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Unidade da primeira infância do Hospital da Estefânia tem lista de espera pela primeira vez

Em entrevista à agência Lusa, o diretor da Especialidade de Pedopsiquiatria do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central (CHULC), Pedro Caldeira da Silva, declarou:
“O que nós estamos a assistir na primeira infância é uma coisa que não pode acontecer, é termos bebés, crianças pequenas à espera porque não temos mais meios para dar resposta. Isto é gravíssimo, mais vale não fazer nada”, afirma o pedopsiquiatra.
Pedro Caldeira da Silva, que criou a “consulta dos bebés irritáveis” e a “consulta dos bebés silenciosos”, para apoiar as famílias e promover o diagnóstico precoce na saúde mental, salienta: “Ao longo de 33 anos, gabámo-nos com muita honra de não ter lista de espera, mas desde o verão de 2021, temos três meses de lista de espera”, porque “há bastante mais procura, há uma grande sensibilidade e não há profissionais”.
O pedopsiquiatra refere que uma situação semelhante se passa noutros serviços e exemplifica: “Com todos os colegas que falo as listas de espera estão entre dois e três meses, alguns casos três ou quatro meses e em alguns casos mais”.
Pedro Caldeira da Silva diz que no primeiro confinamento houve uma “diminuição drástica” da procura de serviços, mas, sobretudo a partir do verão de 2021, a situação alterou-se, havendo “um aumento de casos de ansiedade e depressão nos mais velhos e um aumento muito grande da procura por suspeita de casos de perturbação do espectro do autismo nos muito pequeninos".
“Muito, muito desfalcados”
Pedro Caldeira da Silva aponta que esta situação “verificou-se não só no nosso serviço como no conjunto de serviços com quem eu tenho falado" e sublinha que os serviços de saúde estão “muito, muito desfalcados”, sobretudo de técnicos, terapeutas e psicólogos.
O pedopsiquiatra diz que médicos e enfermeiros/as vão “havendo sempre”, apesar de “sempre em carência” e critica: "os técnicos, terapeutas, psicólogos, isso ninguém contrata porque pela lógica de financiamento do Serviço Nacional de Saúde esses não dão dinheiro nenhum aos hospitais”.
“Efeito perverso”
O pedopsiquiatra alerta para o “efeito perverso” de se chamar “muito a atenção” para a saúde mental infantil.
“É preciso ter muito cuidado porque este efeito de aumentar a sensibilidade e depois não haver resposta é completamente perverso, é muito perigoso”, avisa e alerta para os efeitos de se falar muito do aumento de depressão e ansiedade nos jovens, pois faz subir os casos.
“É como se fosse uma licença para adoecer, para manifestar os seus próprios sentimentos”, explica, comparando a situação com o suicídio, em que se verifica um aumento dos casos quando uma pessoa famosa se suicida.
“O parente pobre da saúde mental”
Pedro Caldeira da Silva lamenta que a saúde mental infantil e juvenil seja “o parente pobre da saúde mental” e defende que tem de haver autonmia da saúde mental infantil. “Se se quer falar da saúde mental infantil a sério tem que haver autonomia da saúde mental infantil”, frisa.
Pedro Caldeira da Silva diz que “este modo que temos de viver sob a asa da psiquiatria de adultos não nos beneficia nada, só nos prejudica e ficamos com os restos, dos restos” e salienta “não podemos continuar assim a comer as migalhas ou a achar que são os psiquiatras de adultos que nos vão dar peso específico porque nós somos muito poucos. Isto tem que acabar”.
A concluir, sublinha que a pedopsiquiatria é “uma especialidade autónoma, independente, com metodologias, diagnósticos e intervenções próprias e que tem, ou teria, uma responsabilidade social fundamental na prevenção e na promoção de um crescimento saudável e, portanto, na diminuição das doenças na idade adulta”.
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