A relação estreita entre os movimentos anti-vacinas e neofascistas em Itália começou muito antes da crise pandémica da covid-19, e teve este sábado mais uma manifestação perigosa para a democracia italiana com grupos organizados e violentos a atacarem simultaneamente o governo e os sindicatos, representantes democráticos e do trabalho, os alvos preferenciais dos movimentos fascistas desde a sua origem.
Roma foi efetivamente sitiada por dois grupos organizados de milhares de manifestantes. O primeiro grupo tentou quebrar as linhas policiais para alcançar o escritório do primeiro-ministro italiano, Mario Draghi. Um segundo grupo tentou violentamente invadir a sede da Confederação Italiana do Trabalho, o maior sindicato do país, criado em 1944 numa coligação de trabalhadores de influência comunista, socialista e democrata-cristã.
“O assalto à sede nacional da Confederação Italiana do Trabalho é um ato de banditismo fascista, um ataque na democracia e no mundo do trabalho”, afirmou o secretário-geral do sindicato, Maurizio Landini. “Ninguém pode achar que vai conseguir levar o país de volta para o seu passado fascista”, disse ainda.
A mobilização para os protestos surgiu em volta do “passe verde” da vacina da covid-19, que o governo italiano tornou obrigatório para todos os trabalhadores numa tentativa de acelerar o processo de vacinação e reduzir o número de efeções de forma estrutural.
Até ao momento, 69,8% da população italiana está totalmente vacinada com 86,1 milhões de doses e 41,6 milhões de pessoas com as duas doses administradas. 76% recebeu pelo menos a primeira dose.
A obrigatoriedade do passe verde, semelhante ao certificado digital português, tem o apoio maioritário da sociedade italiana mas é contestada por estes grupos por, na sua leitura, infringir com liberdades fundamentais. A questão foi adotada por movimentos de extrema-direita, já anteriormente organizados em torno dos movimentos anti-vacinas.
Em 2017, um surto de milhares de casos de sarampo em Itália levou o governo a determinar a vacinação obrigatória de dez vacinas para crianças nas escolas públicas. Em 2018, o governo formado por uma coligação entre o Movimento 5 Estrelas e o Liga Norte de extrema-direita, retirou a obrigação a favor da “imunisação natural” das crianças.
O fundador do Movimento 5 Estrelas, Beppe Grillo, já tinha antes identificado as vacinas como algo tão perigoso como as próprias doenças, afirmando que promoviam “leucemia, envenenamento, inflamação, imunodepressão, mutações genéticas hereditárias, cancro, autismo e alergias”, mentiras sem qualquer base científica. Por seu lado, o parceiro de coligação de extrema-direita rapidamente adotou os movimentos anti-vacinas.