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Taxa mínima de imposto sobre as empresas ainda não reúne consenso

A administração norte-americana avançou com uma proposta para definir uma taxa de imposto mínima sobre as empresas a nível internacional. A proposta tem algum apoio entre os países, mas não agrada a paraísos fiscais. E ainda não há acordo à vista.
Pascal Saint-Amans, diretor do Centro para a Política Fiscal da OCDE. Foto: OECDtax/Flickr
Pascal Saint-Amans, diretor do Centro para a Política Fiscal da OCDE. Foto: OECDtax/Flickr

Há poucas semanas, o debate sobre a reforma do sistema de tributação internacional teve avanços significativos. A administração norte-americana de Joe Biden avançou com uma proposta para a definição de uma taxa mínima de imposto sobre as empresas a nível global, na linha do que já vinha a ser discutido entre os países da OCDE nos últimos anos. A proposta de Biden prevê que a taxa efetiva seja fixada em 21%, com o objetivo de pôr um travão ao desvio de lucros para paraísos fiscais e à corrida para o fundo nos impostos sobre o setor empresarial.

A notícia foi recebida com entusiasmo pelos que defendem um combate efetivo à evasão e elisão fiscais. No entanto, ainda existem divergências significativas sobre esta proposta. O valor proposto pelos Estados Unidos é superior ao que inicialmente fora discutido na OCDE (uma taxa de 12,5%), o que dificulta a obtenção de um acordo com países cujo modelo de crescimento económico se tem baseado na atração de capital estrangeiro através de taxas de imposto muito reduzidas (ou mesmo nulas). Na União Europeia, é o caso da Irlanda, Holanda, Luxemburgo, Chipre ou Malta.

No entanto, ainda não são conhecidos os detalhes técnicos da proposta que será discutida pela OCDE até julho. E a verdade é que estes serão decisivos para se perceber se os países poderão ter flexibilidade para continuar a atrair capital estrangeiro através de isenções, benefícios ou outras formas de contornar a taxa geral de IRC. Basta ver o caso da Apple na Irlanda, país que possui uma taxa geral de IRC de 12,5% mas onde a multinacional pagava uma taxa efetiva de 0,005% em 2014, através de esquemas de planeamento fiscal agressivo. O diabo, como sempre, está nos detalhes.

A expetativa é que se possa chegar a acordo já em Julho sobre o “Quadro Inclusivo da OCDE/G20 sobre o BEPS [Base Erosion and Profit Shifting]”, o plano de combate a esquemas de planeamento fiscal agressivo como a erosão da base tributária ou a transferência de lucros. Este plano divide-se em dois pilares: o primeiro diz respeito à reforma do sistema fiscal internacional de forma a responder à digitalização das atividades económicas e a garantir que as multinacionais digitais pagam os impostos devidos nos locais onde geram valor, ao passo que o 2º consiste na definição de uma taxa mínima efetiva.

Alemanha, França e Holanda já admitiram apoiar a proposta da administração de Joe Biden. No entanto, a Irlanda parece continuar a opor-se e pode dificultar um acordo internacional. Citado pelo Público, o ministro das Finanças irlandês, Paschal Donohoe, deixou claro que pretende um acordo que “acomode a taxa da Irlanda de 12,5%” e que não acabe com a concorrência fiscal entre os países. É expectável que outras jurisdições em que a tributação é muito baixa ou nula resistam à definição de uma taxa mínima efetiva.

Mas a verdade é que os termos deste debate já não são os mesmos das últimas décadas. O diretor do Centro para a Política Fiscal e Administração da OCDE, Pascal Saint-Amans, diz mesmo que “o tempo em que os países podiam fazer tudo na política fiscal acabou”. Saint-Amans considera que “a ideia de que podemos continuar a ter pequenos países a serem agressivos nas suas estratégias fiscais sem sofrerem qualquer retaliação é uma ideia do passado”, uma vez que os restantes países não o vão continuar a aceitar e deverão partir para medidas de retaliação. Além disso, o economista da OCDE sublinha que “a paz fiscal também é boa para as pequenas economias abertas.”

 

Tributar as heranças para reduzir a desigualdade?

Paralelamente à discussão sobre a tributação do setor empresarial, têm decorrido debates sobre outras propostas que permitam aumentar a receita fiscal dos Estados e combater as desigualdades sociais. É o caso da tributação das heranças, sugerido pela OCDE num relatório divulgado esta semana, como noticia o Jornal de Negócios. A instituição lembra que a crise provocada pela pandemia está a colocar muitas dificuldades aos governos e considera que a taxação de heranças e doações de valores elevados pode ter “um papel relevante neste contexto”.

Convém notar que um imposto desta natureza tem mais do que uma consequência: por um lado, desincentiva a acumulação de riqueza “parada”, o que pode levar ao seu reinvestimento; por outro, tem um papel no combate às desigualdades e “pode ser uma importante ferramenta para reforçar a igualdade de oportunidades e reduzir a concentração de riqueza”, como nota a OCDE. Com a crise a pressionar as contas públicas dos países, é de esperar que os próximos anos tragam mudanças ao nível dos impostos.

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