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Um quarto dos governantes nacionais tem ligações a empresas

Entre os 70 membros do governo, há 19 que têm participações em empresas ou em que estas são detidas por cônjuges ou unidos de facto. Vários casos agora detetados não surgem nos registos de interesses que ministros e secretários de Estado são obrigados a entregar. Conheça aqui os interesses empresariais dos ministros.
Cerimónia de tomada de posse do XXII Governo Constitucional. Foto de ANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA.
Cerimónia de tomada de posse do XXII Governo Constitucional. Foto de ANTÓNIO PEDRO SANTOS/LUSA.

Há setenta membros no atual governo. Primeiro-ministro, 19 ministros e 50 secretários de Estado. Destes, um quarto são sócios de empresas ou têm cônjuges ou pessoas com as quais vivem em união de facto que o são. Sete são ministros, 12 são secretários de Estado.

A notícia é do jornal Público, que recolheu as informações dos registos de interesses entregues no Parlamento, as cruzou com dados do registo empresarial e do portal dos contratos públicos.

Deste trabalho resulta a informação de que vários dos membros do governo beneficiaram, nos últimos anos, de adjudicações de contratos públicos, alguns por ajuste direto, nas empresas a que tinham ligações diretas ou indiretas. Há casos em que isso se mantém como o do marido da ministra da Justiça e o da mulher do secretário de Estado da Mobilidade. Os contratos não são, contudo, na área da tutela do cônjuge.

Concluiu-se ainda que vários membros do governo não declararam estas ligações a empresas nas declarações de interesses que entregaram no Parlamento. A larga maioria dos membros do governo entregou esta declaração depois do prazo. Dos vinte ministros, apenas cinco o fizeram atempadamente.

Para além de terem de comunicar cargos e atividades que exerceram nos últimos três anos, os governantes estão igualmente obrigados a dar informação sobre cônjuges ou pessoas com as quais vivam em união de facto. A identificação de ligações indiretas exclui outro tipo relações familiares. Sobre filhos, pais e irmãos, por exemplo, nenhum dado tem de ser entregue na Assembleia da República. Por isso, o quadro de ligações agora divulgado é apenas uma mostra parcial dos interesses familiares dos governantes nacionais.

As empresas dos ministros

Há sete ministros com ligações diretas ou indiretas a empresas. Alguns em áreas mais próximas das suas tutelas do que outros. O ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Manuel Heitor, detém 10% do Colégio Valsassina. Vários outros familiares seus detêm participações na escola privada que está em processo de partilhas depois da morte dos seus pais e de um irmão. Este colégio tem feito contratos com o Ministério da Educação.

O marido de Francisca Van Dunem, ministra de Justiça, tem uma quota de 97,5% numa sociedade de advogados que, desde 2013, embolsou 1,56 milhões de euros em contratos com entidades públicas.

Já João Gomes Cravinho, ministro da Defesa Nacional, tem 20% numa imobiliária lisboeta. E o ministro de Estado, da Economia e da Transição Digital, Pedro Siza Vieira, tem uma quota de 50% na imobiliária Prática Magenta. Segundo o público não indicou na declaração de interesses que a outra metade da empresa é da esposa.

Pedro Nuno Santos, ministro das Infraestruturas e Habitação, detém um porcento na Tecmacal, empresa familiar de maquinaria que lucrou, desde 2008, cerca de um milhão de euros com contratos com entidades públicas.

O marido de Maria do Céu Albuquerque, ministra da Agricultura, tem uma clínica dentária. E o de Ana Abrunhosa, ministra da Coesão Territorial, tem participações em várias empresas. Algumas das quais não foram comunicadas no registo de interesses entregue. Uma das suas empresas beneficioy de dois contratos com o Estado por ajuste direto para “consultoria sobre direitos de autor e patentes”.

As empresas dos secretários de Estado

Também há 19 secretários de Estado com ligações a empresas, uns casos conhecidos, outros nem por isso.

Nuno Artur Silva será dos mais conhecidos dada a natureza do seu negócio e o facto de tutelar a área empresarial de que vem. Detentor das Produções Fictícias e do canal Q, o governante vendeu a empresa ao sobrinho pouco antes de entrar no governo. Uma clausula desse contrato tem sido considerada como indicadora de conflito de interesses: Nuno Artur Silva lucrará mais vinte mil euros se a empresa que vendeu atingir um resultado líquido de mais de quarenta mil euros no final do ano. Acontece que o secretário de Estado tutela a RTP e que as Produções Fictícias estão a vender conteúdos à televisão pública.

Outros casos são bem menos mediáticos. João Catarino, secretário de Estado da Conservação da Natureza, das Florestas e do Ordenamento do Território, tem metade da quota de duas empresas de construção civil e uma de mediação imobiliária. A mulher é ainda sócia-gerente numa empresa, a Aeroflora que tem contratos com entidades públicas no total de 118 mil euros.

Eduardo Pinheiro, secretário de Estado da Mobilidade, é casado com Vilma Marlene da Silva que em 2015 detinha 70% da Território XXI, uma empresa de consultoria em planeamento. A maior parte desta participação, numa empresa que lucrou 1,945 milhões de euros com 32 contratos com entidades públicas, foi entretanto vendida.

Catarina Sarmento Castro, Secretária de Estado de Recursos Humanos e Antigos Combatentes, tem 10% numa empresa de artigos de desporto, partilhados com marido. Sendo que este é sócio em mais quatro empresas e isso não foi indicado no registo de interesses. Trata-se de empresas de comércio de peças de automóveis, de reparação e manutenção de máquinas, de comércio grossista de produtos alimentares e tabaco e de produção de licores.

Mário Belo Morgado, secretário de Estado Adjunto e da Justiça, tem participação numa sociedade gestora de participações sociais sediada no Luxemburgo. Esta é, por sua vez, dona de uma sociedade de prestação de serviços que opera em Portugal.

Carlos Miguel, secretário de Estado do Desenvolvimento Regional, participa presentemente na Cooperativa de Comunicação e Cultura de Torres Vedras. Até junho de 2018 era sócio-gerente na imobiliária Árvore de Papel, que detinha a meias com a mulher, uma situação ilegal já que na altura estava já no governo anterior.

Rita da Cunha Mendes, secretaria de Estado da Ação Social, tem quotas em empresas familiares de restauração e eventos. João Paulo Rebelo, secretário de Estado da Juventude e Desporto, é dono de uma empresa de mirtilos cuja gestão passou à mulher há dois anos por esta atividade ser incompatível com a governação. Eurico Brilhante Dias, secretário de Estado da Internacionalização, tem 49% de uma empresa de consultoria de que já foi gerente.

Alberto Souto de Miranda, secretário de Estado das Comunicações tem 25% de uma empresa de turismo e um por cento de uma de imobiliário. O Público identificou, contudo, que não declarou que a mulher é empresária na área do alojamento local e do transporte fluvial.

O marido de Inês dos Santos Costa, secretária de Estado do Ambiente, tem cerca de 20% de participação numa cooperativa de projetos de energias renováveis e eficiência energética em Lisboa. E a mulher do secretário de Estado da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, João Sobrinho Teixeira, tem 20% de duas sociedades agrícolas.

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