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A peste do trabalho forçado

Só nas autarquias, os "contratos de emprego-inserção" submetem 20 mil desempregados.

Os Contratos Emprego-Inserção (CEI) são uma forma de trabalho em funções públicas, obrigatória e sem remuneração. É trabalho imposto a quem, por direito, recebe subsídio de desemprego, mas que o perderá se recusar um trabalho diário pago com uma “bolsa” de 84 euros mensais.

O subsídio de desemprego é um direito que resulta de prestações pagas por quem trabalha. A imposição do CEI, através dos centros de emprego, a pessoas que foram despedidas, significa que o acesso ao subsídio de desemprego passa a ser condicional. Para justificar esta aberração, funciona um mecanismo ideológico simples: a proteção social deixa de ser um sistema público com regras, tornando-se uma esmola que deve ser “merecida”. Nas palavras de um representante do PS na Assembleia Municipal de Loures, “o trabalho dignifica”.

Este abuso suplementar, cometido sobre quem já perdeu o emprego, é uma mentira integral. Não é um contrato - nada liga o desempregado à entidade que beneficia do seu trabalho gratuito pelo máximo de um ano; não é um emprego, está visto; e não promove a inserção das pessoas envolvidas, que serão abandonadas ao fim de um ano de ultra-precariedade, desempregadas como antes - e talvez ainda mais pobres.

Os CEI são o sonho da sobre-exploração, tornado real por um Estado que persegue as vítimas da política da troika. Ao mesmo tempo que mudam a regra de atribuição do subsídio de desemprego, os CEI são um paliativo para as dores da austeridade na administração pública. E contam com um promotor de peso: autarquias de todas as cores.

A troika proibiu novas contratações na administração central e local, ordem que o governo seguiu com zelo. Essa limitação instala o caos em numerosos serviços, causa riscos graves e desastres. Com maior ou menor adesão ideológica à dignificação pelo trabalho forçado, os CEI são uma alternativa barata à falta de pessoal. Auxiliares e administrativos em escolas, operadores em serviços municipais de água e saneamento, “inseridos” nos mais variados organismos públicos e até na própria Segurança Social. O grande cliente são as autarquias, que agarram hoje 20 mil pessoas em regime CEI, quase metade do total nacional. A administração central é o segundo na fila, com um quarto das “contratações”, seguindo-se as IPSS.

Em Loures, onde sou candidato do Bloco de Esquerda à vereação, a Câmara recorre abertamente ao trabalho forçado de desempregados para suprir necessidades permanentes, para as quais deve haver um quadro de pessoal normal. O Bloco propôs na última reunião da Assembleia Municipal no mandato 2009-2013, um compromisso de todas as forças para terminar com o recurso aos vergonhosos CEI. O Partido Socialista, o PSD e o CDS recusaram a proposta do Bloco, todos com razões igualmente aberrantes. Apenas a CDU se comprometeu com o fim deste escândalo em Loures.

Tenho insistido durante a campanha que o combate político nas autarquias não se distingue do combate político nacional. Não só porque estas eleições podem servir para enfraquecer o governo, mas sobretudo porque - como bem ilustra o caso dos CEI - a esquerda tem que assumir nos municípios todas as ruturas que implica a resposta à troika, ao seu governo e à barbárie que se generaliza.

Sobre o/a autor(a)

Dirigente do Bloco de Esquerda. Jornalista.
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