Durante sete anos, a única mensagem do Partido Republicano sobre o Obamacare resumia-se ao slogan “Repeal and Replace” [Revogar e Substituir]. Agora que controlavam a maioria em ambas as câmaras do Congresso, bem como a Casa Branca, foram incapazes de cumprir a promessa.
Graças a um par de senadores republicanos que se posicionaram contra a proposta, os Republicanos perderam a maioria necessária de 51 senadores e o projeto de lei ruiu. Numa segunda tentativa, Mitch McConnel, líder da maioria republicana no Senado, apresentou uma proposta de simples revogação do Obamacare, mas também esse plano falhou sem qualquer apoio (uma sondagem indicava que apenas 13% do eleitorado apoiaria a revogação sem qualquer plano de substituição).
Assim, o Affordable Care Act - conhecido por Obamacare - mantém-se em vigor. Pelo menos enquanto as condições políticas não se alterarem, havendo vários cenários onde os republicanos recuperam a iniciativa.
No início de 2016, um primeiro plano do Trumpcare falhou na câmara baixa do Congresso. No entanto, em maio, numa iniciativa pouco esperada, Paul Ryan - líder da maioria republicana no Congresso - apresentou uma proposta de lei que acabaria por ser aprovada. Segundo o sistema legislativo dos EUA, quando uma proposta é aprovada na câmara baixa, segue depois para o Senado para ser revista e votada novamente, e depois para a Casa Branca para aprovação ou veto. Desta vez, chegou ao Senado e por aí ficou.
Se os Democratas falam de vitória face a Donald Trump, e se a mobilização contra o Trumpcare foi visível em vários estados, que inclusivamente votaram a favor de Trump nas presidenciais de 2016, o apoio pelo Obamacare continua relativamente baixo dadas as circunstâncias. E isso permitirá aos Republicanos assumir a iniciativa no futuro.
Segundo as sondagens da RealClearPolitics, desde a sua criação, o Obamacare é impopular por larga margem nos EUA. À data da sua implementação, 40% estava a favor e 48% contra o Obamacare, uma margem que foi flutuando ao longo dos anos mas sem nunca reduzir significativamente esta margem negativa. Até ao dia em que os republicanos apresentaram o seu plano e as consequências ficaram claras. A 4 de fevereiro de 2017 teve lugar a primeira sondagem, desde a criação do Obamacare, em que o sistema recebe opiniões favoráveis. A margem positiva alarga em junho, com 49,4% a favor do programa e 42,5% contra. Mas, desde então, voltou a perder apoio, estando neste momento apenas com quatro pontos de vantagem.
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Ou seja, mesmo face ao Trumpcare e ao impacto agressivo que teria em milhões de pessoas nos EUA, o Obamacare não sai particularmente reforçado.
Segundo o The Intercept, a causa poderá estar nas limitações do próprio programa, que nunca assumiu uma cobertura realmente universal nem garantiu um sistema de contribuições obrigatório, mantendo-se antes como um sistema de saúde semelhante a qualquer seguradora privada.
Max Fine, o último membro ainda vivo do grupo de trabalho criado por John F. Kennedy para lançar o Medicare (primeiro programa de saúde tendencialmente universal nos EUA), relembra que “três anos depois da implementação do Medicare, em dezembro de 1968, um Comité de 100 especialistas americanos foi formado para fazer campanha pelo single payer Seguro de Saúde Nacional”. O Comité foi depois “denunciado” como um grupo de socialistas pelo recém-eleito Nixon.
O sistema de single payer foi uma das bandeiras centrais de Bernie Sanders na campanha das primárias do Partido Democrata em 2016, e consiste na obrigação de contribuições universais de todos os cidadãos para um sistema público de saúde, algo que nunca se aplicou nos EUA.
No início dos anos 70, Ted Kennedy, então senador do Massachussetts, apresentou um projeto de lei para criar um seguro de saúde financiado pelo governo federal. Mas o Partido Democrata decidiu antes assumir a linha dos seguros privados de saúde. Foi essa a reforma (ou retrocesso) que Hillary Clinton introduziu nos anos noventa, enquanto Bill Clinton era Presidente e a encarregou da pasta da saúde. E é essencialmente esse ainda o sistema do Obamacare que, apesar de baixar os custos de saúde, não torna os cuidados de saúde realmente acessíveis para a maioria da população.