboque um partido menor. Se outra demonstração fosse necessária, bastaria questionar: qual foi a real influência do CDS na política do actual governo? E não vou bater mais na ceguinha de o Syriza estar "mais próximo" do To Potami: no panorama político grego, quem é que na sua acção política passada e presente dá mais garantias de fidelidade ao compromisso central e prioritário que está na base do programa eleitoral do Syriza: fim da austeridade, fim das negociações com a troika, governo da Grécia por gregos e tendo como prioridade máxima os interesses do povo grego?
Sei que há muita gente boa no PS. Observo com interesse e curiosidade o trajecto de António Costa. Mas temo que neste PS triunfe a lógica do funcionamento eurocrata: as coisas vão-se fazendo, em especial quando não se pode evitar de as fazer, quando já não é possível olhar para outro lado. E quando se vai fazer, é com tempo, com "cimeiras", com "calendários", etc. E entretanto, quem está sem segurança social, sem assistência na doença, sem assistência no desemprego, que se lixe! Este é o modo de agir "politicamente correcto" dos que se dizem"europeistas": uma forma diferente de pensamento único; mas também uma forma de pensamento único, em que a Democracia manda menos e a intriga e os jogos de forças mandam mais. Não estou convencido que o PS se tenha desvinculado deste modo de operação que dizem "pragmático" (no meu dicionário, esta política de tomar decisões à medida dos acontecimentos tem outro nome: oportunismo). Não estou convencido que este PS esteja firmemente decidido a reivindicar os fundamentos originais, a essência, dos tratados que criaram a União Europeia (porque, no fim de contas, é esta a essência do programa político do Syriza: extremismos e radicalismos só existem na "informação" bem pensante e obediente ao pensamento único dominante). E não estando convencido destas coisas, acho muito perigoso que alguém verdadeiramente de esquerda, "não pragmático", se ponha debaixo e a reboque deste PS.
Como disse, espero com curiosidade para ver qual é a oferta que o PS faz aos que estão à sua esquerda...
Caro José Manuel Pureza
Caro José Manuel Pureza
De facto você não dorme em serviço. Como já se previa, com o aproximar das próximas eleições, as correntes periféricas da esquerda de confiança (chamemos-lhes sociais democratas de esquerda), apressaram-se a consolidar posições para a disputa eleitoral, sem nenhum sinal de unidade com o Bloco de Esquerda, mas com a ansiosa vontade de construir a a tal alternativa com o PS. A curto prazo poderão até polarizar alguns apoios, e com isso retirar alguma vantagem à verdadeira alternativa à esquerda. Mas a breve trecho vão ter de admitir que mais depressa vão ser absorvidos pelo PS, (não quero dizer que esse seja o desejo de todos, mas dalguns não tenho muitas dúvidas). A recente vitória do Syrisa mostrou que a alternativa se ganha na defesa intransigente das questões centrais, e não na esperança de que o aliado ceda posições sem acordo prévio. Todos sabemos no que resulta deixar ao PS a tarefa de olhar pelos interesses do Povo e das classes mais desfavorecidas. Que vão dizer? Que o PS de Costa não é o Pasok. Pois , pois...
Procurar o caminho fácil, de alianças a qualquer preço levam inevitavelmente à derrota.
Como já aqui defendi, mesmo nas situações mais difíceis é vital não perder as convicções. Não vale radicalizar à esquerda quando é fácil e está na moda, nem procurar aconchego ao centro quando a luta é mais difícil.
um abraço
Paulo
"Renegociar a dívida" e "não
"Renegociar a dívida" e "não há governo de esquerda sem o PS" - duas coisas aparentemente contraditórias. A verdade é que não é possivel de facto em Portugal, hoje, governo de esquerda sem o PS. Mas… será este PS um partido da esquerda em que pensamos? Talvez se tenha de começar por clarificar de vez essa coisa da "esquerda", isto é, ler nos movimentos de cidadãos na Grécia, Espanha, etc que as vitórias importantes que estão conseguindo se fazem, em grande parte, ao lado das ideologias. É bom, é mau? Neste momento surge apenas como uma possibilidade inevitável. As lutas têm etapas. Uma etapa importante em Portugal passa pela efectiva clarificação dentro do Bloco e por não ter grandes ilusões sobre a nossa permeabilidade à realidade grega. Calma, rapazes, como dizia o outro, não é o fim do mundo, é apenas um pouco tarde...
Há um grande bloco central
Há um grande bloco central que entretanto foi divido para que outrem (não democrático) pudesse reinar. No essencial, o Senso Comum é um bolo enorme da sociedade que concorda nos pontos essenciais. Querem uma sociedade livre, justa, segura, assente no mérito, com alguma (não muita) proteção estatal. As grandes diferenças entre PS e PSD foram instigadas por quem quer separar para reinar.
O que é o PSD?
PSD = PS + D , ou seja, PSD é o PS da Direita.
O que é o PS?
PS = PSD - D , ou seja, o PS é o PSD sem o centro Direita, ou seja, é um PS no centro-esquerda.
A Direita é o PSD menos o PS.
D = PSD - PS
Isto é pura matemática, que por acaso até joga bem com o alfabeto em português. Trata-se também de alguma inteligência necessária para conseguir descortinar o problema que se abre à nossa frente.
Resulta que
Senso Comum = Centro, e que,
Centro = Centro Esquerda + Centro Direita
Então, sendo o todo = 1, temos que,
1 = Centro + flancos <=>
1 = Centro (Esquerda + Direita) + Extrema (Esquerda + Direita)
Assim, se o problema reside num Bloco Central, composto por PS + PSD, com o qual ambos se encontram profundamente comprometidos, a solução poderá muito bem ser tentada através dos flancos, também conhecidos por radicais (esquerda + direita).
1 - Senso Comum (Esquerda + Direita) = Flancos (Esquerda + Direita)
1 - Bloco Central (PASOK + Nova Democracia) = Extremos (Syriza + Nacionalistas Gregos)
Foi precisamente esta a fórmula encontrada na Grécia, quer pelo resultado dos votos na Estrema Esquerda do Syriza, quer na aliança que este veio a fazer com a extrema direita nacionalista para garantir uma maioria absoluta, que lhes permita uma "confortável" governação.
A seguir a mesma fórmula em Portugal, teremos que ter a seguinte equação:
1 - Bloco Central (Esquerda + Direita) = Extremos (Esquerda + Direita)
1 - (PS + PSD) = )PCP + Bloco Esquerda + Livre + Verdes) + (Nacionalistas da Estrema Direita)
Tendo a extrema esquerda a vencer por votos e a extrema direita a subir ao poder por necessidade de garantir uma maioria absoluta que permita governar sem concessões, obrigatoriamente negociadas com o bloco central.
Isto caso acontecesse em Espanha, Portugal, Itália e Irlanda uma exata fotocópia do episódio legislativo grego, o que todos sabemos que estas coisas não se repetem assim, a "papel químico".
A experiência grega, mostra-nos antes de mais que... há que manter o espírito aberto para o que no passado se julgava impossível. E outra lição ainda... que está na altura de focarmos mais a nossa atenção nos que nos une, em vez do que nos divide, como tem sido triste apanágio do nosso passado coletivo.
Digo eu.
Rui M.F. Nascimento
Mas de que fala, Pureza?
Mas de que fala, Pureza? De um programa revolucionário, para a actual situação ou da capacidade de defender as pessoas, o estado social, a democracia...? As posições do BE estarão quando muito ao nível da social democracia do pós-guerra! Quem serão os actuais sociais democratas? Será que terá importância uma discussão nestes termos? Não será um discurso de fraqueza e de quem caminha para o isolamento suicida? A grande questão talvez esteja noutro lado, na definição dos caminhos que possam mobilizar amplos sectores populares suficientes para se oporem à austeridade, à destruição do estado social e pela defesa da liberdade e da democracia, acreditando nas pessoas, afinal as únicas que poderão levar a cabo esta luta? E para isso que forças podemos unir? Que poderemos aprender com as enormes derrotas dos últimos 7 anos? Que poderemos aprender com a minagem de todas as formas de organização que fujam ao controlo burocrático? Será que não foi esse o caminho do Syriza? Quantos grupos se uniram à volta da liderança de Tsipras? Será que nos falta confiança, coragem e liderança para uma defesa aberta de uma plataforma mínima de luta contra a troika e a europa da austeridade, sob a qual todos e todas seriam bem vindos? Sim , a unidade das forças de esquerda é necessária e precisa da coragem de quem está seguro do que defende, para poder saber fazer as pontes fundamentais à sua construção. A esquerda alternativa fragmentada e atacando-se entre si, quantas vezes cobardemente, está a cavar a sua própria sepultura. Não será digna dos valores que defende!
Add new comment