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Trump abre caminho à deportação de 800 mil jovens

O Procurador-geral dos EUA confirmou o fim do programa "Dreamers", desenhado por Obama para proteger jovens que entraram ilegalmente no país, quando eram ainda crianças. Para Trump é "inconstitucional" e prejudicial para os cidadãos. “Cruel” é o adjetivo unânime escolhido pelos Democratas, pelo ex-Presidente norte-americano e por Bernie Sanders, condenando a decisão.
Em frente à Casa Branca, os protestos contra a decisão de Trump que põe fim ao programa "Dreamers", do seu antecessor Obama. Foto de Alba Vigaray, EPA/ LUSA.
Em frente à Casa Branca, os protestos contra a decisão de Trump que põe fim ao programa "Dreamers", do seu antecessor Obama. Foto de Alba Vigaray, EPA/ LUSA.

Esta terça-feira, o responsável pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos, Jeff Sessions, anunciou a decisão do Presidente Donald Trump de rescindir o programa do seu antecessor, Barack Obama, que criava um estatuto especial de imigração dirigido aos cerca de 800 mil jovens imigrantes que eram ainda crianças quando entraram ilegalmente em território norte-americano, muitos vieram ao colo dos pais.

“O programa conhecido como Deferred Action for Childhood Arrivals [Ação Diferida para as Chegadas Durante a Infância - DACA, na sigla original], instituído desde 2012, vai ser revogado”, anunciou o Procurador-geral, numa breve declaração formal e sem direito a perguntas. Jeff Sessions justificou a decisão alegando que, no entendimento do Departamento de Justiça, se tratava de um programa “inconstitucional”: “Não podemos deixar entrar todos aqueles que querem vir para este país. A política de fronteiras abertas foi liminarmente rejeitada pelo povo americano”, sublinhou.

Na prática, com esta decisão, Trump abre a porta à deportação de milhares de pessoas que cresceram nos EUA e nunca viveram noutro país. Segundo o The New York Times, Trump considera que a sua medida se baseia ainda nalguma benevolência, dizendo que escolheu a “amnistia” como “primeira abordagem” [“amnesty-first approach”]. Porém, minutos depois da declaração Sessions, um comunicado divulgado pela Casa Branca em nome do Presidente foi claro sobre o tipo de argumentos de tom xenófobo que sustentam esta decisão. Aí pode ler-se que apesar de “não favorecer a punição de crianças, muitos dos quais já adultos, pelas ações dos seus pais”, Trump é sensível às dificuldades sentidas pelos cidadãos dos EUA que estão desempregados e se sentem “maltratados e esquecidos”.

Nesta declaração, citada pelo The Washington Post, o Presidente dos EUA acusou Obama de ter ultrapassado o Congresso e violado "os princípios fundamentais que sustentam a nossa República". Acrescentou ainda que “agora, cabe ao Congresso atuar”, precipitando um novo contencioso no interior do Congresso, que reiniciou esta terça-feira a sua actividade legislativa debaixo de crescente pressão.

Os “Dreamers”

O programa DACA foi desenhado por Obama enquanto resposta temporária à inação do Congresso que não se decidia sobre como assegurar a proteção de milhares de cidadãos estrangeiros, que chegaram aos EUA com as respetivas famílias, enquanto eram bebés ou crianças. Na altura (2012), eram crianças e jovens que frequentavam as escolas e universidades, ou trabalhavam em empresas norte-americanas, mas que por não terem documentação válida para viver, estudar ou trabalhar no país corriam o risco permanente de serem deportados. Mais de 70 por cento são nascidos no México ou países da América Central, 11 por cento vieram das Caraíbas e América do Sul e 9 por cento são originários da Ásia.

“Dreamers” ou “sonhadores”, foi como a Administração Obama os designou, dado que cumpriam os critérios estabelecidos pelo chamado “Dream Act”, uma proposta legislativa apresentada em 2001, que nunca chegou a ser aprovada pelo Congresso e que visava condições para a residência permanente nos EUA. Com o DACA, aqueles que chegaram aos EUA com menos de 16 anos de idade, até 2012, ficaram protegidos de deportação. Ter cumprido o ensino obrigatório ou serviço militar, nunca ter sido condenado por crimes, nem ter sido considerado uma ameaça à segurança nacional eram as restantes condições.

Agora, o atual Procurador-geral, nomeado por Trump, afirma que os “Dreamers” são trabalhadores clandestinos ou imigrantes ilegais, de acordo com a lei da imigração do país: “Não quer dizer que sejam más pessoas, só quer dizer que esta Administração respeita a lei”.

"Decisão cruel"

A nova medida anti-imigração de Trump originou o protesto quase imediato de centenas de ativistas que condenam o ato como "xenófobo", e se juntaram em frente à Casa Branca, ainda nesta terça-feira. Contudo, desde o início, a possibilidade da decisão mereceu uma condenação pública bastante alargada, de representantes das 400 maiores empresas norte-americanas, como o fundador do Facebook, Mark Zuckerberg, porta-vozes dos patrões da indústria e sindicatos, do Conselho Americano de Educação e até de representantes da comunidade evangélica e das Congregações de Caridade Católicas de Nova Iorque, bem como do próprio governo mexicano.

Para a líder dos Democratas na Câmara de Representantes, Nancy Pelosi, “esta decisão cruel do Presidente, que pretende começar as deportações dentro de seis meses, exige uma resposta imediata”. “A maioria republicana tem de agendar a votação do Dream Act sem demora”, exigiu Nancy Pelosi, logo após o anúncio.

O ex-Presidente dos EUA considerou a medida “cruel”, “autodestrutiva” e “errada”. Numa publicação no Facebook, explicou as razões da sua condenação: “Vamos ser claros: a decisão tomada hoje não era exigida pela lei. É uma decisão política e uma questão moral”. Obama argumentou ainda que “sejam quais forem as preocupações ou as queixas dos americanos sobre a imigração em geral, não devemos tratar o futuro deste grupo de jovens que estão cá sem culpa própria, sem serem uma ameaça e sem nos tirar nada”.

No Twitter, Bernie Sanders foi ainda mais categórico: “A decisão de Trump sobre o DACA é a decisão mais feia e cruel alguma vez tomada por um Presidente dos EUA, na história moderna deste país”.

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