You are here

"Um parlamento exigente ajuda a um bom governo"

“Neste novo ciclo político, a Assembleia da República deixará de ser uma caixa de ressonância do governo”, destacou Pedro Filipe Soares. O líder parlamentar do Bloco afirmou ainda que a moção de rejeição apresentada pela direita é, na realidade, “uma moção de lamentação” e que “quem não aprende com a história, acaba por passar à história!”.

“Não o digo como ameaça, mas como conforto: Um parlamento exigente, ajuda a um bom governo e é assim que sempre deve acontecer”, avançou Pedro Filipe Soares durante a sua intervenção no encerramento do debate sobre o programa de governo do PS.

O dirigente bloquista defendeu que o acordo, que “é a garantia que se vira a página ao ciclo do empobrecimento”, deve ser “materializado rapidamente”.

“O arco da Constituição tem rapidamente de se sentir na vida concreta das pessoas”, reforçou.

Referindo que “o caminho já está iniciado”, o líder parlamentar do Bloco destacou que “temos de aprofundar a dimensão programática do acordo”, sendo que “há ainda muito por onde o fazer”.

O Esquerda.net transcreve, na íntegra, a intervenção de Pedro Filipe Soares no encerramento do debate sobre o programa de governo do PS:

Hoje ganha legitimidade definitiva o XXI Governo Constitucional. Aqui, na Assembleia da República, órgão constitucional na plenitude das suas funções, espelho plural das escolhas livres e informadas dos cidadãos e das cidadãs e com a legitimidade do apoio da maioria dos deputados e deputadas em funções.

É certo que este debate do programa de governo não passou à margem da amargura e do discurso virulento de PSD e CDS e que daqui a pouco, por isso mesmo, iremos votar a moção de rejeição que apresentaram. Mas não é isso que marcará este debate, nem definirá o novo ciclo político que agora se inicia.

Não que essa moção de rejeição não tenha interesse! Mas ela não é apresentada com convicção, antes por conveniência. Dizem que é motivada pela necessidade de clarificar o cenário político?! Mas clarificar o quê?! A posição de PSD ou CDS? Não! Pretendem clarificar a posição de PS, Bloco de Esquerda, PCP e PEV!

Mas, onde estiveram desde o dia 4 de outubro?! Não perceberam quem se levantou para rejeitar a vossa continuação no governo?! Afinal, não é um ato de afirmação de PSD e CDS, é um ato de desistência. É o epitáfio que querem colocar na lápide do governo PSD/CDS de Passos Coelho e Paulo Portas. Não é uma moção de rejeição, é uma moção de lamentação. É que, por falar em amigos, de que o ex vice irrevogável gosta tanto, depois de quatro anos em que o “estado” da relação era “é complicado”, PSD e CDS foram desamigados pela larga maioria de eleitores e ainda não se conformaram…

Se me permitem uma opinião, é um caminho desequilibrado. Não precisam de se irritar com os resultados eleitorais, eles fazem parte da democracia. E não adianta torturarem os números, 122 será sempre maior do que 107! Se se transformarem numa minoria ressentida, ninguém vos compreenderá. Se o que marcar a intervenção da direita for o fel que se sentiu neste debate, não serão desculpados. Aliás, nem a vossa história vos perdoará.

Sras. E Srs. Deputados do PSD, Francisco Sá Carneiro lança-vos o repto. Ouçam-no: “a maioria mudou pacífica, legal e honestamente pelo voto. E as maiorias de ontem, que são as minorias de hoje, aceitaram sem violência o juízo do País”. Como está pior este PSD que rejeita encarar o resultado eleitoral!

Sras. E Srs. Deputados do CDS-PP, ainda se lembram de Adelino Amaro da Costa? Dizia ele que “os moderados servem-se da mudança para evitar a rutura". Mas que caminho diferente propõe Paulo Portas ao CDS, que rejeita a mudança e se radicaliza!

O desespero e o queixume da direita serão o seu próprio purgatório ao longo da legislatura. Quem não aprende com a história, acaba por passar à história!

Já tivemos até vozes do PSD e do CDS a anunciar que votarão contra tudo, tal é o ressentimento! Ou serão novamente posições irrevogáveis, Sr. Deputado Paulo Portas?!

Sras. e Srs. Membros do governo,

Sras. e Srs. Deputados,

Dizia Goethe que “o mundo é tão grande e tão rico, e a vida tão cheia de variedade, que nunca faltarão motivações para poemas. Mas hão-de ser sempre poemas circunstanciais, quer dizer, a realidade terá de proporcionar-lhes o motivo e a matéria”.

E esse é o desafio que temos pela frente. Este não pode ser um período circunstancial, nem o governo, nem o parlamento. A realidade proporciona-nos o motivo e a matéria. E a realidade tem sido muito dura para a larga maioria das pessoas. Por isso se fez um acordo que uniu partidos diferentes, por isso se fez este caminho que viabiliza o governo. E isso é que vai ficar para a história deste debate.

Esta fase da vida política tem novidade, é certo. Tem debate, necessariamente. Mas tem compromisso e esse é o principal alicerce.

O acordo é a garantia que se vira a página ao ciclo do empobrecimento e deve ser materializado rapidamente. Esse é o compromisso e a vontade do Bloco de Esquerda. Mas é também a exigência de quem desesperou com a austeridade, das vidas difíceis de quem PSD e CDS deixou ficar para trás, dos futuros adiados ou das famílias espartilhadas. O arco da Constituição tem rapidamente de se sentir na vida concreta das pessoas.

O caminho já está iniciado: Reposição de rendimentos e salários, descongelamento de pensões, defesa das famílias, mais justiça fiscal. Estes são alguns dos exemplos contidos nos acordos e que o programa de governo já prevê. É premente a sua execução.

Temos de aprofundar a dimensão programática do acordo. Há ainda muito por onde o fazer. Os grupos de trabalho propostos marcam esse caminho e dão conta das prioridades, sempre para a melhoria da vida concreta das pessoas.

A elaboração de um Plano Nacional contra a Precariedade é prioritária. Acabar com os futuros permanentemente adiados, das vidas sempre em suspenso, da desvalorização permanente das competências, do menosprezo sobre os direitos do trabalho. É a resposta aos tais heróis de que fala a rapper Capicua, que têm “tudo o que é estudo, emprego zero”, que a direita precarizou ainda mais. Não podemos faltar a essa urgência e aqui estamos para fazer esse caminho.

O debate exigente sobre a estrutura da proteção social e do combate ao flagelo da pobreza é também essencial. Num país em que a pobreza alastrou com a imposição da austeridade, particularmente entre as crianças, é tempo de regressarmos à modernidade e a políticas públicas com consciência social. Temos de dar resposta a quem a direita deixou ficar para trás.

O grupo de trabalho sobre os custos energéticos que pesam sobre as famílias explica-se a ele próprio, tal é a violência com que os custos energéticos têm crescido e o abuso das empresas tem sido permitido. Ou a resposta ao direito fundamental à habitação, com uma tributação justa do património imobiliário, garantindo que não há mais famílias a ficar sem casa por dívidas fiscais, nem que o crédito à habitação continue a ser um negócio rentável da banca à custa da estabilidade das famílias.

Estes são pontos essenciais onde iremos aprofundar o acordo. Onde continuaremos a dar corpo à esperança que as pessoas depositam neste futuro pós troika e pós direita.

E não varremos para debaixo do tapete as matérias difíceis, porque sabemos que elas não desaparecem dessa forma. A sustentabilidade da dívida externa é um dos problemas que o país tem de enfrentar e, por isso mesmo, iremos trocar pontos de vista, debater com conhecimento o problema e chegar a compromissos para o resolver. É essa a regra deste novo ciclo político.

Sras. e Srs. Membros do governo,

Sras. e Srs. Deputados,

Hoje fica na plenitude dos seus direitos o XXI governo constitucional. Será o governo de todas e todos os portugueses e a todas e todos eles representa. É um governo reforçado por uma postura exigente da Assembleia da República. Neste novo ciclo político, a Assembleia da República deixará de ser uma caixa de ressonância do governo, como aconteceu durante quatro anos. Não o digo como ameaça, mas como conforto: Um parlamento exigente, ajuda a um bom governo e é assim que sempre deve acontecer.

Não está em cima da mesa uma parlamentarização da governação. Não é constitucionalmente possível, nem politicamente aceitável. Trata-se sim de uma relação de dois órgãos de soberania em prol dos interesses das pessoas, com pontos de convergência conhecidos e transparentes. É esse o nosso compromisso. E é nessa postura que nos encontrarão”.

Pedro Filipe Soares: "Um parlamento exigente ajuda a um bom governo"

Termos relacionados Política
Comentários (1)