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Desastre ferroviário na Galiza: Peritos sustentam que o maquinista não é o único responsável

Os presidentes da Adif e da Renfe, as empresas responsáveis pela gestão ferroviária espanhola, e também o governo de Rajoy têm culpado o maquinista do comboio de ser o único responsável pelo desastre ferroviário de Santiago de Compostela. Técnicos independentes e da Renfe dizem que o maquinista não pode ser o único culpado. Técnicos falam em defeitos da linha dos caminhos de ferro e no sistema de sinalização da via.
Francisco José Garzón Amo, maquinista do comboio do acidente trágico de Santiago de Compostela foi acusado de “homicídio por imprudência”. Técnicos assinalam outras responsabilidades e frisam que as empresas que gerem a ferrovia em Espanha “não podem agarrar-se só à perícia do maquinista porque todos somos humanos e podemos cometer erros no nosso trabalho”

O presidente da Adif (Administración de Infraestructuras Ferroviarias), Gonzalo Ferre, declarou à Efe que o maquinista devia reduzido a velocidade quatro quilómetros antes do local do acidente. O presidente da Renfe, Julio Gómez-Pomar, disse à Antena 3 que o maquinista tinha circulado 60 vezes no local, tinha um conhecimento “exaustivo” da zona e sabia perfeitamente que tinha um traçado em que tinha de conduzir a 80 km por hora.

O maquinista, Francisco José Garzón Amo de 52 anos, foi acusado de “homicídio por imprudência” pela polícia e o ministro do Interior de Espanha, Jorge Fernández Díaz, declarou à comunicação social que “o maquinista está detido, porque há indícios racionais da sua responsabilidade”.

A ministra do Fomento do governo Rajoy, Ana Pastor, foi mais longe e afirmou: “Os sistemas de segurança na Europa e em Espanha estão adequados em cada momento aos tipos de comboios e à velocidade permitida e há protocolos definidos pelos técnicos. E é a essa definição e a esses protocolos que se têm que ater as pessoas que que têm a responsabilidade de estar à frente de um comboio”.

No entanto, as questões não são como a ministra diz e técnicos franceses apontam falhas graves à rede de caminhos de ferro de Espanha.

O site publico.es cita a cadeia colombiana NTN24, que contactou técnicos franceses. Esses técnicos apontam defeitos à rede de caminhos de ferro de Espanha, salientando nomeadamente o material dos comboios e a “obsoleta” sinalização das vias.

“Esse choque foi muito violento, mas o comboio teve a enorme sorte de ter tocado no muro, porque foi ele que o parou e seguramente evitou que o número de vítimas fosse maior. De outra maneira, teria explodido porque são vagões ligeiros construídos em alumínio”, diz Michel Chevalente, perito em engenharia ferroviária. Este perito denuncia ainda que “a sinalização está feita à antiga, onde se a velocidade não é respeitada pelo maquinista, não há travões externos que sejam ativados”.

Técnicos da Renfe, consultados pelo site cuartopoder.es sob o compromisso de confidencialidade, salientam um princípio básico de segurança neste tipo de comboio: não depende exclusivamente das pessoas, mas também da tecnologia.

Em entrevista ao site publico.es José Moreno, técnico de comboios, considera que “o acidente podia ser evitável”. Este perito diz que “a linha de alta velocidade Ourense-Santiago está construída sobre uma infraestrutura de alta velocidade com dois tipos de exploração diferente: a de alta velocidade e a convencional, que não dispõe da largura internacional”. Foi no ponto em que o comboio começa a circular na secção convencional que se deu o acidente trágico. Moreno diz que “esta mistura” se pode qualificar de “experiência” da Renfe.

José Moreno fala também de outra das possíveis causa do acidente: a falha nos sistemas de segurança que afetam a travagem automática e a sinalização das vias. “Em Espanha existem dois sistemas deste tipo: o ERTMS [European Rail Traffic Managemegent System] e o ASFA [Aviso de Señales y Frenado Automático]”, diz Moreno. "O primeiro atua enviando informação contínua, em cada segundo, ao condutor do que vai encontrar nos 30 quilómetros seguintes que o comboio deve percorrer e atua tanto na condução manual como na automática", detalha. "O segundo, o ASFA Digital, atua sobre a sinalização da via: o maquinista é avisado do próximo sinal que vai encontrar e, se o semáforo está vermelho e o condutor não trava, ativa a travagem automática", continua Moreno.

"O ERTMS é um sistema muito fiável e muito seguro, segundo os parâmetros das infraestruturas de alta velocidade; o AFSA Digital é igualmente fiável, mas é de sinalização, não de controlo", especifica o técnico. "O AFSA não influi na velocidade do comboio, só o trava se o sinal está vermelho", insiste Moreno, que assinala este detalhe como "suspeito". O Sindicato Espanhol de Maquinistas e Ajudantes Ferroviários (Semaf) também assinalou esta questão como uma das possíveis causas do descarrilamento.

Em resumo, o perito José Moreno salienta ao publico.es que “está claro que o excesso de velocidade é a causa principal do acidente, mas os dois tipos de exploração das infraestruturas que se dão nesse troço, a transição entre os dois sistemas de segurança e a própria geometria do traçado, numa curva limitada a 80 quilómetros por hora e que os próprios técnicos da Adif e da Renfe já assinalaram de 'muito fechada para um traçado de alta velocidade' durante a inauguração da linha, também podem ter muito a ver” com o acidente. A finalizar, Moreno afirma: “Em qualquer caso, a Adif e a Renfe não podem agarrar-se só à perícia do maquinista porque todos somos humanos e podemos cometer erros no nosso trabalho”.

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