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Tribunal Europeu dos Direitos Humanos condena Portugal por decisão judicial machista

Portugal violou a Convenção Europeia dos Direitos Humanos, quando o Supremo Tribunal Administrativo reduziu a indemnização devida a uma mulher, vítima de negligência médica numa cirurgia ginecológica, baseando-se na desconsideração da vida sexual de “uma mulher de 50 anos”.
Para o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, a fundamentação do acórdão do coletivo de juízes do STA, proferido em 2015, demonstra “os preconceitos” que prevalecem no sistema judiciário português. Foto de www.wikipedia.pt.
Para o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, a fundamentação do acórdão do coletivo de juízes do STA, proferido em 2015, demonstra “os preconceitos” que prevalecem no sistema judiciário português. Foto de www.wikipedia.pt.

Em dezembro de 2013, o Centro Hospitalar de Lisboa Central, do qual faz parte a Maternidade Alfredo da Costa, recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo (STA), da condenação de pagar 172 mil euros por negligência médica, cometida durante uma cirurgia realizada em 1995, que deixou uma mulher com lesões irreversíveis (dores intensas, incontinência e dificuldades em ter relações sexuais) e uma incapacidade permanente de 73%.

Dois anos depois, o Supremo decidiu reduzir o valor em cerca de 60 mil euros, justificando a decisão com o argumento de que a sexualidade não é tão importante para uma mulher de 50 anos, e já com dois filhos, como para alguém mais novo.

“Importa não esquecer que a Autora na data da operação já tinha 50 anos e dois filhos, isto é, uma idade em que a sexualidade não tem a importância que assume em idades mais jovens, importância essa que vai diminuindo à medida que a idade avança”, pode ler-se no acórdão que, na altura, gerou indignação e polémica, dado o seu conteúdo subjetivo e machista.

Para o Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, a fundamentação deste acórdão do coletivo de juízes do STA, proferido em 2015, demonstra “os preconceitos” que prevalecem no sistema judiciário português, e condenou Portugal a pagar 3.250 euros à vítima, por danos não patrimoniais, e ao pagamento de 2.460 euros, devidos a despesas com o processo.

Em causa está a violação concreta de dois artigos da Convenção Europeia dos Direitos Humanos: o artigo 14.º, que proíbe a discriminação, neste caso, de género e idade; e o 8.º, que refere o direito ao respeito pela vida privada e familiar.

Ler a decisão do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, em inglês ou francês, aqui.

“Como ela [vítima] já tinha mais de 50 anos à data em que foi operada, o STA entendeu que a sexualidade a partir dos 50 anos não tinha a mesma relevância que teria se ela fosse mais nova. Ela foi discriminada [pelo STA] pelo facto de ser mulher e por ter a idade que tem”, explicou à Lusa o advogado da vítima.

Vítor Parente Ribeiro espera que esta decisão do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos permita reanalisar o acórdão dos juízes do Supremo Tribunal Administrativo.

A sentença do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa (TACL), proferida em outubro de 2013, deu razão à paciente e considerou a atuação médica “ilícita e culposa”, sustentando que, durante a intervenção cirúrgica do foro ginecológico, a equipa médica "lesou parcialmente" o nervo pudendo, que controla a continência urinária e fecal, deixando a paciente "inválida para toda e qualquer profissão(...), pelo que o seu comportamento ficou abaixo do standard técnico/científico que era exigível a um ginecologista cirurgião médio".

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