André Julião

André Julião

Jornalista

Queremos mesmo dizer à próxima geração que tem de começar uma vida do zero já com uma dívida acumulada superior a 10 mil euros às costas? E que, com esse encargo mensal, ainda tem de pagar uma renda, comer, vestir-se e pagar os transportes todos os dias para o emprego?

Em 2019, o valor orçamentado para o Contrato Local de Segurança em Loures está reduzido a uns insignificantes 55 mil euros, tornando claro que nem o Governo central nem o executivo municipal consideram este projeto uma prioridade para os respetivos mandatos.

Na “nova economia” não há vencimentos fixos, horários, férias ou fins-de-semana. Trabalha-se sempre que há trabalho. Enquanto ainda há trabalho. Todos passamos a ser empresários de nós próprios.

Imagine que tem de optar entre as refeições dos filhos, o bilhete de autocarro e a conta da luz. Ou entre um par de sapatos em segunda mão, um medicamento urgente e a renda da casa.

No rescaldo da tragédia, que só por sorte não fez vítimas, e passadas quase duas semanas, mas agora longe dos holofotes, as famílias desalojadas do Bairro da Torre ainda não têm casa nem ajuda.

Moral da história: se não tem envergadura financeira para suportar a mensalidade da creche da Junta, deixe os seus filhos com os avós. Ou com os vizinhos. Ou a brincar na rua, como “se fazia antigamente”.

Costa arrisca-se a deixar como legado um imenso “interior”, em parte povoado à força “pela pressão do mercado”, em parte sem vivalma, vagueando moribundo ao sabor do próximo que vier.

É já lendário o conservadorismo da autarquia lourense, assim como a tendência para se “esquecer” de cumprir deliberações da Assembleia Municipal.

Há uma vincada herança industrial que marca a irregular e heterogénea paisagem do concelho de Loures. Mas até a mais vincada das tradições tem de acompanhar a evolução dos tempos.

Quando um filho, ao jantar, entre a sopa e o bacalhau, pede à mãe para levar uma manta para a escola, isso não pode ser bom sinal.