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Eu não Rio

Hoje sabemos que quem gritou bem alto “Eu não Rio” contra a decisão de entregar o Rivoli a Filipe La Feria acertou em todas as suas mais negras previsões.

Quando Rui Rio chegou à Câmara do Porto afirmou: nem mais um tostão para a Cultura enquanto existirem bairros degradados. E no mesmo ano cortou os apoios a todos os projectos culturais da cidade e a todas as associações e equipamentos dos bairros sociais. A mentira demagógica era óbvia mas foi colando. Dizia-se (diz-se ainda, como é possível?) que este é um homem sério a pôr as contas da cidade em ordem…

Dos bairros sabemos a história: perseguições aos habitantes, despejos cruéis, autênticas deportações de famílias de um lado para o outro da cidade e os bairros cada vez com menos equipamentos, cada vez mais guetizados, cada vez mais destruídos. Em tempo de eleições pintaram-se algumas fachadas, deixando o interior com pias em vez de chuveiros e a humidade a comê-los. A sensibilidade social de Rui Rio é a mesma dos especuladores imobiliários ávidos dos terrenos do Aleixo com vista para o Douro ou tremendo de excitação com a expulsão dos indesejados dos terrenos em volta dos dois únicos parques verdes da Cidade. Só não vê quem não quer.

E quanto à cultura? Bem, a primeira opção foi silenciar a criação artística da cidade e trocar cultura por entretenimento. Acabaram os apoios aos criadores, mas também a agenda cultural ou o apoio logístico à itinerância. E depois vieram as corridas de carros, com milhões em obras e destruindo até uma futura linha de metro, vieram os aviões malabaristas e os milhões na pista já sem uso e, claro, foi-se o Teatro Municipal. Os agentes culturais avisaram: é um atentado cultural e um negócio ruinoso. A autarquia prepotente impôs-se, o Governo encolheu os ombros.

Hoje a segunda cidade do país não tem Teatro Municipal. Já não tem há vários anos; quem pode chamar teatro municipal, que é por definição a casa de artes da pluralidade que é a cidade, a uma sala de espectáculos refém de musicais anglo-saxónicos dos anos 70? Mas hoje sabemos mais: sabemos que quem gritou bem alto “Eu não Rio” contra a decisão de entregar o Rivoli a Filipe La Feria acertou em todas as suas mais negras previsões. O Rivoli é agora uma sala destruída e a cidade foi saqueada.

Filipe La Feria teve apoios estatais como nenhum criador tem. Ganhou milhões em bilheteiras pré-compradas, arrecadou os patrocínios que eram para a cidade, e teve direito a fazer o que queria – sem pagar um tostão e sem nada preservar (até a concha acústica foi arrancada e apodrece agora em pedaços num armazém!) – num dos imóveis mais caros da cidade. E agora sai, deixa para trás dívidas, um teatro escavacado, uma cidade mais pobre. Mas entendamo-nos: ninguém elegeu La Feria para governar os destinos da cidade. O responsável é Rui Rio. Eu não Rio!

Sobre o/a autor(a)

Dirigente do Bloco de Esquerda. Atriz.
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